Reprodução do artigo publicado na editoria de Opinião, 1º/9/2016 no O POVO.

Impeachment revela fragilidade da democracia

Está consumado. Dilma Rousseff foi afastada definitivamente do cargo de presidente da República. Reeleita com 54 milhões de votos, a pena – capital em política – lhe foi imposta pelo colegiado de 81 senadores, dos quais 61 votaram contra ela.

Dilma é o segundo presidente a sofrer impeachment após a redemocratização. Para alguns, isso é sinal de fortalecimento da democracia, mas é o contrário. Alguma coisa está fora da ordem quando se retira do cargo dois presidentes entre os quatro eleitos após a redemocratização.

No caso atual, o pretexto foi a edição de três decretos de crédito suplementar. Ponha a mão da consciência: isso é motivo para retirar a presidente Dilma do cargo? Pois, em resumo, por isso ela foi julgada. O impeachment demonstra que alguma coisa está muito errada, pois acochambrando-se uma denúncia frágil sob uma fina casca de legalidade, chega-se ao afastamento de uma presidente.

No maniqueísmo feroz em que se transformou o debate, melhor dizendo, a guerra política no Brasil, os sectários (de ambos os lados) buscam rotular qualquer pensamento que não reze pelas suas estritas cartilhas. Assim, quem se manifesta contra o golpe parlamentar é “petista”; quem levanta qualquer crítica aos governos do PT é “traidor” (sabe-se lá do quê).

O que está em jogo não é simplesmente o mandato da presidente, mas a saúde da democracia brasileira – e isso deveria estar acima das paixões que os perdedores das eleições de 2014 contribuíram (muito) para inflar.

Quem entende que a cassação de Dilma ajuda a melhorar os “costumes políticos” – quando, na verdade, favorece apenas os interesses de determinado grupo político -, deveria olhar para o balcão de negociatas que se abriu para garantir o impeachment, no qual se inclui o BNB, cuja sede fica aqui bem pertinho, no bairro Passaré, Fortaleza.

PS. A consequência lógica do impeachment é a perda de direitos políticos. Só a consciência pesada (e autodefesa) dos senadores explica a absolvição de Dilma dessa pena.

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