Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 30 de outubro de 2016 do O POVO.
A Previdência é superavitária e deficitária
O título pode parecer inusual ou mesmo equivocado, pela dubiedade. Mas o propósito foi mesmo causar estranhamento, pois se há quem diga que a Previdência apresenta déficit (opinião mais divulgada), existem economistas sustentando o contrário, afirmando haver superávit. Como a reforma da Previdência está na ordem do dia, o eventual leitor poderá tirar suas próprias conclusões, analisando o que vai se expor.
Os que defendem não existir déficit lembram que orçamento do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deve ser formado de modo tripartite: empresários, trabalhadores e sociedade. Obrigação estabelecida pelo artigo 194 da Constituição Federal, assinalando que “a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. Na sequência, o artigo 195 determina que as fontes de financiamento serão de recursos da União, estados e municípios e da receita de loterias e lucro de empresas, como a Contribuição Financeira para a Seguridade Social (Cofins) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Com o regime atual de “repartição” (trabalhadores da ativa contribuem para o pagamento do benefício dos inativos), a Previdência urbana é superavitária. Mas o INSS é também um instituto de seguridade social, englobando, por exemplo, a aposentadoria rural e outros benefícios, cuja contrapartida não cobre as despesas. Custo esses que deveriam ser suportadas por repasses do governo. Portanto, se o que estabelece a Constituição fosse cumprido não existiria déficit da Previdência, afirmam os que apresentam esses argumentos.
Do outro lado, os defensores da existência do déficit dizem que, em um sistema de seguro social, é natural que existam subgrupos que façam contribuição menor ou nenhuma. Assim, pela lógica do próprio sistema, um setor deficitário, teria de ser compensado pelo superávit do outro. Seria equivocado, portanto, separar uma conta de outra.
Afirmam ainda a necessidade de haver o equilíbrio entre trabalhadores ativos e inativos, do contrário, a sociedade terá arcar com déficit, que fatalmente surgirá, pela diferença entre o que se arrecada e o que é pago. E essa disparidade, dizem, tornou-se perigosa devido ao envelhecimento da população brasileira. Assim, a reforma da Previdência seria urgente para garantir que o INSS continue a ter caixa para pagar os inativos e manter demais benefícios.
NOTAS
Rural e urbana
Na separação contábil das contas observa-se o seguinte, no ano de 2015: a arrecadação da previdência rural foi de R$ 7,1 bilhões, com despesas de de R$ 98 bilhões, déficit de R$ 90,9 bilhões. Na previdência urbana, a receita foi de R$ 343,2 bilhões, com despesas de R$ 338 bilhões; superávit de R$ 5,2 bilhões.
Transição
Para Edilson Lins, diretor do Sindifisco (auditores da Receita Federal), a “questão central” é saber se a Previdência manterá regime de “repartição” ou adorará o de “capitalização” (quando o trabalhador faz seu próprio fundo). Ambos são sujeitos a desequilíbrios, diz ele, mas defende a “repartição”, por ser mais favorável ao trabalhador e também por ser mais fácil superar possíveis crises.
Créditos
A Previdência Social é superavitária? Mito ou verdade?; A Previdência tem déficit ou superávit?; A Previdência social não tem déficit ; A farsa chamada déficit da Previdência.
”
O que é previdência social e o que é seguridade social?
Amigo, possivelmente vocês já escutaram a tese de algumas pessoas que, no Brasil, não faz sentido falar em déficit da previdência social, pois a previdência é parte da seguridade social, que inclui três grandes programas: (1) previdência; (2) assistência social; e (3) saúde.
A base para essa tese é a referencia ao Art. 194 da Constituição Federal: “Art. 194: A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.
A partir da definição de seguridade social, surgem duas teses e, já antecipo,que ambas estão equivocadas Quando falo que as teses estão equivocadas é por um motivo simples: a matemática não corrobora as duas teses.
Primeira tese: previdência é parte da assistência social e, assim, não faz sentido estudar separadamente previdência social e nem mesmo falar em déficit da previdência social.
Errado. Mesmo se deixássemos de lado a previdência e olhássemos apenas para o conceito mais amplo de seguridade social, isso não mudaria o fato que até 2060, pelas regras atuais, a despesa com previdência crescerá perto de 10 pontos do PIB – R$ 680 bilhões- e, assim, seria preciso aumentar a carga tributária em pelo menos 10 pontos do PIB.
Segunda tese: A seguridade social no Brasil é superavitária. Esse superávit desaparece quando o governo retira recursos da seguridade social por meio da Desvinculação das Receitas da União (DRU). Assim, de acordo com os defensores dessas tese, se acabarmos com a DRU não haveria problema algum de financiamento da seguridade social.
Novamente tese errada por dois motivos. Primeiro, mesmo se a DRU não existisse, já há alguns anos, o resultado da seguridade social passou deficitário (ver gráfico abaixo). Assim, mesmo sem a DRU, haveria déficit na seguridade social.
Segundo, como já dito acima, pelas regras atuais, a despesa da previdência vai crescer perto de 10 pontos do PIB até 2060. Assim, se não quisermos mudar nada, os próximos governos terão que aumentar a carga tributária em pelo menos 10 pontos do PIB para o déficit da seguridade social não aumentar (com ou sem DRU). .
Uma boa forma de começar o debate é olhando para os números. E, infelizmente, as pessoas com “soluções mágicas” parecem não conhecer os dados.
Apenas para finalizar. E o que aconteceria se o governo acabasse com todos os programas que envolvem alguma renúncia fiscal, como o SIMPLES, Zona Franca de Manaus e diversos regimes especiais de tributação?
Isso não resolveria o problema, pois todos esses regimes especiais representam 4,2% do PIB, menos da metade da expansão programada da despesa com previdência (ou seguridade) até 2060.
Infelizmente, o fato é que, sem um reforma da previdência, os brasileiros terão que pagar cada vez mais impostos apenas para honrar o compromisso de pagar aposentadorias e pensões de todos nós. E, em 2060, seremos o país que mais gasta no mundo com previdência como percentual do PIB.”
FONTE: Mansueto Almeida Jr – 24 de setembro · Brasília, Distrito Federal
Caro Diego,
Se houvesse tido acesso a esse texto, poderia ter acrescentado o argumento em meu artigo.
Que pena.
Mansueto Almeida, cearense, talvez seja o maior estudioso em déficit publico e previdência social.
Diego.