Reprodução do artigo publicado na editoria de Opinião, edição de 15/12/2016 do O POVO.
É preciso coragem
Um presidente assume depois de um golpe; em seis meses de mandato, seis ministros sucumbem, alguns defenestrados por suspeita de corrupção grossa; pesquisa mostra que sua popularidade está caindo pelas tabelas: 51% dos brasileiros consideram-no ruim ou péssimo; 65% o veem como “falso” e 75% o têm como defensor dos mais ricos.
Tudo isso antes de vir à tona a delação premiada de Cláudio Melo Filho, diretor da Odebrecht, construtora que era proprietária de uma manada de políticos em Brasília, entre eles, vários dos que compõem a cúpula do governo. O próprio presidente é citado como tendo achacado a construtora, a bagatela de R$ 10 milhões, quando exercia o cargo de vice (o que foi confirmado por Marcelo Odebrech, presidente da empresa na época). Esse é o rascunho rápido do governo Michel Temer (PMDB).
Esse governo precário, sem votos e sem rumo, envia ao Congresso Nacional uma proposta de emenda constitucional (PEC do Teto de Gastos) – que vai causar impacto na vida do país por vinte anos -, mesmo a medida tendo a oposição de 60% dos brasileiros.
Pior, a proposta transitou nas duas Casas do Congresso, sem que a oposição conseguisse alterar uma vírgula de seu conteúdo, que acaba de ser aprovada em votação final no Senado por 53 votos a 16; quatro a mais que o mínimo necessário para validar uma emenda à Constituição. As medidas vigoram a partir de 2017.
O presidente Michel Temer disse que é preciso “coragem” para tomar medidas impopulares. Porém, ainda que se reconheça a necessidade de ajuste nas contas públicas, um governo verdadeiramente corajoso não chamaria os setores mais fragilizados da população para pagar a conta. Já teria baixado os juros, aproveitando para fazer uma auditoria da dívida, de modo a mostrar a sua valentia frente aos bancos e ao 1% da população, que apoderam-se das riquezas do país (sem falar nos escandalosos privilégios dos parlamentares e de seletas categorias do serviço público).
Atacar os pobres e desvalidos não é ato de coragem: é covardia.
Quem mais ataca os pobres e desvalidos são os que se dizem progressistas, socialistas e defensores de minorias, mas, na prática, só privilegiam os grandes ou os que recebem salários e vantagens exageradas.
Aproveito para fazer duas citações.
Helio Gurovitz:
O gasto público no Brasil tem, nas últimas duas décadas, crescido seis pontos percentuais ao ano além da inflação. É raríssimo no mercado investimento que dê tal retorno. Se uma empresa apresentar em seu balanço um faturamento que sobe assim, será suspeita de fraude ou, no mínimo, objeto de estudo para investigar seu desempenho estelar. A realidade não permitirá que isso continue para sempre.
Pela primeira vez desde a Lei da Resposabilidade Fiscal, foi ontem aprovada uma emenda constitucional que – enfim! – impõe restrições concretas ao gasto público no país. É um momento histórico. Com certeza, o evento mais significativo do ano para nosso futuro. O dia em que o Brasil caiu em si.
Os pessimistas dirão que o teto de gastos é um tiro no pé, pois esvaziará atividades essenciais promovidas pelo governo nas áreas de saúde, educação e combate à pobreza. É um argumento falho por dois motivos.
O primeiro, e mais óbvio, é técnico. A emenda constitucional aprovada ontem amplia gastos em saúde (de 13,7% para 15% do Orçamento de 2017), não atua sobre os recursos da educação básica, oriundos do Fundeb, e permite aumentar qualquer rubrica de gastos, desde que respeitado o limite total de crescimento restrito pela inflação – bastará cortar em outras áreas.
O segundo motivo é mais sutil. É verdade que o Brasil conseguiu, nas décadas de crescimento a galope dos gastos públicos, universalizar o ensino básico, reduzir a pobreza e melhorar diversos indicadores sociais. Mas não há uma relação necessária de causa e efeito entre os dois eventos. Ao contrário, vários países – do Chile à Coreia do Sul – demonstram ser perfeitamente possível ampliar conquistas sociais num ambiente de gastos controlados.
Fábio Campos:
Durante anos, os governos gastaram dinheiro como senão houvesse amanhã.
Muitas vezes, gastou mal. Gastou sem planejamento, de forma instintiva, sem observar custos, com projetos caros e, não raras vezes, desnecessários. Gastou inchando mais e mais a máquina. A galope, veio a insolvência para muitos.
Hoje, no que pese as resistências corporativas, há a clara percepção de que ou o País faz os ajustes nas contas públicas ou permanecerá mergulhado nas trevas da recessão e da estagnação, com suas consequências nefastas.
“É GOPI, É GOPI É GOPI”
Para um desatento o texto ” é preciso ter coragem” seria confundido com a capa do jornal de um sindicato de bancários.
Infelizmente, para os que votaram 13, quem votou Dilma votou Temer. Logo a constituição garante ao vice-presidente eleito assumir a presidência em caso de impedimento do presidente eleito.
seus leitores merecem também saber a opinião de Mansueto Almeida, boa leitura.
”
MANSUETO FACUNDO DE ALMEIDA JUNIOR – … quero fazer algumas observações: primeiro, quanto a esse ajuste fiscal da PEC 55, em dez anos, nós teremos um primário que será ainda menor do que era em 2008, 2006, 2007, que, inclusive, nós tínhamos um governo do PT. Não é um ajuste fiscal radical.
E me lembro de que, em 2005, quando eu estava no Ipea, conversando com representantes do governo, havia um plano do então Ministro da Fazenda e do então Ministro do Planejamento de reduzir o déficit nominal para zero num período de dez anos. Isso não vai acontecer! Daqui a dez anos, o Brasil ainda terá déficit nominal. Vai ser pequeno, mas terá. Não é um plano de déficit nominal zero, como a área econômica do governo anterior chegou a cogitar em 2005-2006. Então, é ajuste novamente muito gradual, algo muito gradual.
Segundo, isso vai prejudicar pobres. Nós estamos num país com mais de 12 milhões de desempregados, num país que, nos últimos quatro, cinco anos, a inflação média foi superior a 6% ao ano. De 2011 a 2014 – vamos esquecer 2015, porque a inflação foi muito alta; vamos olhar 2011 a 2014 –, a inflação média foi superior a 6%.
A gente quer inflação superior a 6%, a gente acha que uma inflação de 6% é uma inflação normal. E, quando é citado aqui caso de países que fazem política fiscal expansionista e estudos do FMI, percebe-se que são países que têm inflação perto de zero, são países que têm juro real negativo. Você pode aumentar o gasto que esses países conseguem se financiar com juro próximo de zero. Não é o caso do Brasil.
A gente fez uma experiência recente, em 2011 a 2012, e, quando os juros foram forçados para baixo, a uma taxa de juros de 7,25, o que foi que aconteceu? A inflação aumentou, apesar de o governo ter congelado tarifas públicas, ter atrasado o aumento do preço da gasolina. Você atrasar reajuste de gasolina é subsidiar gasolina para pessoas que têm carros, e, quanto maior o carro, maior o subsídio.
Então, essa política foi equivocada. Se a gente quer gastar mais com saúde e educação e ter mais programas públicos voltados para os mais pobres, e quer pagar menos juros, a forma de um governo pagar menos juros é não precisar pedir dinheiro emprestado todos os dias e todas as semanas. Não é o caso do Brasil. Se nós não gostamos de banqueiro, se nós queremos pagar menos juros ao banco, a melhor forma de fazer isso é não precisar do dinheiro dos bancos, que é o nosso dinheiro; é o Governo não precisar ir diariamente ao mercado pedir emprestado.
Na semana passada, o fato de o Trump ter sido eleito nos Estados Unidos aumentou a taxa de juros que o Governo precisou pagar para se financiar. Nós estamos nessa economia. Infelizmente, o Brasil não é um país em que o Governo consegue se financiar a juro zero. Se tentarmos baixar a taxa de juros à força, as pessoas não vão financiar o Governo. Por outro lado, se nós fizermos o ajuste fiscal, mesmo que seja muito gradual e que os juros caiam, o Governo vai pagar menos juros, a dívida pública vai crescer…
… muito menos, e nós teremos, no futuro, mais dinheiro para saúde e educação.
Então, o objetivo final de um programa de ajuste fiscal é justamente haver mais crescimento, a renda real voltar a crescer e obter mais recursos justamente para o social.
A questão da Previdência não terá efeito imediato? É claro que não terá. Quem foi que falou que reforma da Previdência vai ter efeito no próximo ano, nos próximos dois, três anos? Eu nunca falei isso. Se alguém do Governo falou, me digam quem foi que falou para eu saber quem foi essa pessoa, porque reforma da Previdência não terá impacto imediato. Mas nós já estamos atrasados ao fazer a reforma da Previdência. Eu acho que vocês todos sabem disso, inclusive os meus colegas economistas da Mesa.
Nos próximos dois, três anos, o que o Governo terá que fazer é simplesmente ser muito mais austero com programas que não funcionam. Há vários programas que não funcionam. O governo anterior, em 2015…
… fez uma série de mudanças na sistemática de pagamento de seguro-desemprego, de abono salarial. Por que o governo fez isso? Por que, em 2015, a Presidente Dilma fez mudanças no pagamento de abono salarial e seguro-desemprego? Porque simplesmente havia algumas coisas que o governo não achava adequadas. Isso significa que foi contra pobres? De maneira alguma.
O objetivo do ajuste fiscal é justamente o Governo ter a garantia de fazer investimento, de continuar com as políticas sociais, porque, volto a insistir, o mero fato de um benefício estar no papel não significa que ele será pago. Olhem o que está acontecendo no Rio de Janeiro: os salários estão atrasados, o pagamento de aposentadoria está atrasado. Ontem, o Rio Grande do Sul divulgou um ajuste fiscal estabelecendo que metade do décimo-terceiro só será pago até setembro do próximo ano, e isso está no papel. Quer dizer, o fato de estar no papel…
… garante que o Governo terá (Fora do microfone.) recursos para pagar as suas obrigações? Não. Então, volto a insistir: é um ajuste fiscal muito gradual.
Eu confio no Parlamento, eu confio na discussão do Orçamento. Se houver grupos de lobby pressionando por favores, os Srs. Senadores vão explicitar para a sociedade quais são esses lobbies, para a imprensa divulgar. Então, acredito muito na política.
Se fizermos o ajuste fiscal, novamente pergunto: haverá corte na educação? Quero saber qual foi o corte na educação, porque o corte na educação que ocorreu foi no passado. O investimento do Ministério da Educação, no ano passado, caiu 46%: ele era de R$11,5 bi, em 2014, e, no ano passado, foi para R$5,5 bi. É só pegar os dados oficiais. Esses foram ajustes do governo anterior. Eu defendia isso, assim como a Senadora Gleisi também defendia. Eu era solidário ao governo anterior. Era um ajuste fiscal, independentemente de partido.”
Fonte: http://www25.senado.leg.br/web/atividade/pronunciamentos/-/p/texto/427456
ps. O CHORO É LIVRE!
Ôrra, Diego, o choro é livre e o texto também, mas vê se escreve menos, cara; assim ninguém vai ler.