Reprodução do artigo publicado na editoria de Opinião, edição de 2/2/2017, do O POVO.

“Citado” vai nomear o novo ministro do STF

Para alguns desavisados, o presidente Michel Temer (PMDB) agiu como “grande jurista” ao informar que iria nomear o novo ministro para o Supremo Tribunal Federal (STF), na vaga deixada por Teori Zavascki, somente depois de ter sido escolhido o novo relator do processo da Lava Jato.

Na verdade, o presidente não prestou reverência ao bom direito, fez cálculo político, como é próprio dos políticos. Se demonstrasse afoiteza para indicar o novo ministro, ver-se-ia pressionado a fazer nomeação “técnica” e, mesmo assim, poderia arranjar encrenca com a presidente do STF, Cármen Lúcia, o que ele quer evitar.

A esperança do presidente é que, depois de nomeado o novo relator, a temperatura baixe alguns graus e ele possa indicar um ministro um pouco mais sensível às dificuldades que fatalmente terá de encarar (com seus principais auxiliares) quando vier a público a delação dos 77 executivos da construtora Odebrecht. Em apenas uma delação, que “vazou”, foram “citados”, além de Temer, três de seus ministros, fora outros aliados.

O fato de a ministra Cármen Lúcia ter decretado sigilo nas delações forneceu um pouco de oxigênio ao governo Temer. Também se beneficiaram outros dois citados nas delações, o candidato à Presidência da Câmara (Rodrigo Maia, DEM/RJ) e Eunício Oliveira (PMDB/CE), eleito ontem para Presidência no Senado.

De qualquer modo, assistiremos ao estranho fato de um “citado”, o presidente, ter a prerrogativa de indicar um juiz que poderá julgá-lo, assim como outros (senadores) – na mesma situação – detêm a responsabilidade de confirmá-lo no cargo.

Quanto ao sigilo, reconheça-se, por vezes, é necessário em algum processo, mas até agora os vazamentos driblaram essas proibições e nunca houve investigação para identificar de onde partia tal sangria. E, entre vazamento seletivo e sigilo, o melhor é dar transparência a tudo.

Em relação ao Senado e à Câmara, com Eunício já eleito e Maia com grande possibilidade de eleição, ter-se-á outra situação inusitada. Caso se transformem réus no STF (o que é possível), ambos ficarão fora da linha sucessória – e a Presidência da República cairá no colo da ministra Cármen Lúcia, em caso de ausência ou impedimento de Temer.

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