Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 26/3/2017 do O POVO.

Como vivem os pobres na Suíça

Recentemente comentei nesta coluna o estudo do Banco Mundial propondo aumento dos recursos do Bolsa Família para atender os “novos pobres” gerados pela crise econômica. No Brasil, sãos consideradas em “pobreza extrema” famílias com renda de R$ 77 por pessoa; a categoria “pobre” classifica famílias com renda de R$ 154 por integrante.

Que países do chamado “terceiro mundo” têm nível elevado de pobreza é de conhecimento geral. Menos comum é descobrir que alguns países “insuspeitos” da Europa, considerados ilhas de prosperidade, conhecidos por oferecerem condições de vida ótimas a seus habitantes, também têm os seus pobres – e programas sociais para atendê-los.

Foi com certa surpresa que li no Swissinfo (portal de notícias da Suíça em português) o texto “Supermercado para pobres: um ‘escândalo’ que já dura 25 anos”. A reportagem aborda uma iniciativa da Cáritas, que mantém 24 lojas para atender pessoas de baixa renda em várias cidades da Suíça.

Mas o espanto foi também dos suíços quando a primeira loja da Cáritas foi aberta em 1992, em Basileia, vendendo a preços abaixo do mercado ou mesmo simbólicos. Segundo Christoph Bossart, um dos pioneiros, a abertura da primeira mercearia causou “grande eco midiático”, com alguns jornais propalando que “a presença de uma loja para os pobres, num país rico como a Suíça, era um escândalo”.

Segundo Bossart, uma “nova pobreza” surgiu nos anos 1990. “Cada vez mais pessoas não conseguiam garantir a própria subsistência, mesmo tendo um emprego.” Os clientes são aqueles considerados pobres na Suíça: pessoas de baixa renda, endividados e dependentes do serviço social ou de programa de complementação de renda por invalidez ou aposentadoria.

Ele diz que o objetivo das lojas continua o mesmo: “Aliviar os clientes que têm orçamento apertado”. Com o dinheiro economizado, diz ele, sobra algum recurso para “ir ao cinema ou comprar um novo par de sapatos”.

Com aproximadamente oito milhões de habitantes, cerca de 530 mil pessoas (6,6% da população) são consideradas abaixo da linha da pobreza na Suíça. A referência para definir os que são pobres estabelece como referência a renda mensal de 2.600 francos para uma pessoa sozinha ou 4.900 francos para uma família com duas crianças. Ainda existem outras 500 mil pessoas em situação financeira precária, vulneráveis a um imprevisto que pode lançá-las na indigência. Um franco equivale a aproximadamente R$ 3, mas não se pode fazer uma comparação direta com o Brasil, pois o custo de vida na Suíça é mais alto.

Para efeito comparativo, pode-se tomar uma campanha que os sindicatos suíços fizeram em 2014 para estabelecer um salário mínimo no país, de quatro mil francos, valor considerado básico para a manutenção de uma família de quatro pessoas.

É preciso observar ainda que o conceito de “pobreza” na Suíça também difere da definição brasileira. Observe que a Cáritas proporciona a compra de alimentos a preços mais baixos a pessoas de menor renda de modo a sobrar-lhes dinheiro para pequenos luxos, como diversão ou “um novo par de sapatos”.

Nas palavras de Christoph Bossart: “Não estamos falando de pessoas que vivem embaixo de pontes, como acontece em muitos países, o nosso sistema de assistência social consegue restringir os efeitos da pobreza. Se alguém depende da assistência social e sabe administrar o seu dinheiro, pode viver muito decentemente”.

Nada que se equipare à situação de milhões de brasileiros, vítimas da pobreza extrema, ou os simplesmente pobres, aos quais falta o mínimo essencial para uma vida digna.

NOTAS

Pobreza extrema
Famílias com renda até R$ 77 por pessoa são consideradas miseráveis no Brasil. São 6,8 milhões de pessoas nessa condição, número que pode subir para 9,4 milhões em 2017. A categoria “pobre” classifica famílias com renda entre R$ 77,01 e R$ 154 por integrante.

Brasil
Segundo o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família de quatro pessoas (dois adultos e duas crianças) no Brasil deveria ser de R$ 3.811,29 – sendo o valor oficial de R$ 937.

Salário mínimo
Dados do IBGE (2010) mostram que 72% dos brasileiros ganham até dois salários mínimos, menos da metade do valor calculado pelo Dieese para dar conta das despesas de uma família de quatro pessoas.

Crédito
SWI: portal de notícias da Suíça; Blog Plínio: Banco Mundial propõe aumento do Bolsa Família para atender os ‘novos pobres’”.

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