Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 28/5/2017 do O POVO.
O dinheiro, o impeachment, a democracia e a Rede Globo
Alerta: por força dos prazos de fechamento do caderno, entrego este artigo na terça-feira; assim, na velocidade com que os fatos se sucedem na arena político/policial, quando o leitor pegar o jornal impresso ou estiver à frente de seu écran, o mundo do presidente Michel Temer já pode ter desmoronado. Porém, independentemente da qualificação que estiver antecedendo o nome de Temer – presidente ou ex -, esta análise permanecerá válida.
Para continuar no cargo – se já não caiu -, Temer depende de reagrupar sua tropa parlamentar para garantir o que prometeu ao “mercado”, que ficará de olho na sua capacidade de fazê-lo. O polegar de seus patrocinadores estará pronto a virar para baixo ao menor sinal de perigo de que a encomenda – reforma trabalhista e da Previdência – não será entregue.
No longínquo ano de 2015 – dez meses antes do impeachment da presidente Dilma Rousseff -, escrevi o artigo “Insulto à democracia” (10/12) argumentando que os frágeis motivos alegados para o afastamento da presidente eram um ataque à democracia, que custaria alto preço ao País. Lembrava que opinar contra o impeachment era diferente de apoiar o governo – o que os maniqueístas nunca compreenderam.
Mostrava ainda que, desde a redemocratização, nenhum presidente governara sem ouvir um coro pedindo seu afastamento, com os petistas entoando “fora FHC”; e, no governo petista, o PSDB, o PMDB e seus satélites aderindo ao “fora Dilma”. Alertei que o substituto de Dilma assumiria sob os gritos de “fora” por qualquer motivo, o que seria fator permanente de crise.
Escrevi também que, em conjuntura difícil como aquela, o PSDB, podendo agigantar-se, preferiu atirar-se aos braços de Eduardo Cunha. Anotei que os tucanos pagariam alto preço por essa política mesquinha: o que está se vendo agora. E, pelo visto, o PSDB vai perder outra oportunidade histórica, se continuar ao lado de Michel Temer, e mover-se para salvar o ex-presidente do partido, Aécio Neves.
Dinheiro
Creio que todos devem estar zonzos, sem conseguir decifrar o volume de recursos utilizado em subornos para comprar leis, alugar parlamentares e conseguir outros favores, devido à quantidade de zeros à direita de cada número anunciado a cada delação.
Somente a Odebrecht (R$ 10 bilhões) e JBS (R$ 500 milhões) somam astronômicos R$ 10,500 bilhões de suborno pago a políticos, em alguns anos. O valor representa 11.205.976 salários mínimos de R$ 937. Assim, um trabalhador precisaria labutar 933.831 anos, sem gastar com mais nada, para amealhar tais recursos. Labutando por cinquenta 50 anos durante sua existência, esse hipotético trabalhador, teria de ter 18.676 vidas para chegar ao valor. Carma pra ninguém botar defeito.
Rede Globo
Não vou entrar no coro de “mídia golpista”, mesmo porque discordo de assim classificar os meios de comunicação. Porém houve uma guinada da Rede Globo em relação ao governo Temer.
Ainda está para ser provado se foi devido apenas às gravações que incriminaram o presidente. Mesmo com oito ministros investigados na Lava Jato, além de “citações” implicando Michel Temer, os comentaristas da emissora sempre foram unânimes na louvação ao governo.
E é isso o que incomoda na Rede Globo, inclusive agora, que está na “oposição”: a uniformidade de seus comentaristas. Todos contra Temer agora; antes, todos a favor (se houver alguma exceção, confirma a regra). É injusto e chega a ser covarde a carga feita quando um personagem “cai em desgraça” na emissora. Quanto aos comentaristas, não vou dizer que eles “obedecem” à direção da empresa; há a possibilidade de todos pensarem do mesmo modo, por que não?
Porém, uma concessão pública, deveria ter mais equilíbrio em seu noticiário e mais variedade no seu quadro de jornalistas opinativos, pois assim exige a democracia. Uniformidade é bom para um exército, não para o jornalismo.
NOTAS
CIRCUITO MARGINAL
A dinheirama que roda nesse circuito marginal obviamente não sai da botija desses dublês de empresários e criminosos para abastecer seus comparsas na política. Trata-se de dinheiro público: o seu, o meu, o nosso – esse que se ganha com o suor do rosto, como manda a Bíblia.
AVENTUREIROS
O perigo nessa situação crítica é que a desestruturação da política leve a soluções autoritárias ou ao surgimento de aventureiros. Depois da Operação Mãos Limpas, Berlusconi foi eleito na Itália, manteve-se 12 anos no poder, um governo de escândalos e corrupção.
Frágeis motivos para afastar Dilma?
Insulto à democracia seria a não descoberta de tantos crimes.
Mas após 1 ano sabemos o quanto o fiel aliado Eduardo Cunha ajudou Dilma até aceitar o pedido menos danoso para ela.
Os meninos inocentes insultaram a democracia dizendo combater os governos militares, mas eram assaltantes e terroristas.
E voltaram depois, eleitos pelo povo e por diversos partidos, mas os inocentes foram flagrados novamente, assaltando fundos de pensão, Petrobrás, BNDES, transferindo recursos para grandes empresários.
Não se conformam com a descoberta de crimes.
Preferiam que Dilma continuasse no poder para que ninguém tomasse conhecimento de Odebrecth, JBS e outras tenebrosas transações.
Cito Estadão,
A magnitude dos ilícitos descobertos pela Lava Jato, da Odebrecht e de tantas outras empresas e pessoas, só foi possível graças à determinação de Lula da Silva de pôr o Estado à venda. Não lhe neguemos esse mérito.
Cito Elio Gaspari,
Dilma era ministra de Minas e Energia quando um empresário narrou-lhe malfeitorias praticadas pela Petrobras. Ela respondeu: “Não posso me preocupar com pequenas ilegalidades”.
Com o tempo, deixou de se preocupar com as grandes.
Ela, Lula e o PT ficaram neutros contra a Operação Lava Jato.
Esse foi um dos principais fatores de erosão da credibilidade dos companheiros.
Cito Dora Krammer
Rodízio de delinquentes na Casa Civil com Dirceu, Dilma, a mulher honesta que viria a parecer tudo menos honesta, Erenice Guerra, Palocci que está preso sob acusação de extorquir R$ 128 milhões da Odebrecht, Gleisi Hoffmann, encontra-se nas malhas da Lava Jato por obra do caixa 2 da Petrobrás. Depois Mercadante e Jaques Wagner, descontada a fracassada tentativa de acolitar Lula na Casa Civil para protegê-lo da ação de Moro.
O incansável Paulo Moreira e seus textões.