Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 15/10/2017 do O POVO.//

Como a sorte interfere no resultado dos jogos//

Nas batalhas que se desenrolam no decorrer das jornadas esportivas, as primeiras vítimas são os técnicos de futebol. Muitos deles ficam pelo caminho, sob a acusação inapelável de serem incompetentes para levar seus times à vitória. Porém, a culpa não cabe exclusivamente a eles, pois o acaso tem papel importante nas disputas, mais em alguns esportes e menos em outros.

Essa medida, entre sorte e habilidade, foi estabelecida em estudo do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (DCC-UFMG), trabalho que recebeu o nome de “Luck is hard to beat: the difficulty of sports prediction” (“A sorte é difícil de vencer: a dificuldade da previsão do esporte”, em tradução livre). O extrato do trabalho foi publicado no “Boletim”, informativo da universidade.

O grupo de pesquisadores analisou 270.713 jogos, 1.503 temporadas esportivas, em 84 países e quatro esportes: basquete, voleibol, futebol e handebol. Estudaram as seguintes ligas: o Campeonato Brasileiro de Futebol da Série A, a National Basketball Association (NBA) e a Premier League Inglesa, a primeira divisão do futebol inglês.

Utilizando um software de cálculos estatísticos, foi observado o histórico de partidas jogadas pelos times durante os campeonatos. Em seguida, foram feitas simulações, como se o placar de todas as partidas fosse resultado do acaso. Depois, foi comparada a simulação com resultado real do campeonato.

Para definir a importância da habilidade na definição dos campeões, os pesquisadores criaram um coeficiente variando entre o infinito negativo e 1. Quanto mais perto do 1, maior a importância da capacidade técnica para definir o resultado e menor será a influência da sorte.

Conforme explica o professor Pedro Olmo, um dos autores do trabalho, quando a “variância real fica muito distante da variância aleatória, o campeonato não foi definido apenas por sorte, ou seja, a habilidade dos times teve papel fundamental na definição dos campeões”.

Os cálculos mostraram que o futebol e o handebol são esportes em que a sorte tem maior peso. Já os campeonatos de voleibol e basquetebol, em sua maioria, são decididos pela habilidade das equipes.

Analisando os 189 jogos das 20 equipes do primeiro turno do Campeonato Brasileiro, o estudo verificou que, se fosse retirado apenas o Corinthians, “o Brasileirão ficaria completamente aleatório, pois reuniria times de qualidade similar, tornando impossível prever o campeão”, afirma o professor.

Para ele, é difícil analisar o Brasileirão, pois sua aleatoriedade varia ao longo dos anos. Os cálculos mostram que o Brasileiro de 2009, vencido pelo Flamengo, enquadra-se como campeonato aleatório. Com o coeficiente abaixo de 0,5, seria preciso remover os times do Cruzeiro, Internacional e Criciúma para tornar aleatório o certame.

No entanto, a campanha vitoriosa do Cruzeiro em 2014 foi definida pela habilidade. Além do Cruzeiro, o Internacional e o Criciúma deveriam ser removidos do campeonato daquele ano para torná-lo aleatório.

Com coeficiente próximo a 1, a Liga Norte-americana de Basquete (NBA) é o torneio em que o fator habilidade impera na definição do vencedor. “É muito raro que uma equipe ruim vença uma boa. Não há zebras na classificação final; é muito fácil olhar a tabela e apontar os times que podem ser os campeões”, diz Olmo.

Para o professor, a qualidade dos jogadores na NBA tem tanta relevância que, para se tornar um campeonato aleatório, seria necessário que, em média, metade das equipes saísse do torneio.

NOTAS

NEGÓCIOS
Segundo o professor Pedro Olmo, o método também pode ser aplicado no mundo dos negócios. “Como a sorte explica o fato de uma empresa atrair mais clientes que a outra? A empresa que vende mais é mais hábil ou tem mais sorte?”, pergunta.

BEISEBOL
O beisebol não entrou no estudo da UFMG, pois seria interessante cotejar com a afirmação contida no livro “O andar do bêbado – Como o acaso determina as nossas vidas”, de Leornar Mlodinow. O autor afirma que existem cálculos mostrando que o resultado real dos campeonatos de beisebol teriam pouca diferença se as partidas fossem resolvidas na base do cara ou coroa.

CRÉDITO
Texto escrito a partir de informações publicadas no informativo Boletim, da UFMG (nº 1987, de 21/8/2017), em matéria assinada por Luana Macieira. O estudo, de autoria dos professores Raquel Aoki, Pedro Olmo e Renato Assunção, foi apresentado na conferência KDD, no Canadá. Veja aqui.

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