Do mesmo modo que a consciência democrática levantou-se em crítica ao comandante do Exército Eduardo Villas Boas, quando o general fez declarações políticas em uma rede social, deveria repelir agora os arreganhos cometidos pelo juiz Sérgio Moro e pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, onde o processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda tramita.

Se se repele um golpe de força, deve-se fazer o mesmo quando a trama vem embalada em um texto que deveria restringir-se estritamente ao que manda a lei, porém a atropela com palavras melífluas. O ordem de prisão contra Lula é ela mesma uma peça acusatória contra quem a redigiu. E a suposta generosidade do juiz Moro devido à “dignidade do cargo” que Lula ocupou soa como escárnio de um juiz hipócrita e vaidoso encandeado pela luz dos refletores, absorvida avidamente pela sua indefectível camisa negra.

Moro devia, há muito, ter-se declarado suspeito para julgar o processo contra o ex-presidente. Tanto pela dobradinha que faz com a parte acusadora (o Ministério Público), como por ter praticado ilegalidades em seu trâmite. Ele próprio foi obrigado a reconhecer o “erro”, perante o STF, por ter divulgado a interceptação ilegal da conversa entre Lula e a então presidente Dilma Rousseff. Sem contar a indignidade de ter tornada públicas conversas pessoais de parentes de Lula.

Para rechaçar o direito que a defesa do presidente ainda tem de recorrer ao próprio TRF-4, Moro afirmou que tais recursos seriam “patologia protelatória”, o trecho completo: “Hipotéticos embargos de declaração de embargos de declaração constituem apenas uma patologia protelatória e que deveria ser eliminada do mundo jurídico”.

Ora, é direito de Moro entender que há recursos demasiados – como de fato há -, mas a lei permite ao acusado valer-se desses instrumentos – e um juiz está obrigado a submeter-se à legalidade, pois não paira acima dela. A mudança de tal entendimento cabe a outro poder, o Legislativo. Se Moro entende que pode contribuir para o aperfeiçoamento da legislação penal, deveria despir-se da toga e concorrer a uma vaga na Câmara dos Deputados. O que ele não pode é fazer política na cadeira de magistrado, como vem fazendo.

Quanto ao Supremo Tribunal Federal (STF), a corte faria um grande favor se votasse logo o processo restringindo a prerrogativa de foro, que protege algumas pessoas acima de qualquer suspeita. A começar pelo presidente da República, Michel Temer, seguido pelo séquito de colaboradores, como Moreira Franco (secretário-geral da Presidência), Eliseu Padilha (chefe da Casa Civil) e o senador Romero Jucá (MDB-RR), além dos senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Aécio Neves (PSDB-MG), esse intocável. Eles continuam circulando livremente por aí, apesar dos crimes graves dos quais são acusados.

Enquanto esse estado de coisas permanecer, é lícito perguntar “a lei é para todos”?