Reprodução do artigo publicado na editoria de Opinião do O POVO, edição de 17/5/2018.

Crimes à espera de punição

É chocante o memorando da CIA (a central de inteligência americana), datado de 11 de abril de 1974, registrando que o ditador, general Ernesto Geisel, “informou ao general (João) Figueiredo que a política deveria continuar, mas que extremo cuidado deveria ser tomado para assegurar que apenas subversivos perigosos fossem executados”. A “política”, no caso, era o extermínio físico de adversários do regime. Figueiredo, na época chefe do Serviço Nacional de Informação (SNI), viria a se tornar o último presidente do ciclo militar.

Nesta reunião macabra, descrita pelo então diretor-geral da CIA, Willian Colby, também estavam os generais Milton Tavares de Souza e Confúcio Danton de Paula Avelino, “respectivamente o ex-chefe e o novo chefe do Centro de Inteligência do Exército (CIE)”, anotou Colby. Ele acrescenta que “o general Milton relatou que cerca de 104 pessoas, nessa categoria (subversivos), haviam sido executadas sumariamente pelo CIE durante o último ano, ou pouco mais de um ano. Figueiredo apoiou essa política e defendeu sua continuidade”. Geisel concordou, ordenando que “quando o CIE detivesse uma pessoa, que poderia ser enquadrado nessa categoria, o chefe do CIE deveria consultar o general Figueiredo, cuja aprovação deveria ser dada antes que a pessoa fosse executada”.

É um relato perturbador, porém não surpreendente. Seria impossível que o massacre contra os “comunistas” fosse apenas “excesso” de setores extremistas, sem conhecimento de seus chefes. Antes, foi uma política organizada com o método do terror.

O Brasil vai continuar pagando por não ter punido militares que cometeram esses crimes hediondos, preferindo um “esquecimento” hipócrita, que mancha a imagem do Exército, e obriga uma geração de militares – que nada tiveram com as faltas de seus antecessores – a carregar uma culpa que não é deles.

Alguns insanos vão dizer que a “guerra” em que vivia o país justifica a atitude dos militares. Mas, mesmo em uma guerra, é crime assassinar prisioneiros. Portanto, não há desculpa possível. Apenas crimes à espera de punição.

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