Reprodução do artigo publicado na editoria de Opinião, no O POVO, edição de 7/6/2018.
Um exemplo a ser seguido
O novo primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) rompeu com uma tradição mantida desde a redemocratização do país (1975), ao fazer seu juramento como chefe do Executivo. Ele dispensou a Bíblia e o crucifixo e jurou com a mão posta sobre a Constituição espanhola: “Prometo por minha consciência e honra cumprir fielmente as obrigações do cargo de presidente do governo com lealdade ao rei e guardar a Constituição como norma fundamental do Estado”. Embora não seja obrigatório, nenhum outro primeiro-ministro dispensara os símbolos religiosos na cerimônia de posse.
Sendo a Espanha um dos dez países mais católicos do mundo, talvez seja esta mais uma vantagem do parlamentarismo: a possibilidade de reduzir a influência da religião na ocupação de cargos políticos. Será que os espanhóis elegeriam um presidente incréu, mesmo que fosse o mais preparado para governar?
Declarando-se ateu, em um país em que a nota na disciplina de Religião conta para a média final, Sánchez é contra o ensino religioso nas escolas, afirmando haver incompatibilidade da disciplina com um país laico. Mas, por aqui, o caso passou meio despercebido. Nem mesmo os fanáticos religiosos condenaram o gesto de Sánchez.
A Constituição brasileira invoca o Criador em seu preâmbulo, onde consta ter sido a Carta promulgada “sob a proteção de Deus”. No Brasil, 92% da população acredita em alguma divindade (IBGE 2010), com um percentual de 8% de “sem religião”. Parece pouco, mas somam mais de 15 milhões de brasileiros. Se esse grupo fosse considerado uma religião, seria a terceira maior do país, atrás de católicos e evangélicos.
No Brasil são comuns feriados católicos e a presença símbolos religiosos – cristãos, nunca de outras confissões – distribuídos em prédios públicos, incluindo recintos que representam os três poderes da República: Executivo, Legislativo e Judiciário.
Sendo um país laico, o melhor seria evitar a imposição de símbolos religiosos nas repartições do Estado, pois a República representa a todos os brasileiros e não apenas os crentes.
Essa conversinha besta repetida tantas vezes vira lugar comum. Todo país tem sua história e ela não pode ser simplesmente descartada impunemente.
Agradeço a você, Marcus, por ter se dado ao trabalho de comentar uma “conversinha besta”.
Tenho minha crença, respeito as demais, mas não concordo com feriados religiosos porque impõem a todos, algo que diz respeito apenas a uma parte da população, mesmo que maioria, sem falar no prejuízo econômico,
No Brasil, até em propaganda de empresa comercial Deus é citado!
“Sendo um país laico, o melhor seria evitar a imposição de símbolos religiosos nas repartições do Estado”.
Em primeiro lugar, com o devido respeito e acatamento, parece-me, pela afirmação acima, que há uma enorme deficiência conceitual no tocante à “laicidade” por parte do opinante.
Segundo, é muito curioso a utilização da bandeira da liberdade religiosa como artifício para restringir a própria liberdade de manifestação religiosa.
Por fim, não se trata de imposição. Sugiro que o opinante realiza um estudo histórico sobre o tema.
Por fim, ressalto que a incrível contradição que reside naqueles que buscam extirpar os hábitos religiosos no ocidente. Via de regra, são defensores do multiculturalismo e exaltam as manifestações culturais atreladas a religiosidade oriental, mas são incapazes de reconhecer o valor da religião no ocidente.
Olá, Saulo,
1. Conheço o argumento “laico” é diferente de “ateu”, o que não altera os meus argumentos.
2. Não existe “artifício” para restringir a liberdade; que cada um professe a sua religião nos locais adequados, como igrejas, sinagogas, mesquitas, no seu lar – e também fiquem a vontade para fazer manifestações públicas – o que é um direito de todos – como nas “marchas para Jesus”, por exemplo.
3. Não tem imposição? Na Assembleia Legislativa do Ceará existe um vistoso crucifixo na parede. Se um ateu sentir-se incomodado, ele manda tirar, ou é obrigado a aceitar? Ou deixa de frequentar a “casa do povo” que é de todos, incluindo dos sem religião?
4. Quanto ao seu último questionamento não vou responder. Você vai ter de procurar alguém que se enquadre no perfil que você traçou. Não é o meu caso.
O pior que eu acho senhores é impor conceitos ou subjetividades religiosas às crianças.
Nesse período de festividades juninas, por exemplo, tenho escutado uma “orientação” a um grupo de crianças de uma determinada igreja ou congregação ou sei lá como se intitulam, coisas do tipo: “Se aquela festa for em homenagem a São João, São Pedro, Santo Antônio não participem, não é coisa de Deus, não é de Jesus…”. E por aí vai… Fico imaginando como ficam as cabeças dessas crianças quando veem outros colegas participando nas suas escolas ou em outros lugares onde ocorrem essas festividades que já fazem parte do folclore brasileiro!
No mínimo, vão criando aversão e a tendência é ir desenvolvendo uma intolerância e/ou preconceitos a serem praticados quando adultos como estamos vendo muito de uns tempos para cá!
Pois é Luciano, a prática da intolerância leva a mais intolerância e à violência.
… Enfim, seria importante repeitar o nível de compreensão das crianças em relação a essas complexidades religiosas!
Muitas instituições têm adotado alternativas interessante à imposição de práticas culturais e sociais padronizadas. Algumas escolas, por exemplo, já não falam em “Dia das Mães” ou “Dia dos Pais”, mas “Dia da Família”, um conceito mais abrangente e inclusivo. Ao invés de “São João”, pode-se falar em “Festas Típicas”, “Festas Juninas” etc. Até o Natal pode ser tratado como “Festividades de Final de Ano”. A origem religiosa do feriado não é irrelevante, até porque antes de ser uma data católica, era uma data pagã – rito da colheita, festa da fertilidade, solstício de inverno e por aí vai.
Olá, Felipe, bem lembrado. O objetivo de meus questionamentos não é “acabar com a tradição”, como pensam alguns. Claro que não vou propor derrubar o Cristo Redentor ou acabar com o Natal. Mas é preciso refletir sobre o assunto.
Prezado Plínio,
Colocar um crucifixo na Assembleia é um ato de intolerância, mas deixar de frequenta-la unicamente por conta da presença do crucifixo também não seria? Qual o problema de conviver harmonicamente com a manifestações religiosas? Perceba a intolerância da postura do ateu do exemplo que você mencionou, incapaz de conviver com aquilo que difere do seu pensamento. Veja que próprio exemplo que você trouxe reflete a intolerância do pensamento. Esse é o exemplo a ser seguido?
Olá, Saulo,
Não entendi onde foi que o meu exemplo “reflete intolerância”; fiz questionamentos. A propósito, como se sentiriam os cristão, ou uma boa parte deles, se houvessem símbolos da umbanda ou do candomblé, Exu, por exemplo, em prédios públicos?
Em um país hipotético onde tais manifestações religiosas fossem tão populares como o cristianismo é no Brasil, creio que seria algo aceitável, contanto não tratar-se de símbolo cuja índole, por si só, ofendesse frontalmente a símbolos de outras religiões. Sentir-se ofendido pela mera presença de um símbolo religioso isso sim seria intolerância. Claro que não posso falar por todas as pessoas, nem é esse meu objetivo.
Também não tenho a intenção de lhe convencer. Respeito a sua opinião. Apenas utilizo dos comentários para mostrar aos demais leitores que seu posicionamento é fruto de uma concepção equivocada acerca do Estado Laico. Por mais que o seu interesse não seja suprimir a manifestação de religiosalidade, em última instância, é exatamente esse o resultado daquilo que você propõe. Ainda que involuntariamente, a sua concepção de liberdade religiosa é fundada na intolerância, algo que revela extrema contradição.
Olá, Saulo, a questão não é de “popularidade”, mas de princípios. A cultura africana é muito forte no Brasil, assim como a indígena e a europeia. Se temos uma tradição católica, temos também a dos povos indígenas e africanos, constituintes da nossa nacionalidade. Por que eles não podem expressar-se em pé de igualdade com a cultura europeia? Portanto, não em um “pais fictício”, mas neste real, o Brasil, você aceitaria ou não uma representação do Exu em um prédio público, na Assembleia Legislativa ou em tribunais, por exemplo?
O que todos querendo ou não tem de se ater é palavra de Deus, e ela se encontra na bíblia, ela portanto é o norte que cada um tem que seguir fora isso tudo são argumentos falsos ou melhor resumindo é o falso profetismo.
Caro Carlos, existem pessoas que não acreditam na existência de deuses, portanto não se dispõem a seguir-lhes a “palavra”. Outros, acreditam em um Deus diferente do seu. Qual “palavra” seguir?