Historia de Nossa Senhora_Aberta.inddO culto de Nossa Senhora espalhou-se rapidamente pelas comunidades cristãs desde os mais remotos tempos do apostolado. Dominando o mundo cristão, cada um referia-se a Mãe de Deus sob a invocação que melhor a caracterizava, ora pelos motivos porque o fazia, ora pelo local onde se encontravam as suas imagens, de qualquer modo, revelando o sentimento filial que unia os homens a sua Mãe Celestial. Foi assim que a Rainha dos Céus sempre recebeu seus atributos na terra. Todas as nações a invocam, cada qual dando-lhe uma denominação a seu modo, das quais, umas se universalizaram, outras, ficando como referência puramente local. Ora, em nosso caso, sendo terra que foi desbravada e colonizada pelos portugueses nossos antepassados, dos quais herdamos a língua, a religião e os sentimentos, recebemos no culto a Nossa Senhora as suas mais antigas e tradicionais denominações, sendo até mesmo um roteiro seguro para estudos de origens de povoamentos, as invocações e oragos de capelas primitivas e matrizes antigas. Tão numerosas são realmente as dedicações de templos e altares a Virgem Maria nesta bela terra de Minas, que podemos denominá-la terra de Nossa Senhora. Que de variedades e quantos carinhosos e históricos nomes lhe damos nestas nossas montanhas e nestes extensos sertões onde vive e trabalha nossa gente.  Augusto de Lima Júnior

[Lima Júnior, Augusto de. História de Nossa Senhora em Minas Gerais: origens das principais invocações. Belo Horizonte: Autêntica Editora: Editora PUC Minas, 2008, p. 45. – (Coleção Historiografia de Minas Gerias. Série Alfarrábios)].

Encontrava-me no meu birô quando entra na sala o amigo e colega de trabalho José Gildemar Macedo Júnior e, entregando-me um pacote que trazia consigo, disse: “Para o Senhor Sincronicidade”. Pelo formato do volume, imaginei logo que fosse um livro. Ao abri-lo, a suspeita se confirmou. Gil acabava de retornar de Belo Horizonte, onde encontrara o livro e o adquirira para me presentear. História de Nossa Senhora em Minas Gerais, escrito por Augusto de Lima Júnior, fora inicialmente publicado em 1956; o exemplar que eu acabava de receber fora reeditado em 2008, pela Editora Autêntica em co-edição com a Editora PUC Minas. 

No livro, o autor escreve sobre vinte e nove títulos marianos e sua respectiva devoção em Minas Gerais. Um dos valores do livro – não fosse a grande contribuição para os aspectos históricos da tradição mariana não só em Minas Gerais, mas no Brasil de um modo geral, o que por si só já constitui motivo para se lhe atribuir grande mérito -, está nas ilustrações. O autor era colecionador de estampas de santos. Uma dessas coleções foi adquirida em uma de suas viagens a Portugal, ocasião em que comprou uma coleção de

Nossa Senhora do Carmo. Gravura a buril. Lisboa, sec. XVIII, 12x26 cm. Coleção Augusto de Lima Júnior (235) / Fundação Biblioteca Nacional, RJ.

Nossa Senhora do Carmo. Gravura a buril. Lisboa, sec. XVIII, 12x26 cm. Coleção Augusto de Lima Júnior (235) / Fundação Biblioteca Nacional, RJ.

estampas religiosas dos séculos XVII, XVIII e XIX. Em 1946, uma de suas coleções, num total de 426 gravuras, foi vendida por ele à Biblioteca Nacional. Dentro dessa coleção encontra-se uma série de representações de Nossa Senhora nas suas diversas invocações. Algumas dessas belas gravuras ilustram essa última edição do livro.

História de Nossa Senhora em Minas Gerais  constitui, seguramente, uma grande contribuição para a história da mariologia no Brasil. Para concluir, cito um trecho do capítulo dedicado por Augusto de Lima Júnior a Nossa Senhora do Carmo. Ao mencionar o grande número de igrejas e capelas dedicadas a Nossa Senhora do Carmo, segundo ele uma das denominações com que a Virgem Maria é mais reverenciada pelos mineiros, conclui o autor:

“A mais ilustre, entretanto, é a gloriosa Vila do Ribeirão de Nossa Senhora do Carmo, a famosa Mariana, criada para um trono arquiepiscopal, o mais antigo e o mais ilustre destas Minas Gerais. Foi no tumulto das aventuras do ouro que nasceu em nossa terra o culto pela Virgem do Carmelo, que, em seu trono erguido no alvorecer das Minas Gerais, contempla com olhos maternais a vida do povo mineiro através das gerações que passam. É desse trono que ela assiste impávida às estultas aventuras dos liturgistas, maritanistas e modernistas, que investiram contra o seu culto, desbaratando-os e restabelecendo seu prestígio no coração mineiro, de onde os sequazes do inferno pretendiam arrancá-la. Devoção veterana em Minas Gerais, Nossa Senhora do Carmo já terá perdoado aqueles que, como os Emboabas, nos começos de nossa vida como Capitania, pretenderam destruir o poder de nossas melhores tradições e, entre elas, o amor a Nossa Senhora, que esses forasteiros ignoravam estivesse tão arraigado na alma de nossa gente” (p. 113).

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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