ichingrd8O Livro das Mutações – I Ching em chinês – é, sem dúvida, uma das mais importantes obras da literatura mundial. Sua origem remonta a uma antiguidade mítica, tendo atraído a atenção dos mais eminentes eruditos chineses até os nossos dias. Tudo o que existiu de grandioso e significativo nos três mil anos de história cultural da China ou inspirou-se nesse livro ou exerceu alguma influência na exegese do seu texto. Assim, pode-se afirmar com segurança que uma sabedoria amdurecida ao longo de séculos compõe o I Ching. Não é, pois, de estranhar que essas duas vertentes da filosofia chinesa, o Confucionismo e o Taoísmo, tenham suas raízes comuns aqui. Esse livro lança uma nova luz em muitos segredos ocultos no modo de pensar tantas vezes enigmático desse sábio misterioso, Lao-tse e seus discípulos. O mesmo ocorre em relação a muitas idéias que surgem na tradição confucionista com axiomas aceitos sem serem devidamente examinados.

Ricahrd Wilhelm

[Wilhelm, Richard. I Ching: o livro das mutações. Prefácio de C. G. Jung. Introdução à edição brasileira: Gustavo Corrêa Pinto; tradução para o português: Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. Introdução de Ricahrd Wilhelm, p. 3]. 

Descobri o mundo maravilhoso do I Ching em agosto de 1986. Desde então, muitas páginas do meu Diário do Sádhana têm sido preenchidas com anotações e interpretações deste milenar texto de sabedoria chinesa, pois nunca mais deixei de consultá-lo, recorrendo a ele, com alguma frequência, ainda hoje. Surgido em período anterior à dinastia Chou (1150-249 a.C.), sua origem se perde nas brumas do tempo.

O I Ching é composto por sessenta e quatro figuras lineares, resultantes da

Os oitro trigramas de cuja combinaçào resultam os 64 hexagramas

Os oitro trigramas de cuja combinação resultam os 64 hexagramas

combinação de três linhas contínuas com três linhas interrompidas, os Kua. Deve-se a James Legge, quando de sua tradução do I Ching para a língua inglesa, a cunhagem dos termos trigrama e hexagrama para designar, respectivamente, os conjuntos de três e seis linhas que constituem os Kua.    

O princípio basilar do I Ching ancora-se no pressuposto de que nada é permanete, a não ser a impermanência, ou seja, tudo muda. Esse princípio está expresso num dos ideogramas usados na denominação do livro, I, traduzido por mutação. O I Ching tem sido mais usado com objetivos oraculares. O método mais antigo de consulta se vale de 50 varetas de caule de milefólio. Há, porém, um método mais prático, muito usado atualmente, no qual são utilizadas três moedas de igual valor. Quando comecei minhas consultas ao Livro das Mutações, adquiri com o sr. Aurimar Apoliano, um conterrâneo que coleciona moedas e cédulas antigas, três moedas de bronze, cunhadas em 1909. Acondicionei-as em um pequeno estojo, passando a utilizá-las sempre quando de minhas consultas ao Oráculo.

Deve-se ao sinólogo alemão Ricahrd Wilhelm uma das melhores traduções do I Ching. Aqui no Brasil, graças aos esforços de Gustavo Corrêa Pinto, dipomos de uma primorosa tradução em língua portuguesa desse livro, realizada em conjunto com Alayde Mutzembecer. No Prefácio à edição brasileira, Gustavo Corrêa Pinto adverte:

“Aos que estiverem lendo o I Ching pela primeira vez, gostaria de dizer que não se deixem esmorecer diante do que lhes pareça demasiado obscuro. Há de aclarar-se, pois não há noite que dure para sempre. É nesse esforço que se pode aprender a virtude da perseverança, tão enfatizada no Livro das Mutações. Ao relermos o I Ching, é necessário e recomendável que estejamos atentos ao perigo do que julgamos demasiado claro. Os dias também findam e o destino de todo saber é conduzir-nos ao não-saber. Só nesse cuidado poderemos cultivar a virtude da mordéstia, ressaltada no Hexagrama 15. O estudo do I Ching é um trabalho constante, no qual, mais que um acúmulo de conhecimento, se processa uma crescente conscientização do ignorado. Ao primeiro ano de estudo, em geral julgamos que estamos sabendo muito mais do que antes. Ao décimo ano, em geral descobrimos que desconhecemos o livros muito mais do que julgávamos. Ao início do estudo, procuramos o significado do I Ching através dos textos; a seguir, através dos Kua e, finalmente, na própria vida, da qual surgiram os kua, dos quais surgiram as palavras. O caminho deve reencontrar o ponto de partida e descobrir que no próprio caminhar tudo se modificou. Que a presente tradução possa tornar acessível, ao maior número de pessoas, o ponto de partida deste extrordinário caminho sem fim, e que o legado do passado possa assim ser transmitido para o futuro” (p. XVI).

Resta-me dizer que, no meu caso, posso afirmar que o objetivo almejado por Gustavo Corrêa Pinto tem se cumprido, pois a mim o I Ching proporcionou muito mais que “um ponto de partida”, uma vez que devo às inúmeras consultas a ele formulada ao longo dos anos alguns insights de inestimável valor para minha vida, os quais me provocaram mudanças tão valorosas quanto perenes.

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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