Ao ser convidado para escrever um texto para este evento em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, não pensei que estava na iminência de me ver diante de dilema tão grande. Um tema aparentemente simples se revelava, de fato, de extrema dificuldade. Perdoem-me o exagero, mas cabe aqui a palavra “extrema”. Senti-me perplexo com a minha reação ali, horas – e foram, de fato, muitas horas – ante a tela branca do computador, sem que as palavras começassem a ser digitadas convertendo-se em texto.

Minha perplexidade ancorava-se na convicção de que falar sobre a mulher não deveria constituir uma dificuldade tão grande. Sempre tive a sorte, desde criança, de contar com a proteção de uma mulher que fez para mim as vezes de anjo bom, amparando-me nos momentos de dificuldade. Considero esse um dos traços mais característicos das mulheres: uma extraordinária habilidade para, com a sutileza e pragmatismo que lhes é próprio, ajudar a nós, homens, a solucionar situações muitas vezes embaraçosas e para as quais não vislumbrávamos uma saída.

Devido, porém, ao fato de muitas vezes ficar nos bastidores, a ação da mulher nem sempre é notada. Foi essa constatação, aliás, que perpassa toda a história da humanidade, que levou o poeta romântico alemão Heinrich Heine a escrever, num momento de muita lucidez: “Ao ler a história universal, quando me impressiona uma ação ou um fato, parece-me ver, às vezes, a mulher oculta atrás, qual mola secreta”.

Agora que meu texto, afinal, ganhou fluidez, percebo que há tanto o que escrever sobre a mulher que eu poderia preencher páginas e mais páginas num livro que não teria fim. O fato é que, por mais que um homem diga, jamais conseguirá dizer o suficiente, quando o tema da sua escrita é a mulher.

Isso posto, percebo agora que o tal dilema de que falei no início tem, na verdade, outro nome: enigma. Vem-me à memória, aqui, um conhecidíssimo episódio da vida de Sigmund Freud, o criador da psicanálise. Certa vez, ao tratar com uma de suas amigas e discípulas prediletas, a princesa Marie Bonaparte, afirmou o velho mestre austríaco, referindo-se à indevassabilidade da alma feminina:

“A grande questão continua sem resposta e a qual eu mesmo não poderia jamais ser capaz de responder, apesar dos meus trinta anos de estudos sobre a alma feminina: O que quer uma mulher?”

Já no ocaso da vida, afirmaria ainda Freud que a mulher permanecia para ele um “continente negro”, querendo dizer com isso que o feminino continuava sendo o enigma por excelência. E não nos esqueçamos que se trata de um homem que tinha uma percuciência profundíssima do ser humano, especialmente da mulher, a quem dedicara a maior parte de muitas décadas de trabalho psicanalítico.

Mais próximo de nós, um outro grande conhecedor dos meandros da alma humana, o nosso genial Machado de Assis, escreveria, num certo trecho do seu romance Ressurreição: “…e não basta ver uma mulher para a conhecer, é preciso ouvi-la também; ainda que muitas vezes basta ouvi-la para não a conhecer jamais”.

Disso tudo, resta-me concluir que, sejamos solteiros ou casados, prosseguimos nós, homens, como tem acontecido desde o início dos tempos,  pela vida afora, sem jamais prescindir do inestimável amparo da mulher – que, sem que nos demos conta, muitas vezes é quem sustenta a nossa masculinidade – repetindo, qual Édipo diante da Esfinge, os inspirados e lúcidos versos do poeta indiano Rabindranath Tagore: “Tomo-te pelas mãos, e meu coração mergulha no escuro de teus olhos, procurando a ti, que sempre foges de mim por trás de palavras e silêncios”.

[Para Naza]

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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