“A vida não é para ser útil. Isso é uma besteira. A vida é tão maravilhosa que a nossa mente tenta dar uma utilidade para ela. A vida é fruição. A vida é uma dança. Só que ela é uma dança cósmica. E queremos reduzi-la a uma coreografia ridícula e utilitária. Queremos reduzi-la a uma biografia: alguém nasceu, fez isso, fez aquilo, fundou uma cidade, inventou o fordismo, fez a revolução, fez um foguete, foi para o espaço. Tudo isso, gente, é uma historinha tão ridícula… A vida é mais do que tudo isso. Nós temos de ter coragem de ser radicalmente vivos. E não negociar uma sobrevivência.”
Ailton Krenak
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Essas lindas palavras do grande Ailton Krenak me trouxeram diversas reflexões que quero compartilhar com vocês nesse texto. Estamos vivenciando uma pandemia e no momento em que publico esse texto estamos nos aproximando do fim do ano. Foram muitos desafios, dores, sofrimentos, crises, dificuldades a serem superadas etc. Só de estarmos vivos é motivo mais do que suficiente para agradecermos! Centenas de milhares de pessoas não conseguiram sobreviver ao Covid-19 aqui no Brasil.
Vendo essa realidade, as palavras do Krenak são um chacoalhão e um belo convite a vivermos radicalmente, e lembrando que radicalmente significa: viver de forma enraizada! E como podemos nos enraizar afinal? Nos colocando completamente presentes no aqui e agora, com consciência de tudo que nos envolve e envolve a coletividade.
Aos pouquinhos muita gente está se tocando que viver através do mero utilitarismo é um completo engano, uma ilusão absolutamente decepcionante. A visão utilitarista trata a tudo e todos como coisas, e não como individualidades, entende? Se você não é mais útil, é jogado fora, é descartado, quase como se fosse um lixo. Isso é muito cruel não acha?
O Krenak, tendo suas raízes fincadas na cultura indígena, tem um respeito profundo pela natureza e seus recursos. Ele sabe que devemos apenas usufruir o que a natureza nos dá, jamais possui-la, jamais devastá-la! Porém, para o sistema ultra capitalista no qual estamos inseridos, pensar assim é no mínimo ingenuidade.
Ao ler esse pequeno texto, até lembrei as palavras do querido psicólogo Rossandro Klingey, que ouvi em uma Live pelo instagram há poucos dias. Ele disse que nós precisamos usufruir as coisas, e não querer possuir, porque no fim das contas nada é nosso, nem mesmo o nosso corpo, que depois que morrermos vai voltar pra natureza, se fundir com a Terra, se transformando em carbono que vai se unir com outros componentes e assim continuar na natureza de forma diferente. Não é incrível isso?
Esse ano de pandemia forçou boa parte das pessoas a ficarem em casa, e através desse tempo mais prolongado e repleto de restrições, muitos se deram conta de que não precisam de tantas coisas pra viver e estão aprendendo a viver com menos. Eu fico encantado em ver cada vez mais pessoas acordando pra isso e finalmente se tornando menos consumistas.
Esse caminho de maior conexão conosco mesmos e com a natureza eu penso que seja o melhor caminho para que nós sobrevivamos como espécie nesse planeta que já não suporta mais tamanha devastação de seus recursos.
Portanto, ser radicalmente vivo é estar completamente conectado com o aqui e agora, cuidando mais de si mesmo, das relações e dos recursos da natureza.
Que nós internalizemos que a fruição da vida é infinitamente melhor do que a vida como mera utilidade…