Um dos capítulos mais engraçados da música popular brasileira, sem dúvidas, chama-se Ultraje a Rigor. A banda paulista encabeçada por Roger Moreira e que já teve Edgard Scandurra na sua ficha de pagamento, compôs uma série de canções marcantes para a balzaquiana geração 80, que até hoje são cantadas a plenos pulmões por um público seleto. Digo seleto por que ser fã do Ultraje não é fácil. Adeptos de um rock cru recheado de humor cáustico, inteligente e politizado, eles há alguns bons anos desistiram de viajar para divulgar seu trabalho. O motivo? Roger tem medo de avião. E hoje eles vivem num limbo entre a existencia e a não existencia. Mas, quando se tem merecimento, sempre aparece outro alguém para salvar sua memória do esquecimento. Foi o que fez a jovem jornalista Andréa Ascenção. Nascida em 1986, ela usava bico, quando a banda já havia estourado no Brasil com o clássico disco Nós vamos invadir sua praia. Por isso mesmo, ela deu o mesmo do disco à biografia que conta a história e as histórias dos Ultrajes. Nós vamos invadir sua praia, o livro editado caprichosamente pela Belas Letras, traz uma breve biografia de cada músico que já vestiu a camisa do periscópio azul de olhar matreiro. Traz ainda um relato da gênese de cada canção, disco e turnê, palavras de Kid Vinil – algo como uma consciência separada do contexto ou uma testemunha ocular – e um mapinha descrevendo cada formação da banda (foram 12!!). Mas, é importante deixar claro, Andréa não fez questão de esconder o quanto é fã do Ultraje a Rigor. E é aí que o livro dá uma derrapada. Como quem pretende redimir seus ídolos de pecados cometidos no passado, ela busca sempre argumentos para comprovar o quanto a banda é maravilhosa, mesmo que pouca gente saiba por onde eles andam hoje em dia. Pelo que os músicos dizem no livro, não há problema em Roger simplesmente dizer “não vamos divulgar nosso disco e pronto”. Vamos e venhamos, quem monta uma banda quer tocar e ganhar dinehrio com ela. Segundo Nós vamos… chega a ser um orgulho saber que Roger pode bater no peito e dizer “eu não preciso viajar”. Me engana que eu gosto… Com a falta de uma problematização diante de fatos como esse, (que não arranham o passado, mas comprometem o futuro do Ultraje) o livro ganha ares de chapa branca. Em certo momento, a autora supõe que Roger nunca fez uso de drogas. Qual é?! Ainda assim, é certo que Nós vamos invadir sua praia ganha importância por registrar para posteridade a história de um repertório que ganha pela cara de pau e por sacadas magistrais, como a eterna Inútil. Mas, enquanto houver Humberto, vai haver Engenheiros do Hawaii. E, enquanto houver Roger, haverá Ultraje a Rigor.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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