“A realidade é aquilo que, quando você para de acreditar, não desaparece”. A frase de Philip K. Dick não é uma passagem do livro que deu origem ao filme Blade Runner – O Caçador de Androides, mas cabe perfeitamente no tipo de reflexão que a obra proporciona quando lembramos que o futuro especulativo nada mais é que a representação da realidade.
Publicado em 1968, “Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?” acompanha Rick Deckard, o caçador de recompensas que, diferentemente da maioria da população, sobreviveu à guerra Terminus e permaneceu no planeta ao invés de emigrar para colônias interplanetárias. Os remanescentes são divididos em Normais (considerados relativamente saudáveis) e Especiais (aqueles que, biologicamente, não são aceitos pela sociedade) e vivem em uma Terra em condições desfavoráveis, devido à poeira radioativa que dizimou diversas espécies de vida.
A narrativa desponta a partir do desejo do protagonista em trocar sua ovelha elétrica, um objeto popular, por um animal verdadeiro, quando estes se tornaram símbolo de status após a devastação. Neste período, um trabalho para caçar androides surge como uma possibilidade para Deckard melhorar de vida financeiramente, se misturando a uma busca que justifique sua própria existência.
É fácil, na narrativa de PKD, associar acontecimentos à realidade, quando, por exemplo, Rick passa a questionar a moralidade de seu próprio trabalho e a representatividade dessas ações em sua vida. Em essência, a reflexão proposta pelo autor, ao comparar as inteligentes máquinas com seres humanos e fazendo contra ponto entre os animais autênticos com a legitimidade que os elétricos alcançam no desenvolvimento, mapeia a discussão acerca da condição humana.
A edição lançada ano passado pela editora Aleph traz, como bônus, a última entrevista com o autor que morreu aos 53 anos, meses antes da estreia da adaptação cinematográfica do livro. Mesmo que o romance seja uma leitura tão introspectiva e questionadora quanto agradável, a conversa com Philip K. Dick encerra a publicação como uma porrada de quem se percebe menor que a própria obra.