Esta crítica pode conter spoiler.
O Homem-Aranha de Sam Raimi, um clássico de adaptação cinematográfica dos super-heróis, resiste na memória recente da cultura pop, além do controverso reboot de Marc Webb. Dito isso, é preciso estabelecer que “Homem-Aranha: De Volta ao Lar” é, antes de tudo, um produto de seu tempo.
Só nos últimos 15 anos, a origem do herói foi contada duas vezes no cinema. Arriscar um novo recomeço nesse período vem acompanhado de decisões narrativas que desafiam o purismo dos fãs, mas sempre entendendo bem as diretrizes estabelecidas por Stan Lee e Steve Ditko lá em 1962.
O universo Ultimate se faz ainda mais presente. Seja na personalidade de um Homem-Aranha que renasceu nos quadrinhos, seja ao estabelecer um marco importante para o Universo Cinematográfico da Marvel: Miles Morales, o Aranha Ultimate, também existe no MCU. O que isso significa para os filmes da Marvel, ainda não é sabido, mas certamente não é nada a curto (ou médio) prazo.
As semelhanças com o universo Ultimate são muitas. Do uniforme presenteado por uma grande organização; passando pelo melhor amigo Ned (Jacob Batalon), claramente inspirado em Ganke Lee; à presença de Aaron Davis, interpretado pelo competente Donald Glover. É esse contexto de renovação o maior mérito do longa.
A vida escolar de Parker, na pele de Tom Holland, nunca foi tão bem trabalhada na tela grande. Aqui, Aranha é um youtuber descolado enquanto seu alter-ego é o maior nerd da escola. Desajeitado e apaixonado por Liz (Laura Harrier), a garota popular pouco presente nos quadrinhos, seguindo um aproveitamento de arquétipos que não soa forçado. Com elenco de apoio jovem apostando na diversidade, o primeiro pipocão do diretor Jon Watts foge da fórmula repetida nas adaptações anteriores e traz personagens marcantes, ainda que fora do eixo mais popular dos quadrinhos.
Embora tropece em alguns momentos, principalmente nas cenas de ação e na obscura batalha final, o longa apresenta um Abutre com motivações verossímeis. Interpretado por Keaton, o vilão é mais perigoso e ainda mais relevante, do ponto de vista narrativo, do que o Adrian Toomes dos quadrinhos. Arrisco dizer que é (quase) tão bom quanto o Doutor Octopus de Alfred Molina.
Marisa Tomei, aos 52 anos, também entrega uma May coerente e atual. A moderada presença de Robert Downey Jr. é alternativa inteligente para resoluções necessárias de atualização, além de costurar a teia da Guerra Civil. Só não tem necessariamente um apelo dramático que a figura paterna do Tio Ben representava para Parker – não é a proposta.
Ainda é difícil saber se Tom Holland é o Homem-Aranha definitivo, mas é, de longe, o melhor Peter Parker. O resultado positivo do fim de semana de estreia (US$ 257 milhões) sinaliza possibilidades importantes para a parceria da Marvel com a Sony. O que fica, portanto, é um Aranha que abraça sua essência como o bom amigo da vizinhança que sempre foi, lutando para conciliar a vida escolar com o dever de vigiar Nova York. Divertido, atual e despretensioso, “Homem-Aranha: De Volta ao Lar” é uma eficiente atualização do clássico.
Ficha técnica
Homem-Aranha: De Volta ao Lar (Spider-Man: Homecoming, EUA, 2017), de Jon Watts. Aventura. 12 anos. 133 minutos