Sobrado do Barão do Crato, ao lado a Igreja Senhor do Bonfim

O sobrado de Bernardo Duarte Brandão – o Barão do Crato – foi construído há mais de 200 anos em Icó – e foi palco de brigas; de amor impossível; e é cercado de lendas.

Crueldade

Afonso fala com a atual proprietária, dona Doraci, e subimos ao sobrado. Piso e portas são de madeira da época; o marido dela, seu Arnaldo, me mostra uma bola de ferro [segurei, deve pesar mais de dez quilos] e diz que a encontraram no quintal: o barão costumava castigar os escravos fazendo-os arrastar o pesado metal. Ele também diz que encontrou vários dentes humanos: segundo ele conta, arrancar dentes a sangue frio era outro castigo impingido pelo Barão do Crato a seus escravos.

Dona Doraci mostra a fotografia do pai e da mãe na parede, diz que são seus “anjos da guarda”. O pai era telegrafista dos Correios – “nem na calçada ele ia sem terno” – e sempre teve cuidado em preservar a casa, tarefa que Dona Doraci tomou para si.

Arrogância

Talvez devido à sua arrogância, a histórica oral conta que do térreo do sobrado saem dois túneis: um para o Teatro da Ribeira dos Icós e outro para a Igreja Matriz: o barão não se misturava ao povo. Afonso me diz que havia proposto ao Iphan verificar se os túneis de fato existem, mas, segundo ele, o instituto achou mais interessante deixar correr a lenda. [É como dizer John Ford: “Se a lenda for mais interessante que a realidade, publique-se a lenda”.]

Briga

A meia quadra do sobrado do Barão, morava dona Glória Dias, mulher valente, dona de fazendas. Debaixo das duas frondosas tamarineiras, que ela mesma plantara, ela abrigava seus animais e descarregava cargas que trazia de suas fazendas. Corria o ano de 1840.

Incomodado com o barulho e a sujeira, o Barão disse que iria cortar as duas árvores. Dona Glória, incontinenti, comprou uma carreta de pólvora e disse que caso suas tamarineiras fossem cortadas, ela explodiria a casa do Barão. Conhecendo o gênio forte da mulher, o Barão recuou.

Don Glória doou a carreta à Igreja do Senhor do Bonfim e a pólvora foi utilizada na festa comemorativa da padroeira – e a tradição de soltar fogos na data é mantida até hoje.

Amor

No entanto, o caso do Barão com a sua própria irmã foi a mais fantástica história de amor que eu já ouvi. Ainda jovem o barão vai à Europa para complementar seus estudos; quando viaja, sua irmã ainda é uma criança.

Quando volta, ela transformara-se em uma linda moça. O barão apaixona-se por ela, é correspondido – e ele quer conhecê-la, digamos, no sentido bíblico. Ele move céus e infernos para casar-se com a irmã; vai até o Vaticano falar com o papa, mas nada consegue.

Volta derrotado e frustrado – resolve nunca se casar, no que é seguido pela irmã: morrem os dois solteiros.

Afonso compara a história com “Romeu e Julieta”, e diz que o romance inventado por Willian Shakespeare, tornou Verona, na Itália, a cidade mais procurada pelos amantes – e pergunta por que a história do Barão com a irmã é tão pouco conhecida.

[Para ler todos os posts sobre o assunto clique abaixo em “Roteiro de férias”.]