Segundo Reginaldo Prandi, um dos fundadores do Datafolha, o grupo de “adoradores” de Bolsonaro é a “parte ruim da população, que já existia e que nunca teve quem falasse por ela ao ouvido da nação. Agora tem”.

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As manifestações de 2013 revelaram uma realidade que estava, pelo menos aparentemente, submersa na política brasileira. Qual seja, a existência de um segmento de extrema direita que encontrou seu desaguadouro em Jair Bolsonaro, eleito presidente da República com o apoio deste setor: aqueles contra “tudo o que está aí”, vendo na esquerda, principalmente no petismo, a fonte de todos os males. Os mesmos que elevaram a Lava Jato a uma espécie de Santo Graal, tendo Sérgio Moro como seu profeta.

Esses setores começaram a se fragmentar logo nos primeiros meses do governo Bolsonaro. A primeira e importante baixa foi do Movimento Brasil Livre (MBL), que agia como linha auxiliar do candidato, mas afasta-se agora do presidente e da sua política. O próprio PSL, partido de Bolsonaro, passa por uma violenta briga interna, que ainda não se sabe qual será o desfecho.

As pesquisas sobre o governo mostram seguidas quedas de popularidade do presidente, uma linha descendente que cai a cada nova consulta. No entanto, Bolsonaro continua a merecer aprovação de cerca de 30% do eleitorado. Tenho defendido a tese que esse percentual vai se estabilizar em torno 20%, um setor de extrema direita que vai acompanhar Bolsonaro e sua truculência, apoiando qualquer medida que ele tome.

Por isso, aquilo que muita gente vê como “maluquice” eu vejo como estratégica para – roubando um termo da área dos negócios – “fidelizar” sua clientela reacionária. No meu entendimento – como já escrevi neste blog – ele usará essa base para, sobre ela, disputar eleitores indecisos. Mal comparando é o mesmo que acontece o PT, que consegue mobilizar 30% do eleitorado em qualquer circunstância – e precisa conquistar o restante dos votos para conseguir eleger-se.

Felizmente, a levar em conta um estudo Reginaldo Prandi, um dos fundadores do Datafolha, que analisou o fenômeno mais detidamente, eu estou errado, pelo menos quanto ao percentual de bolsonaristas “heavy” (duros), como ele chama. Prandi é professor professor Emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanos da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) e publicou artigo sobre o assunto no Jornal da USP, com o título Os 12% do presidente – em que lugar da sociedade habita o bolsonarista convicto? Ele define da seguinte modo essa banda:

“O grupo dos mais afinados com Bolsonaro é formado pelos que votaram nele, aprovam seu mandato e concordam com suas declarações. São seus adeptos fiéis, entusiastas fanáticos, para não dizer adoradores, em qualquer circunstância. Representam 12% da população com 16 anos ou mais. É o chamado grupo ‘heavy’ do presidente, aquele núcleo duro de apoiadores irrestritos constituído por bolsonaristas radicais”.

Na ponta oposta do espectro estão os 30% que não votaram em Bolsonaro, reprovam seu governo e discordam do que ele diz. “Sobram 58% que se distribuem pelas categorias intermediárias, ora apoiando, ora rejeitando palavras e medidas do presidente, a depender de cada situação”.

Nesse aspecto, a análise do professor é concordante com a que venho fazendo por escrito ou nos comentários na rádio O POVO/CBN. Como explica Prandi de modo mais erudito:

“O grupo dos 12% ‘heavy’ não se destaca por seu tamanho, mas se sobressai por garantir uma base social concreta que legitima um presidente que afronta princípios da democracia, da cidadania, da solidariedade e do respeito ao próprio cargo que ocupa”.

Para Prandi, o grupo que toma Bolsonaro como um líder absoluto, é a “parte ruim da população, que já existia e que nunca teve quem falasse por ela ao ouvido da nação. Agora tem”. E assim, “pelo que suas atitudes recalcitrantes indicam, é no espelho dos 12% que o presidente prefere ver sua imagem refletida. Com um toque religioso meramente utilitário, quando não interesseiro”.

No artigo, o professor ainda traça um perfil desses bolsonaristas de extrema direita, do grupo social a que pertencem, e em quais estados da federação estão mais disseminados. Spoiler: não é no Nordeste. ; )

Veja o texto completo no Jornal da Usp.

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