Foto: Reprodução Facebook

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O primeiro contato que tive com a banda Sóbrios & Ébrios foi um cover de “Something”, canção icônica dos Beatles, que embalou alguns momentos importantes da minha vida nos últimos meses. A honestidade com a qual executaram aquele clássico me tocou profundamente, mesmo com a péssima qualidade de som e vídeo na Praça dos Leões. Era um registro da apresentação da banda no Manifesta, festival que ocorreu em 2015, postado no perfil da Sóbrios & Ébrios no Facebook.

Aquele cover foi a porta de entrada para conhecer as canções de autoria do grupo, que passeiam do som psicodélico dos Beatles, passando pelo rock progressivo de bandas como Pink Floyd e King Crimson, até chegar no blues e no jazz. Destaco a canção “Coming Son (O segundo voo de Ícaro)”, rock progressivo da melhor qualidade. Saber da história por trás dessa canção aumentou minha empatia por ela (conheça essa história na entrevista abaixo).

Sóbrios & Ébrios é um projeto recente. O quinteto existe oficialmente desde 2015.O que não quer dizer que os músicos sejam iniciantes. Os integrantes do grupo possuem bagagem na cena local. Samyr Cruz (bateria), por exemplo, foi tecladista da banda Síntese por 10 anos. Na formação atual, já acumulam feitos importantes na curta trajetória. Tocaram no Planeta Rock, festival de nível nacional em São José do Rio Preto-SP e foi segundo lugar na edição 2015 do Bem Vindo Unifor.

Sóbrios & Ébrios no Planeta Rock (Foto: Ricardo Boni)

Sóbrios & Ébrios no Planeta Rock (Foto: Ricardo Boni)

No próximo sábado, 5, a banda fará a quinta apresentação da carreira, no lançamento do CD e DVD da Voris Vulgar, no Toca Good Garden, no bairro Bom Jardim. Sóbrios & Ébrios conversou com o Ceará & Rock sobre o futuro da banda e o momento atual do movimento cultural em torno do rock em Fortaleza.

Ceará & Rock- O nome da banda é Sóbrios & Ébrios. Por que este nome? Tem alguém na banda que não bebe?

Samyr Cruz (bateria): Sim! Na verdade, a maioria dos integrantes são sóbrios (Davi, Marcola e Tom), apenas eu e o Rômulo somos os ébrios do grupo, mas na verdade acho que o nome é mais um trocadilho mesmo, afinal, todo sóbrio tem um pouco de ébrio e vice-versa.

C&R- Parece que a banda tem as mais diversas influências dentro do rock clássico. Falem um pouco sobre cada integrante e de que forma as influências de cada contribuem para o som da banda.

Samyr Cruz: Isso é verdade, o grupo é na verdade um coletivo musical, onde as influências individuais de cada um são bem nítidas, tanto na parte técnica como criativa. Marcola Oliveira (tecladista), por exemplo, traz uma vertente bem jazzística pro projeto, além de um virtuosismo típico dos músicos do mundo gospel (suas origens musicais estão no mundo gospel). Já o Tom Lacerda (guitarra/violão) é nosso caçula (entrou por último na banda) e está contribuindo bastante com seu vasto conhecimento harmônico, indispensável pra segurar nas horas de solos. As composições ficam a cargo dos outros três: Samyr Cruz, Romulo Lopes e Davi Silvino. Cada criação carrega a personalidade de cada compositor e mistura-se àquelas citadas influências de cada integrante.

C&R– Notei uma pitada de rock progressivo, rock psicodélico e até um pouco de jovem guarda com uma levada blues no som de vocês. Estou errado? Fala um pouco dessa mistura na hora de compor as canções.

Samyr Cruz: Pois é, tudo tem a ver com o que foi dito antes, somos um coletivo musical, é como se fossem 3 bandas em uma só, há uma diversidade artística fruto da diversidade de compositores e de cantores, entretanto, há um elemento que interliga toda essa pluralidade: O Rock! Você pode ouvir 3 canções diferentes e pensar que são 3 bandas diferentes, mas sempre saberá que ali há uma banda de Rock, acredito que nessa forma peculiar de se apresentar reside nossa personalidade, seja lá o que isso signifique, aí está a nossa cara.

Romulo Lopes (baixo e voz): Além da diversidade artística, existe uma diversidade no universo particular de cada um, é isso se reflete mesmo que de forma involuntária.

C&R- Vocês vão fazer show até em Quixadá (o show é no dia 23 de abril), também já tocaram em São Paulo. Como é o cenário para quem quer tocar aqui no Ceará? Sai grana, ou vocês tão fazendo rock por amor mesmo? Vi que vocês fazem muitos covers. Vocês tem apresentações só com covers, ou os covers se misturam ao som autoral de vocês?

Samyr Cruz: Fazer rock no Ceará é um eterno desafio, é pra quem gosta mesmo do que está fazendo. Quase nunca rola grana pro autoral, e quando rola é negativamente desproporcional. É por isso que temos tantos trabalhos artísticos originais e verdadeiros aqui na terrinha.  Você percebe que o rock é feito de coração mesmo, se não rolar diversão, identidade e realização artística, não há por que fazer. Diferente disso, o cover tem mais espaço. É meio que uma comodidade tocar cover, já que você sempre terá um público pra isso. Mas não vejo isso como um incentivo benéfico, acho que existe uma certa preguiça (ou falta de vontade) tanto de empresários/produtores como do público em geral em fazer o autoral crescer, sem contar com a responsabilidade também das bandas em organizar de forma mais profissional seu material. Apesar disso, vejo um constante crescimento no profissionalismo das bandas cearenses e afirmo que é na periferia que o rock acontece de verdade, é uma efervescência! Quanto ao cover, a gente optou por incluir algumas canções que gostamos de tocar (por diversão e não para homenagear banda nenhuma, isso é balela) pra dar uma diversificada no trabalho, isso nos dá mais abrangência em relação à possibilidade de shows e agrada aquele público mais impaciente (preguiçoso), mas é algo secundário, o principal é o autoral.

Davi Silvino(guitarra e voz): Fortaleza, infelizmente, é considerada a capital nacional do cover. Vemos grandes bandas daqui terem que meio que doutrinar o público em seus shows para poder mostrar músicas autorais… Movimentos já foram desenvolvidos para impulsionar a música autoral daqui e não deram certo. Mas existe uma crescente da música autoral aqui em Fortaleza que logo, logo não vai dar pra ignorar mais. A elite daqui é muito ‘forrozística’ e mercenária. Parece que enquanto não fizermos o autoral gerar milhões, ele será ignorado por quem pode e deve investir. Mas também não dá pra esperar pela boa vontade dos empresários.

C&R– Quais as maiores dificuldades que uma banda de rock enfrenta hoje em Fortaleza?

Samyr Cruz: Há uma carência de canais tradicionais de divulgação, programas locais de TV (ou até mesmo pela internet), programas locais de rádio, onde houvesse uma maior divulgação das músicas, acho também que poderia haver uma maior quantidade de festivais com edições fixas. Em São José do Rio Preto-SP, que é uma cidade menor que Fortaleza, tem o Festival Planeta Rock (de que participamos), e é bem interessante, uma espécie de concurso nacional para bandas ‘pequenas’, onde as mesmas tocam com uma estrutura massa, sem contar que dividem o mesmo palco de bandas nacionais, o que garante um público robusto, acho que desenvolver mais ideias como essa seria bem legal por aqui.

Davi Silvino: A impressão é de que parece que falta espaço, pois os que existem de fato não possuem a visibilidade que merecem. Faltam espaços para divulgação e apresentação mesmo. Não que tais coisas não existam, mas certamente são insuficientes. O setor público também tem suas falhas, já que muitos dos editais de música contemplam quase que exclusivamente a cultura popular e regionalizada, mas o rock é popular! O rock não pertence mais a uma cultura inicial, limitada… é uma expressão atualmente universal.

C&R– Como os integrantes da banda fazem para sobreviver? Que outras atividades vocês desenvolvem para se manter?

Samyr Cruz: Todos trabalham em outras atividades: eu e o Davi somos servidores públicos (eu na área jurídica e o Davi na área musical, ele é mestre em música), Marcola (Oliveira, teclado/voz) é estudante e professor de música; Romulo e Tom (Lacerda, guitarra/violão) atuam na área comercial.

C&R- Fala um pouco sobre a canção Coming Son (O segundo voo de Ícaro). Como foi o processo de composição dela? Ela me lembrou bastante alguns ‘progs’, como Camel e King Crimson, muito bonita, por sinal.

Samyr Cruz: Cara, essa música foi feita para meu filho enquanto ele ainda estava na barriga da mãe, é como se fosse uma espécie de tentativa de diálogo (risos) e ficou guardada em um gravador por anos, meu filho está fazendo quatro anos hoje (25 de fevereiro). Eu realmente me identifico muito com as bandas citadas, principalmente o Crimson, e considero um elogio tremendo ter uma canção equiparada às deles. Mas, mesmo levando em conta que é inegável se tratar de uma canção com requintes de progressivo (assim como ocorre também em ‘Montanha-Russa’), ela surgiu de forma totalmente natural e autônoma, fruto de sentimentos extremamente verdadeiros de um futuro pai. E depois contou bastante com a participação de todos da banda, talvez por isso ela seja tão original aos ouvidos de quem escuta.

Romulo Lopes: Nós achamos que ela é o nosso xodó, quando foi mostrada no ensaio, parecia que todos já conheciam a música, os arranjos fluíram leves, com magia, chegou a ser emocionante.

Formação atual:

Davi Silvino – guitarra e voz
Romulo Lopes – baixo e voz
Samyr Cruz – bateria e voz
Marcola Oliveira – teclado e voz
Tom Lacerda – guitarra/violão

About the Author

Aflaudisio Dantas

Repórter com passagem pelo jornal O Povo. Como membro da equipe de esportes do jornal, atuou na cobertura da Copa do Mundo, em 2014. Também fez coberturas sobre os principais clubes do futebol cearense e escreveu sobre outros esportes. É fascinado por rock e por contar e ouvir boas histórias

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