Roberto Frejat, Ezequiel Neves, Leo Jaime, Bebel Gilberto, Leoni, Guto Goffi, Ney Matogrosso, Caetano Veloso. Mais do que intérpretes e parceiros, Cazuza era hábil em se cercar de bons amigos. Jovem carioca escolado nas areias de Ipanema e Copacabana, era das noitadas cheias de gente e boemia que ele tirava o material da sua poesia.

No meio de tantos companheiros estava o jovem músico George Alberto Heiborne Israel, violonista e saxofonista do Kid Abelha. Juntos, eles compuseram uma série de canções emblemáticas da geração 80. Uma parte dessas músicas eles mesmo laçaram, uma outra foi dada para amigos gravarem e uma terceira parte foi se perdendo com o tempo. Com a proximidade dos vinte anos da morte de Cazuza, lembrados no próximo 7 de julho, George Israel decidiu revirar seu baú de canções e reunir essas parcerias com o amigo.

A busca começou no final do ano passado e o resultado chegou agora às lojas com o nome 13 parcerias com Cazuza (Universal Music). Com produção e participação de Dadi, George selecionou para o disco 13 composições da dupla, mais outros parceiros, que vão desde clássicos do rock nacional até canções inéditas. “Foram as músicas que mais bateram, sabe?”, explica George, em entrevista por telefone ao O POVO. Algumas delas, conta George, ele já nem lembrava mais. “O tratamento inicial foi de ficar encantado com as músicas e reaprender a cantar e tocar. Algumas estavam meio de lado e precisavam sair da prateleira. A gente foi então achando um som sem ter muita referência com as versões originais. Pra alguns, elas podem até soar como inéditas”.

George lembra que, embora tenham estudado no mesmo colégio, só foi conhecer Cazuza depois que ambos já tinham suas bandas. O responsável pelo encontro foi Frejat que foi também quem fez o convite que deu origem à primeira parceria dos três. A música de chama Amor Amor e entrou na trilha sonora do filme “Beth Balanço”, de 1984. “Comecei mandando músicas pra ele e a primeira nossa parceria foi essa. Ele tinha uma brincadeira de me chamar de ‘Parceirinho’ e ficou me mandando letras”. Famoso pelos seus excessos quando o assunto era sexo, drogas e rock’n’roll, na hora do trabalho, Cazuza agia diferente. “Ele era divertido, mas nem sempre. O Cazuza era muito rápido pra compor, no sentido de ter cartas na manga. Ele não precisava de muito tempo para elaborar uma música. Era muito objetivo. Eu via que compor pra ele não era uma coisa difícil”.

Seguindo o modelo do amigo, George Israel também se cercou de um grupo de amigos na hora de fazer seu novo disco. A lista é grande e vai desde companheiros de geração, como Paulo Ricardo e Evandro Mesquita, até gente nova como Marcelo D2 e Tico Santa Cruz. Logo na abertura, quem divide os vocais com o anfitrião é o próprio homenageado. Entre as raridades que George encontrou em seus arquivos, estava uma fita K7 com uma gravação em quatro canais de Você vai me enganar sempre II na voz de Cazuza. Parceria deles com Nilo Romero, o reggae ganhou ainda a participação do baixista Family Man, que tocou com o Bob Marley, e do baterista Charlie Lalibe, do Alpha Blondy.

Priorizando o clima ensolarado, 13 Parcerias com Cazuza já vem rendendo novos frutos. No dia 2 de junho, George gravou o show de lançamento do disco realizado no Canecão (RJ) para lançar em DVD, ainda sem data. A gravação teve participações de Elza Soares, Leo Jaime, Ney Matogrosso, Pepeu Gomes, Os Roncadores e Sandra de Sá, entre outros. Econômico quando o assunto é Kid Abelha (“Ele ta hibernando. Assim que sair da caverna nós avisamos”), George diz que agora pretende viajar pelo Brasil mostrando seu novo trabalho. “O disco não é um tributo. É um disco de um compositor que ta trazendo essas canções”. Mas, quando pergunto o que o parceiro diria das novas versões, ele para um pouco e responde. “Engraçado, não me passou muito isso pela cabeça”.

E mais:

> George Israel fez sua estreia solo em 2004 com o ótimo Quatro letras. Três anos depois veio Distorções do meu jardim. Além destes trabalhos, em 2006, ele lançou Os Britos Cantam The Beatles, ao lado de Guto Goffi, Nani Dias e Rodrigo Santos.

Acompanhe as faixas comentadas de 13 parcerias com Cazuza:

1. Você vai me enganar sempre II – dueto virtual com Cazuza, trata-se de uma boa homenagem ao poeta. O reggae inédito vem reforçado por Family Man, baixista do Wailers, e de Charlie Lalibe, baterista do Alphablondy.

2. Brasil – em ritmo mais lento, Elza Soares divide os vocais com George Israel em um dos grades hinos de Cazuza. Pra reforçar, Marcelo D2 faz ao papel de mestre de cerimônias.

3. De quem é o poder? – gravada em 1989 pelo Kid Abelha, a faixa mistura crítica social com lamentos amorosos. A pouca voz de George compromete o resultado.

4. Completamente blue – gravada por Cazuza em 1987 e por Fagner em 1992, este bom rock ganhou um levada reggae que perdeu sua intensidade.

5. Solidão que nada – uma das belas baladas do poeta exagerado, aqui aparece bem defendida por Sandra de Sá. Uma das melhores do disco.

6. Blues do ano 2000 – em clima família, este belo blues vem vitaminado pelo duelo de guitarras de Frejat e seu filho Rafael. A faixa traz ainda a bateria de Leo e o baixo de Fred, filhos de George Israel.

7. 4 letras – Ney Matogrosso surge soberbo nesta composição póstuma de Cazuza. A letra foi musicada por encomenda de Ney para um tributo ao poeta, que acabou não saindo.

8. A inocência do prazer – lançada por Dulce Quental em 1988, George Israel acerta no tom e resgata bem uma canção esquecida do seu repertório.

9. Amor, amor – Fiel ao original que foi trilha do filme Beth Balanço, George mexe pouco nesta canção que inaugurou sua parceria com Cazuza.

10. Burguesia – creditada como “A burguesia”, a música reaparece em versão lenta e com os vocais de Tico Santa Cruz, que ainda atualiza a crítica lembrando “uma cueca cheia de dólares” e mandando pôr “um galho de arruda na cadeia”.

11. Eu agradeço – pescada do disco Burguesia, a letra traz um desabafo pesado de Cazuza diante da doença que lhe tiraria a vida pouco tempo depois.

12. Mina – rockão adolescente lançado em 1990 por Leo Jaime, volta agora turbinado pelos bons vocais de Paulo Ricardo e pelos metais dos Roncadores.

13. Nabucodonosor – mais pra tiração de sarro que pra música, a faixa traz as participações divertidas de Evandro Mesquita nos vocais e do ator Marcelo Novaes na gaita.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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