Domingo, 10 de abril, 18h30. Enquanto do céu caia uma chuva fina que fazia cair a temperatura, no chão uma bagunça organizada cercava e Estádio do Morumbi. Se do lado de dentro uma multidão se espremia para assistir a segunda noite brasileira da tão falada turnê 360º da banda U2, fora, uma fila de carros caminhava a passos lentos para largar fãs e admiradores do quarteto o mais perto possível das enormes filas de entrada. Mesmo com tanta gente, (onde se inclui vendedores de blusas, faixas e bandeiras com fotos da banda, cambistas vendendo ingressos superfaturados e muitos seguranças orientando o público e motoristas) tudo funcionava sem confusão.

A expectativa do público que preencheu cada espaço do estádio era justificável. Com o show deste domingo, a turnê 360º tornou-se a mais lucrativa da história ultrapassando os US$558. Até então, o record estava com a Bigger Bang Tour dos Rolling Stones. Além disso o U2 preparou um curioso palco em formato de aranha (ou garra ou nave espacial, como alguns preferem), e convidou o quarteto, também irlandês, Muse para a abertura. No palco pontualmente às 19h30, o Muse mostrou, por 45 minutos, um repertório que, apesar de pouco conhecido, empolgou e impressionou quem estava ali. “Pô, mano. Tu se liga no som desses caras?”, foi um comentários que passou ali.

Para a sorte de quem havia se arrumado todo para ir ao Morumbi, pouco antes do Muse começar sua apresentação, a chuva, que já não estava mais tão fina assim, deu lugar a um céu parcialmente limpo. “Esse Bono só pode é ter um pacto com Deus”, arriscou uma moça de sotaque pernambucano. Até então, a capa de chuva ainda era que ditava a moda no Morumbi.

Se tem ou não esse pacto, não sei. Mas é fato que às 20h30, quando a contagem regressiva deu sinal verde para a entrada do U2, algumas estrelas começaram a aparecer. Se, no sábado, o show começou com Trem das Onze (Adoniran Barbosa), no domingo foi com A minha menina, Jorge Ben e Mutantes, sainda pelosa caixas em homenagem à cidade que os recebia. Quem já tinha visto o show do sábado, foi presenteado com outras (poucas) modificações na ordem do repertório do domingo. Pride, I still haven’t found what I’m looking for, Beautiful Day, Mysterious ways, Elevation, I’ll go crazy if I don’t go crazy tonight, Vertigo foram algumas das que Bono, Edge, Larry e Clayton mandaram para o público ao longo de mais de duas horas. Even better than a real thing foi a eleita para abrir todas as três noites dos ingleses. Uma curiosidade: Zooropa, do disco de mesmo nome, foi interpretada pela primeira vez ao vivo nesta turnê. No domingo, mais uma surpresa: Seu Jorge subiu ao palco para dividir com a banda The Model, música do Kraftwerk gravada pelo brasileiro junto com o grupo Almaz. “Oubrigadôu, Brazil”, dizia Bono constantemente.

No centro daquele picadeiro high tech, que mudava de cor e tamanho e emanava luzes de todos os lugares, Bono Vox assumia o comando do espetáculo e não perdia uma chance de afagar o ego dos fãs. Pra quem tem no cantor a imagem de alguém mais preocupado com a pose do que em comandar a plateia, surpreenda-se. A energia com que ele se mexe e balança o pedestal é digna de banda que ainda tem que mostrar serviço. “Sei que muitos artistas, como Radiohead e Coldplay, já disseram que amam vocês. Mas, só nós compreendemos vocês. Nossa relação é como um casamento”, brincou ele enquanto uma legenda traduzia tudo pelo telão gigante. “Gostaria também de agradecer o governador Geraldo Alckmin que me mandou uma mensagem linda que dizia: Amanhã ninguém trabalha em São Paulo”.

Como já é um clichê nos shows de rock, Mr. Bono mais uma vez convidou uma fã para sentar no chão do palco e ler um texto que serviu de introdução para o último número da noite, Walk on. De volta para o bis, após um longo discurso do líder africano Desmond Tutu, o quarteto volta ao palco falando sobre a importância de o mundo voltar seus olhares para ao Brasil. “Aqui não é o país do futuro. É o país do presente”, disse antes de falar sobre fome, Aids e a campanha One, que deu a deixa para o primeiro bis, incluindo uma citação do gospel Amazing Grace. Finda o primeiro bis, e mais uma vez o quarteto assume os instrumentos já com parte do público indo embora. “Ta todo mundo de boa? Queria que vocês soubessem que esta foi uma noite inesquecível para nós”, foram as últimas palavras de Bono. A julgar pelos sorrisos, foi também para a plateia. Importante, não sei se existe o tal pacto com Deus, mas logo que o show acabou o céu voltou a ficar nublado.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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