Em 1978, tanto o Brasil quanto Maria Bethânia estavam às vias de viver novos momentos de suas histórias. Quanto ao País, se aproximava o tempo da abertura, da volta da democracia e o fim do período nefasto em que os militares ditavam as regras. Nesse cenário menos nublado, Bethânia também buscava mais leveza, tons menos carregados que o do sombrio “carcará”. Era chegado o momento das canções assobiáveis. Nada de dramas ou pássaros proibidos.

O resultado dessa busca veio no formato do disco Álibi. Produzido por Perinho Albuquerque e pela própria cantora, Álibi mostra a baiana se debruçando sobre a feminilidade, o amor desmedido, o sonho, a liberdade. Ponto de ruptura na obra da artista, na época com 32 anos, o disco tornou-se popular e logo alcançou a incrível marca de um milhão de cópias. Tamanha vendagem era algo inédito para uma cantora brasileira. Mas, um passeio pela lista de músicas e é possível perceber o motivo de tanto sucesso. Era uma mulher firme e decidida a seguir a vida que estava ali.

Como em Explode coração (Gonzaguinha) cuja interpretação absoluta, profunda, inspirada fez desta uma canção obrigatória em todos os seus shows dali em diante. Ou em Negue (Adelino Moreira/ Enzo Almeida Passos), sem rodeios ou dissimulações, um clássico da dor de cotovelo. Ao lado da amiga Alcione, Maria Bethânia canta os amores bandidos e marginais das mulheres da vida em O meu amor, faixa pescada da Ópera do Malandro, de Chico Buarque. Mais juvenil e colorido, Sonho meu traz a voz divina de Gal Costa em mais um entre os muitos clássicos de Álibi. O belíssimo samba de Ivone Lara e Délcio Carvalho marca o reencontro das conterrâneas, dois anos após a turnê dos Doces Bárbaros. Os timbres opostos e complementares de Gal e Bethânia soam como nunca nessa gravação.

A faixa-título, do então novato Djavan, carrega toda a melancolia do grave de Maria Bethânia para falar da dor do amor não correspondido. Única faixa de intenção política, Cálice esperou cinco anos até ter sua gravação liberada pela censura. Composição de Gilberto Gil e Chico Buarque, encontra aqui uma de suas gravações mais famosas. Encerrando com Interior, da violonista Rosinha de Valença, que deixa subir o cheiro de orvalho e terra molhada, esse 18º disco de Maria Bethânia abriu as portas para que outras intérpretes seguissem outros caminhos, que não somente o do protesto. Deixando de lado os conceitos intrincados e canções teatrais, a intérprete apenas escolheu canções que poderiam ficar bem na sua voz abençoada, reuniu amigos e se deixou soar popular como nunca. O resultado foi um clássico à altura do seu talento.

Faixas de Álibi (1978):
1. Diamante verdadeiro (Caetano Veloso)
2. Álibi (Djavan)
3. O meu amor (Chico Buarque)
4. A voz de uma pessoa vitoriosa (Caetano Veloso/ Waly Salomão)
5. Ronda (Paulo Vanzolini)
6. Explode coração (Gonzaguinha)
7. Negue (Enzo de Almeida Passos/ Adelino Moreira)
8. Sonho meu (Ivone Lara/ Délcio Carvalho)
9. De todas as maneiras (Chico Buarque)
10. Cálice (Chico Buarque/ Gilberto Gil)
11. Interior (Rosinha de Valença)

>> Ronda (Paulo Vanzolini) por Carlus Campos

ronda

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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