Vinicius de Moares, poeta, escritor e jornalista. (Foto: Folhapress)De um modo geral, o Brasil tende a celebrar muito mal os seus ídolos e muitas datas importantes acabam passando em branco. Talvez pela força do seu nome, Vinicius de Moraes foi uma exceção a essa regra. No ano em que ele completaria seus 100 anos, diversas homenagens partiram de diversos nichos e uma série de produtos jogou novas luzes sobre a obra tão plural do Poetinha.

frente_viniciusNo campo literário, a série História de Canções (Ed. Leya) merece um destaque. Depois de Chico Buarque, Paulo César Pinheiro, Tom Jobim e Toquinho, um volume dedicado a Vinicius apresenta o nascedouro de músicas que entraram para o repertório nacional e internacional. Entre sambas, bossas, valsas e canções infantis, a pesquisa de Wagner Homem e Bruno de la Rosa revela histórias engraçadas, como a de Garota de Ipanema, que foi feita para uma peça de teatro, que nunca foi realizada por falta de dinheiro. Homenagens às mulheres, ciúmes dos parceiros, noites de boemia e tudo mais que compunha o mito do poetinha se encontra nas linhas desse, que, curiosamente, é um dos mais fininhos da série.

arca do poetaMais robusta e igualmente curiosa é a caixa A Arca do Poeta, que reúne 18 discos da carreira de Vinícius mais duas coletâneas inéditas, que pouco acrescentam às dezenas de coletâneas dedicadas ao compositor. O melhor da Arca fica para um lado pouco cultuado do Poetinha, como a parceria com a atriz Odette Lara, registrada em disco em 1963. Há ainda trilhas raras, como a do filme Orfeu da Conceição, que inaugura a parceria com Tom Jobim em 1956, e da versão nacional da peça Jesus Cristo Superstar, originalmente feita por Tim Rice e Andrew Lloyd Webber. Na caixa, outras preciosidades, como os três discos de poemas recitados, convivem com clássicos absolutos como os Afro-sambas e os dois volumes da Arca de Noé.

arca de noéPor falar em Arca de Noé, esse inesquecível projeto infantil ganhou roupagem moderna, dirigida por Susana de Moraes. “O primeiro disco é uma beleza, mas tem coisas que ficaram datadas. Durante todo esse tempo, geração após outra ouvia esse disco. Achei que valia uma releitura”, explica a primeira filha de Vinicius, que teve o apoio de Adriana Calcanhotto, Dé Palmeira e Leonardo Netto no projeto. Juntando faixas dos dois volumes lançados na década de 1980, o novo disco surpreende por dosar respeito e ousadia ao abordar faixas que embalaram gerações. E são muitas as surpresas. Erasmo Carlos injeta peso roqueiro em O pintinho, enquanto Gal Costa voa leve e soberana junto com As borboletas. Ivete Sangalo mantém a ginga da Galinha D’Angola, enquanto Ceatano e Moreno Veloso soltam O leão num roda se samba baiano.

Se a ousadia marca a releitura da Arca de Noé, o tom de A vida tem sempre razão é o clássico. Projeto de Georgiana de Moraes, também filha de Vinícius, produzido por José Milton, o tributo de 18 faixas traz parceiros de longa data e novos artistas para o hall de intérpretes do homenageado. “A ideia era fazer um disco que fosse belo, sem preocupação de renovação, de mudar. Naturalmente, tem uma coisa nova, mais moderna. Mas não tivemos essa preocupação”, resume Georgiana por telefone.

a vida tem sempre razão

Seguindo nessa linha, como se o disco fosse a sala da casa do Poeta, algumas presenças tornam-se óbvias, como Maria Creuza (Onde anda você), Toquinho (Sei lá) e Carlos Lyra (Você e eu). A surpresa fica para novos convidados, como Zeca Pagodinho, que faz de Chega de saudade um gostoso samba de gafieira. O mesmo faz Seu Jorge ao abordar Canto de Ossanha. João Bosco pediu para gravar Medo de amar e deixou Rosa dos ventos pronta para ser lançada em outro momento. Acentuando a dramaticidade, Fagner e Mônica Salmaso interpretam, respectivamente, Chora coração e Sem, mais adeus.

Depois de Ana Carolina, Chico Buarque, Nana Caymmi e outros, A vida tem sempre razão encerra com algumas presenças obrigatórias que ajudam a estender a homenagem. Garota de Ipanema conta com os saudosos graves de Emílio Santiago, enquanto Tom Jobim e Miúcha dividem Pela luz dos olhos teus, numa gravação de 1977. Elencando as muitas homenagens realizadas em 2013 para Vinicius de Moraes, Georgiana de Moraes acredita elas continuem no próximo ano. “Eu acho ele importante por ser poeta do jeito que é e por ser uma pessoa tão popular. De repente, ele une pessoas velhas, que morrem de saudade, com as crianças da Arca. Mas as crianças também gostam de ‘Garota de Ipanema’. Acho que o Vinicius está muito vivo”.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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