3112va0101Casos de separação, chifre e amores mal correspondidos já inspiraram dezenas de compositores brasileiros. Do ícone Lupicínio Rodrigues (1914 – 1974) até os recentes Los Hermanos, muitos já aproveitaram as dores do coração para criar melodias e letras cheias de saudade e lágrimas. Marcelo Jeneci poderia ter seguido na mesma linha na hora de compor seu segundo disco, mas preferiu apostar na esperança de que o mundo pode voltar a sorrir.

De graça (Som Livre/ Slap), trabalho que chega três anos depois do festejado Feito pra acabar, foi feito depois da separação do cantor e compositor paulistano, mas não é a tristeza que dá o tom. Ele preferiu sacudir a poeira e encher sua música de mensagens positivas, alegrias reais e simples, e apostas num mundo mais colorido. “Tudo se desestrutura pra você se estruturar”, é o que ele observa em Alento, faixa de abertura, que completa a mensagem do sucesso Felicidade.

Além do patrocínio do programa Natura Musical, De graça também repete o propósito da estreia, de fazer o ouvinte se sentir mais leve e esperançoso com a humanidade. Mas há 3112va0102também uma vontade de ir além e se desgrudar da imagem de bom moço deixada pelo disco anterior. Isso já vem expresso na imagem fantasmagórica da capa. Em termos, esse objetivo é alcançado, apesar do risco ser muito bem calculado para não espantar os milhares de fãs que se encantaram com a doçura de Feito pra acabar.

A produção, mais uma vez entregue a Kassin, confirma essa ideia. Mas a co-produção de Adriano Cintra, músico reconhecido pelo trabalho na banda Cansei de Ser Sexy, garante alguns momentos de mais experimentação. É o caso da faixa-título, escolhida para apresentar o álbum, que botou um pé no tecnobrega para alegrar a letra sugerida pelo músico Curumim. “Livre-se do laço, solte-se no espaço, abra os braços e o coração”, manda Jeneci, exalando uma energia até então inédita.

A ideia de experimentar em De graça passa também por longos momentos instrumentais, feitos com orquestras de cordas, coros eruditos e instrumentos alheios ao pop, como cravo e órgão de tudo. Tanta pretensão sonora se justifica pela presença ilustríssima de Eumir Deodato, carioca que já trabalhou com gente graúda como Frank Sinatra e Aretha Franklin. A contribuição do maestro enche o disco de luxo, soberba e até um pouco de ousadia.

Certo das próprias limitações como cantor, Marcelo Jeneci mais uma vez aposta nos agudos translúcidos de Laura Lavieri. Ela, inclusive, voa solo na progressiva Pra gente se desprender, que encerra com uma longa viagem instrumental onde cascatas de cordas se confrontam com paredes de vozes. Mais uma contribuição essencial de Eumir Deodato.

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Se Feito pra acabar foi o resumo da trajetória de Jeneci ao lado de tantos parceiros, De graça explora mais sua individualidade do compositor. “Além de mim, não tem ninguém que seja eu”, deixa claro em Só eu sou eu. Por isso ele enxugou a lista de parcerias, se mostrou mais como instrumentista e buscou novos sons. Mas, mesmo assim, permanece firme na ideia de que a beleza de um sorriso, o nascer de uma nova vida e o amor ainda são as melhores fontes de inspiração para sua música. E o melhor, é tudo de graça.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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