FOTO - 01Em 1972, uma Elis Regina tranquila, sentada numa cadeira de balanço, anunciou que queria tempos mais plenos, felizes e esperançosos. “Eu quero uma casa no campo onde eu possa compor muitos rocks rurais”, pedia a cantora, dando a senha para um novo momento da música brasileira. Era o grande momento rock rural, gênero que unia as melodias intimistas do sertanejo brasileiro com o peso do rock urbano, que, na época, ainda ecoava o espírito livre do Festival de Woodstock.

À frente desse rock rural estava o trio formado Luíz Carlos Pereira de Sá, Guttemberg Nery Guarabyra Filho e José Rodrigues Trindade. Depois de dois discos, José, mais conhecido como Zé Rodrix, saiu do grupo e partiu em carreira solo. Sá & Guarabyra seguiram juntos criando sucessos marcantes como Sobradinho, Verdades e mentiras, Espanhola e Roque Santeiro. Essas e outras fazem parte do repertório da turnê acústica Rock Rural – 40 anos de estrada, que passa este fim de semana pela Caixa Cultural.

“É um show intimista, sem banda. Um show que fazemos em lugares menores, que exige concentração, bem de cara com o público”, explica Sá, por telefone, acrescentando que o formato de vozes e violões ajuda a testar limites e possibilidades. No caso de Fortaleza, onde não se apresentam há bastante tempo, eles mostram tudo que o público quer ouvir, mas acrescentam os “sucessos internos”, como chamam aquelas canções preferidas da dupla que não ganharam muita projeção. “Às vezes, jogamos umas achando que ninguém conhece. Quando vamos ver, o público está cantando junto”.

Rodrix, Sá e Guarabyra no meio dos anos 1970

Rodrix, Sá e Guarabyra no meio dos anos 1970

No meio dessa estrada de canções, o parceiro Zé Rodrix, falecido em 2009, não vai ser esquecido. Depois de deixar o trio, em 1973, o ex-Som Imaginário voltou a tocar com os amigos em 2001 e com eles gravou o projeto Outra vez na estrada. “A gente brigava muito, mas era muito amigo. Hoje, sinto falta até dessas brigas. Como era um caso de tapas e beijos, quanto mais tapas, mais beijos”, lembra Sá salientando que as brigas eram sempre em torno da música. Ele também lembra da dificuldade que foi depois da saída do Zé bem no início da carreira do trio, que precisou se reinventar como dupla e seguir em frente. “Agora, você imagina o que é sair de quatro shows felizes, compondo, tocando e na quarta feira o cara morre. Você só entende o quanto é ligado a uma pessoa quando não tem mais”, lamenta.

Quando o assunto são influências, Sá elenca tudo que ouvia nas extintas rádios Nacional e Mayrink Veiga, como Luiz Gonzaga, Noel Rosa e Jackson do Pandeiro. No entanto, nenhuma referência foi tão óbvia quanto o quarteto folk Crosby, Stills, Nash & Young. As “coincidências” são inúmeras: o uso dos sobrenomes, os arranjos vocais, o fato de mesclarem trabalhos individuais com projetos solos, as mudanças de formação, até as brigas internas. Quando o trio norte-americano esteve se apresentando no Brasil em 2012, o fã brasileiro não perdeu a chance de assistir e bajular os ídolos no camarim. “Tive uma conversa rápida com eles e mostrei nosso trabalho pro Crosby. Ele disse que gostou e eu falei ‘os vocais a gente também colou de vocês’”, lembra entre risadas.

Depois de 40 anos provando do pó da estrada, Sá não nega que o cenário musical mudou muito e critica dizendo que “a mídia em geral se rendeu mais ao dinheiro do que à beleza”. Um das mudanças acontece no que pode ser chamado de música rural nos dias de hoje. Ele se diverte dizendo que já foi convidado para festivais onde dividiu o palco com artistas jovens como Paula Fernandes, Michel Teló ou Luan Santana. “Depois o contratante veio ‘vocês me enganaram’. E eu respondi ‘não, você que se enganou, que não conhecia a gente’”, lembra, entre risadas, o artista que também faz uma defesa dos sertanejos. “Nós somos amigos de alguns deles e tem essa proximidade (musical). A maioria dos sertanejos até se dizem influenciados e estão numa linha mais comercial. Às vezes, eles têm vontade de fazer uma coisa diferente, mas tem os compromissos”.

Serviço:
Sá & Guarabyra – Rock Rural 40 anos de estrada
Quando: quinta (19) e sexta-feira (20), às 20h; sábado (21), às 17h30 e 20h; domingo (22), às 19h
Onde: CAIXA Cultural Fortaleza (Av. Pessoa Anta, 287 – Praia de Iracema)
Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia). À venda no local
Telefone: 3453.2770

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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