capa Caixa PARALAMAS 1Surgidos na efervescência política e musical dos anos 1980, os Paralamas do Sucesso sobreviveram a uma série de mudanças de cenário e acumularam um legado de respeito na música popular brasileira. Isso é o que fica atestado no box Paralamas do Sucesso 1983 – 2015, lançado este mês pela gravadora Universal. Ali estão encaixotados os 12 álbuns de estúdio da banda, mais seis ao vivo (incluindo a parceria com os Titãs, de 2008) e duas coletâneas de raridades. De brinde, versões inéditas para as argentinas Que me pisen (Sumo) e Hablando a tu corazón (Charly García/ Pedro Aznar)

O fato é que existem, pelo menos, dois motivos que explicam esses 32 anos ininterruptos de sucesso (mesmo) dos Paralamas. O primeiro é a capacidade rara de saber envelhecer. Foi assim que eles saíram dos dramas adolescentes de início de carreira para análises ponderadas sobre a sociedade e o ser humano. O som da banda acompanhou essas mudanças, deixando de ser uma versão nacional do The Police para se transformar numa potência pop tropical.

Outro motivo que fez os Paralamas resistirem às viradas de tempo é a união verdadeira entre os músicos. Sem brigas, declarações desastradas ou polêmicas fora de hora, Herbert, Bi e Barone enfrentaram juntos as baixas vendas dos anos 1990, crises internas e o acidente que deixou o guitarrista numa cadeira de rodas. Curiosamente, essa fidelidade se estendeu aos músicos de apoio que permanecem ao lado do trio há muito tempo. Conheça essa história passo a passo através de toda a discografia da banda. No próximo post, detalho as faixas que vão nas duas coletâneas inclusas no box. A seguir.

cinema mudo

Cinema mudo (1983) – Na estreia, pesam o clima oitentista e dramas adolescentes. É o caso de Química (Renato Russo), faixa que abriria as portas para a Legião Urbana. Fora os hits Vital e sua moto e Cinema mudo, vale ouvir as divertidas Patrulha noturna e Vovó Ondina é gente fina, feita em homenagem à avó de Bi Ribeiro que sacrificou sua garagem e seus tímpanos para o trio ensaiar.

o passo do lui

O passo do Lui (1984) – Quase uma coletânea do trio, com sete clássicos entre as 10 faixas. A faixa título é um instrumental com cara de improviso para preencher o espaço do LP. Lulu Santos comparece recitando em Assaltaram a gramática. E a grande injustiçada foi Menino e menina, reggae cru e ensolarado sobre amores adolescentes.

Selvagem

Selvagem? (1986) – Considerado por muitos como o melhor da banda, esse disco trouxe uma guinada sonora para os sons caribenhos, embora com ares nacionais. O medley de Tim Maia é uma preciosidade esquecida. No entanto, além dos sucessos Alagados e A novidade, vale ouvir a balada A dama e o vagabundo e a hedonista There’s a party.

paralamas - 1987

D (1987) – Com a boa resposta do Rock In Rio, o trio alçou voos mais arriscados. Um deles foi esse show no lendário Festival de Jazz de Montreux, feito basicamente com o repertório de Selvagem?. Há ainda a estreia de João fera nos teclados e um cover bacana de Charles, Anjo 45 e citações de Titãs e João Bosco.

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Bora-Bora (1988) – Para se livrar da fama de “The Police cover”, vem recheado de canções solares e arranjos de sopros. Já de olho no mercado latino, Charly Garcia toca piano na belíssima Quase um segundo. No entanto, o prêmio de melhor faixa fica para Uns dias, que Herbert já disse ser sua melhor composição. Essas duas faixas marcam o fim do relacionamento do guitarrista com a bela Paula Toller.

big bang

Big Bang (1989) – Seguindo a linha do álbum anterior, Big Bang estourou com Lanterna dos afogados. Com sopros, teclados e percussão nos arranjos, o disco traz balanços irresistíveis como a trinca Perplexo, Dos restos e Pólvora. Entre a crítica social atualíssima e os amores mais maduros, ouça Pólvora e a bossa Nebulosa do amor.

os grãos

Os grãos (1991) – Experimentando sonoridades e formações, o disco foi prejudicado pelo cenário nacional de confisco de poupanças e impeachment. Vendeu pouco e é lembrado como o primeiro fracasso do trio. Na versão original de Trac Trac, comparecem Fernanda Abreu, Edgard Scandurra e Fito Paez. Espetacular! Hoje, o disco merece ser reavaliado como corajoso e cheio de sutilezas. Ouça Tribunal de bar, Sábado e A outra rota.

severino

Severino (1994) – Mais experimental que o anterior, o sétimo disco do trio foi um fracasso total no Brasil e sucesso na Argentina. Inspirado no Nordeste, o disco soa de árido e pesado. As participações confirmam o clima anti-pop: Tom Zé, Egberto Gismonti, Linton Kwesi Johnson e Brian May (Queen). Para dar alívio, o disco encerra com O amor dorme.

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Vamo batê lata (1995) – Trabalho duplo, que rendeu o sucesso avassalador de Uma brasileira, com participação de Djavan. A parte ao vivo é simplesmente impecável e ainda deve empolgar os fãs por muitas gerações. É que é ao vivo mesmo, com suas sujeiras e improvisos. Num versão mais furiosa, Meu erro explica por que João Barone é um dos melhores bateristas de sua geração.

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Nove Luas (1996) – De bem com o mercado nacional mais uma vez, a banda lança um álbum leve, poético e pop. Fez merecido sucesso nas rádios e TVs. Herbert Vianna celebra a amizade com Marcos Valle numa releitura de Capitão de indústria, antes de encerrar com as delicadas Na nossa casa e Um pequeno imprevisto.

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Hey Na Na (1998) – Seguindo a linha pop poética de Nove luas, o nono disco dos Paralamas vem mais pesado e melancólico. Scream poetry é uma parceria póstuma com Chico Science e conta com voz e violino de Jorge Mautner. Mas o grande achado é o blues Viernes 3 am, parceria de Herbert e Charly Garcia.

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Acústico MTV (1999) – Diante do sucesso dos Titãs, o trio carioca resolveu amansar seus arranjos num projeto acústico. O resultado está entre os melhores da série, fazendo um passeio esperto pelos 16 anos de carreira além de trazer versões interessantes para Tim Maia, Beto Guedes e Talking Heads. A Legião Urbana é duplamente homenageada, tanto na presença de Dado Villa-Lobos – ao lado da banda durante todo o especial – quanto numa feliz regravação de Que país é esse?. Do repertório próprio, a releitura de Tendo a lua é o grande momento, além do brilho de Zizi Possi em Meu erro.

Longo Caminho

Longo caminho (2002) – Recuperados do acidente que quase tira a vida de Herbert Vianna, os Paralamas voltam ao formato trio num álbum de reavaliações pessoais e políticas. Com participações mínimas, a banda aposta na crueza e na força das palavras. Running on the spot (The Jam) ganha boa versão.

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Uns dias ao vivo (2004) – O quarto trabalho ao vivo dos Paralamas aposta numa produção mais suntuosa e nas participações, realmente, especiais. Vai de Andreas Kisser a Black Alien. A lista é grande, mas ninguém entrou por acaso. Por que não entrou nenhuma convidada? Deixa para lá. O primeiro disco, mais cru e guitarreiro, é o melhor. E ver Djavan errando a letra de Lanterna dos afogados tem seu charme.

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Hoje (2005) – A tentativa de soar feliz rendeu um trabalho mais pálido e sem ganchos, que tenta soar como Hey Na Na. A releitura de Deus lhe pague foi escolha dos fãs, mas não diz a que veio. O single Na pista fez sucesso pela empolgação e pelo clipe divertido, com Herbert dirigindo para os amigos. Participações de Nando Reis e Mano Chao.

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Paralamas e Titãs juntos e ao vivo (2008) – Parceiras de longa data, as duas bandas se reencontraram para comemorar seus 25 anos de estrada. A falta de espontaneidade deixa tudo meio preso, mas ainda empolga pela sinceridade da amizade. E, como se não bastasse ter tanta gente no palco (as duas bandas estão juntas o tempo inteiro, uma se metendo no repertório da outra. Magnífico), eles ainda convidam Samuel Rosa, Arnaldo Antunes e Andreas Kisser.

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Brasil Afora (2009) – Como uma volta no passado, o disco mistura ritmos, atrai parceiros e convidados. A ideia do disco é recuperar a leveza de décadas atrás, mas passou batida pelo público. Nada se destaca, mas nada compromete. O dueto com Zé Ramalho em Mormaço tem seu valor. Quanto ao tempo, parceria com Carlinhos Brown, foi lançada por Ivete Sangalo no projeto Pode entrar.

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Multishow Ao Vivo (2011) – Mais fraco entre os ao vivos do trio, esta participação no projeto do Multishow tem todos os vícios das produções feitas para a TV. Muito zelo, cuidado e marcação. O repertório é repetitivo e só vale para quem não conhece a banda.

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Multishow Ao Vivo 30 anos (2014) – Ninguém resiste a dois trabalhos ao vivo lançados em seguida. Mais ainda quando são lançados soba chancela do mesmo canal da TV e com repertórios bem parecidos. Ou seja, sob o pretexto de comemorar 30 anos de carreira, eles se repetiram desnecessariamente. Pelo menos, abriram mão (ainda) de convidar mais um monte de gente. É só a banda, seu som poderoso, seu repertório ainda afiado e a turba de fãs enlouquecidos.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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