Leila Pinheiro hoz 2 - foto Washington PossatoCom os caminhos tortuosos que anda trilhando as grandes gravadoras, coube a muitos artistas irem em busca de novas formas para lançar material inédito. E isso serve para jovens e consagrados artistas. Este é o caso de Leila Pinheiro, que escolheu o financiamento coletivo para lançar o EP Por onde eu for. O trabalho que será apresentado amanhã no Anfiteatro do Dragão do Mar traz dois ineditismos para a trajetória de 32 anos da paraense. Além de ser o primeiro disco neste formato enxuto, é o primeiro lançado via crowdfunding (via Kickstarter). Por onde eu for conta apenas quatro faixas, teve produção de André Vasconcellos e conta com a participação de Zélia Duncan em Todas as coisas valem. Por email, Leila Pinheiro comentou as novidades da carreira e sobre a parceria com o violonista cearense Cainã Cavalcante, que poderá ser conferida nesse sábado.

DISCOGRAFIA – Nesse show, você faz um duo com o tecladista Rodrigo Tavares, algo que você espera há bastante tempo, segundo o release do show. Como funciona essa parceria entre vocês? Como será esse encontro?
Leila – Tocar junto, fazer duos é desafiador. Estou com Rodrigo Tavares, grandioso músico, com uma espetacular cultura musical e experiência. No palco somos dois artistas felizes de estar juntos, batendo bola no raso e no fundo. Rodrigo e André Vasconcellos, baixista e diretor musical do show, criaram comigo os arranjos onde Rodrigo e eu tocamos ao vivo, dando play no computador. Os instrumentos foram gravados “a vera” por grandes músicos – João Vianna (baterista), Marcos Suzano (percussão), André Vasconcellos (baixo), Adriano Trindade (bateria) e André Siqueira (violão). É a primeira vez que me apresento assim e acho sensacional o resultado. Alexandre Rabaço opera o som da frente, o PA, e Marcio Reis opera o som do palco (monitor). Somos 4 corações batendo a mil juntos, super sintonizados. Show!!!

DISCOGRAFIA – Há alguns meses você veio a Fortaleza com um show de voz e piano. É muito comum artistas virem a Fortaleza para shows menores, sem banda. Que diferenças você vê no seu show com banda e em formato mais intimista?
Leila – No final dos anos 90 comecei a me apresentar sozinha ao piano. Mais recentemente, em 2010 meus shows cantando Renato Russo foram com banda, o Agarradinhos, com Roberto Menescal foi com banda, os shows Eu canto samba há dois anos também foram com banda. A opção solo, com piano, violão e o público, vira uma coisa mágica, única, que me emociona muito, sempre. Só quem fica sozinha no palco sabe o que isso significa. Me preparo muito e sempre pra essa hora. Estou sempre com grandes músicos que, sinto, ficam felizes de poder dividir profundamente a música comigo. Essa experiência é uma das maravilhas da minha profissão. Sozinha e com banda são momentos muito distintos. Adoro os dois.

DISCOGRAFIA – Você ainda recebe no palco, em Fortaleza, o violonista Cainã Cavalcante. Como aconteceu esse encontro entre vocês? 
Leila – Quando os shows são solo, sempre tenho convidados – músicos, cantores… Nascem duos lindos, únicos e o público adora. João Cavalcante, do Grupo Casuarina, compositor e cantor pernambucano, esteve comigo e com Moacyr Luz no meu estúdio há duas semanas e me falou do Cainã quando comentei sobre o show em Fortaleza. Dei a sorte de Cainã estar no Rio e nos encontramos pra ensaiar e nos conhecer. É um grande músico e nosso duo vai ser arrasador!!!

DISCOGRAFIA – Por aqui, você apresenta o EP “Por onde eu for”, feito por crowdfunding. O que achou da experiência de financiamento coletivo?
Leila – Achei maravilhosa a experiência e sou muito grata a todos e todas que contribuíram para o EP ser gravado. A ideia principal sempre foi a de comemorar meus 35 anos de carreira propondo uma relação mais próxima com meu público, que me acompanha nestes anos todos. A campanha trouxe os fãs pra dentro do meu trabalho. Os nomes de todos eles estão no encarte do EP e isso é muito especial pra eles e pra mim. De verdade!!!

DISCOGRAFIA – Você já fez parte de grandes gravadoras, a Universal, a EMI, e de uma gravadora pequena, mas muito influente, a Biscoito Fino. Por que escolheu o financiamento coletivo para um novo disco?
Leila – Comecei minha carreira na Polygram, hoje Universal, em 1986 e lancei mais de 10 trabalhos contratada por gravadoras. Optei por ficar independente e propor parcerias às gravadoras para divulgar e lançar meus CDs depois de gravados. Isso deu super certo com o CD e DVD Agarradinhos, Meu segredo mais sincero, Céu e Mar (CD em duo com o guitarrista Nelson Farias). O financiamento coletivo (que banca muitas etapas da gravação e lançamento do CD, mas não banca a divulgação e execução que são as partes mais difíceis e caras de todo o processo) foi minha opção de agora, pra trazer o público mais pra perto de mim, do meu trabalho e ser responsável por ele.

DISCOGRAFIA – Até onde sei, este é o primeiro EP que você lança. Por que escolheu esse formato? Por que não um álbum completo?
Leila – Sim, este é o primeiro EP que eu lanço. Ninguém mais ouve um CD inteiro. Música, há muitos anos é um clic (rápido) no iPod, no iPad, no iTunes. O CD físico é um luxo, produto para os fãs que querem ter tudo, colecionar. Parar com calma pra ouvir várias vezes um mesmo CD é coisa rara no nosso mundo barulhento de maratonas diárias. Se você ouve as quatro músicas que gravei, sabe exatamente “por onde eu vou” e o que estou fazendo. E posso, a qualquer momento, gravar mais quatro e lançar. Gosto muito dessa ideia.

DISCOGRAFIA – Nesse disco você abre a parceria com Zélia Duncan. Como foi esse encontro?
Leila – Somos amigas há muitos anos. Conheci a Zélia Cristina ainda. Convido muito a Zélia para participar dos meus shows, temos um bom tempo de palco juntas. Em 2007 fiz essa música e mandei pra ela. Nasceu Todas as coisas valem. Agora chegou a hora de gravar e convidei Zélia de novo, pro EP e para o show no Rio. Nossa parceria é uma delícia. Nos divertimos muito. O CD novo dela, de sambas, é arrasador. Já ouvi. Kkkk

DISCOGRAFIA – Seu novo disco teve produção do André Vasconcellos, também co-responsável pelo sucesso de Nos horizontes do Mundo. Como é essa parceria com ele?
Leila – André Vasconcellos é um gigante no contrabaixo, na concepção de arranjos, no estúdio buscando sonoridades, na compreensão do melhor pra cada canção e para o todo. Ele entende e traduz de forma muito ampla o que eu sinto. Estávamos separados há sete anos. A distância fez um bem enorme a nós. A alegria de nos reencontrarmos está explícita neste EP e nos shows com a direção musical dele.

DISCOGRAFIA – No show você apresenta canções de Tim Bernardes e do Nando Reis. Você também já gravou e foi parceira do Renato Russo e gravou com o Frejat. A Leila Pinheiro também é roqueira?  
Leila – O que eu gosto na música pop, no rock, é a letra, a poesia. Vivo espantada com a capacidade rara de se dizer tudo com quatro acordes. A melodia dá voltas aparentemente sem sentido e tudo se resolve, fica bonito, forte e eu acabo andando por um caminho novo pra mim que me jogo sempre em grandes harmonias, sofisticadas, intrincadas… Adoro a palavra e por ela “eu faço tudo”.

DISCOGRAFIA – Durante uma época, seu nome foi muito ligado a uma renovação da Bossa Nova, algo que levou seu show para muitos países. Como anda sua carreira internacional hoje em dia?
Leila – Fui, em 2013, ao Japão com Roberto Menescal – apresentamos nosso duo em cinco cidades. Cantar e tocar a bossa-nova com ele é muito especial. Fomos, como sempre, recebidos com uma alegria comovente. O japonês ama e reverencia a nossa música de uma forma muito especial. Desde 1986 me apresento no Japão e todos os meus CD’s estão à venda lá. Cantei com banda na Colômbia ano passado, num grande festival de Jazz e foi espetacular. Tenho neste momento, a carreira nacional e internacional possível dentro da crise mundial que vivemos todos.

DISCOGRAFIA – Ano que vem, seu disco em homenagem a Guinga e Aldir Blanc completa 20 anos. Este, certamente, é um disco mais importante da sua discografia (se não o mais) e deve figurar entre os melhores da música brasileira. Qual a história desse álbum? Como você vê esse disco hoje?
Leila – Desde que assinei meu primeiro contrato, em 1986, quis gravar a música do Guinga, que ouvi em 1979, pela primeira vez, no LP Essa mulher de Elis Regina. Vim morar no Rio em 1981 e conheci o Guinga em 82. Ficamos amigos e ele passou a ir toda semana à minha casa, tocar violão, me mostrar suas músicas e o que tinha acabado de compor. Tenho caixas e caixas de K7s e CDs com tudo o que gravamos desde lá. Sempre que sugeri gravar alguma música dele, a ideia não era acolhida, porque a música era “difícil”. Gravei em 1991 a música Esconjuro (primeira parceria dele com Aldir Blanc), gravei Noturna (dele com Paulo Cesar Pinheiro) e fim. Passaram mais cinco anos até eu ter o ok do João Augusto, diretor-artístico da EMI em 96, para eu gravar um disco todo dedicado à obra do Guinga. Guinga enlouqueceu de tanto compor. Chamei Lula Galvão (violão) e o baixista cearense-gênio-absoluto Jorge Helder e junto com Guinga, ensaiamos, criamos, fizemos os arranjos e gravamos. Fizemos o CD Catavento e Girassol – um trabalho lindo que eterniza a obra genial deste artista inigualável e gigante que é o Guinga. Um dia ele terá o reconhecimento que merece. Sabe que está muito à frente do nosso tempo. Isso acontece.

DISCOGRAFIA – Quais seus planos daqui para frente
Leila – Fortalecer os bons pensamentos e a fé. Com coragem, de braços com meu público parceiro e fiel, uma equipe maravilhosa e guerreira, sigo com a turnê Por Onde Eu For. Cantar pra mim é igual nascer flor. Tem que acontecer. Com sol ou sem sol. Estou muito feliz de cantar novamente em Fortaleza e no Teatro do Dragão do Mar.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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