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Dois amigos caminhando lado a lado, descendo as ladeiras da Bahia em direção ao mar tendo o horizonte como moldura. Um é negro, o outro branco, e ambos carregam sangue, culturas e ideias bem miscigenadas. Ambos levam um violão no ombro e devem parar a qualquer momento para mostrar uma nova canção que acabou de ficar pronta. Para Gilberto Gil, se sua amizade com Caetano Veloso fosse virar um filme, essa cena seria a síntese de tantas histórias que eles viveram.

Outra forma de resumir os laços que esses dois baianos apertaram desde que se conheceram no início dos anos 1960 é a turnê Dois amigos, um século de música, que chega hoje a Fortaleza. Montada a convite de um produtor europeu, a série de shows começou em Amsterdam, em 25 de junho, trazendo ao palco apenas os dois compositores, com seus violões e um século de composições que passam pelo tropicalismo, exílio, consagração nacional e influências.

“Como, principalmente, Caetano estava com a agenda muito intensa, entendemos que não tínhamos condição de pensar em um show com banda, com uma complexidade sonora. Optamos assim, até por que é um formato que escolhemos há 20 anos quando fizemos uma celebração da Tropicália. Nesse formato, íamos apresentar um show mais despojado, que ia exigir uma cumplicidade, proximidade com o público”, explica Gilberto Gil, por telefone, acrescentando que eles adotaram três ou quatro regras para selecionar o repertório que traz como única inédita As camélias do quilombo do Leblon. “São canções que marcaram época, outras importantes para nós, mas sempre do ponto de vista pessoal. Algo que desse noção da importância de nós mesmos como compositores”, resume.

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Dois amigos, um século de música rendeu 19 apresentações entre Europa e Ásia e uma polêmica que ganhou fôlego nas redes sociais. O ex-Pink Floyd Roger Waters escreveu uma carta pública dirigida a Gil e Caetano pedindo que eles cancelassem o show que estava marcado em Israel um ano após ofensiva militar que deixou mais de 2.000 mortos em Gaza. Os brasileiros ignoraram o pedido do músico inglês, realizaram a apresentação no final de julho e ainda foram recebidos por Shimon Peres. “Iríamos, fomos e gostei de ter ido. Eu, especialmente, tenho uma relação bem desenvolvida com o público de Israel, que gosta muito de música brasileira. Era uma viagem artística, não política, embora isso entre sempre em consideração”, explica Gil.

E essa viagem artística vai render mais um trabalho assinado pela dupla que incendiou os festivais de música da década de 1960 quando encabeçaram o movimento tropicalista. “Ele (Caetano) tem um talento especial que está associado a uma inteligência muito aguda e há uma cultura, um cultivo de conhecimentos variados sobre o mundo que é muito intenso, muito particular. Um poeta extraordinário, com uma capacidade de originalidade poética muito própria. É uma antena muito aguçada para as temáticas aguçadas”, define o amigo a quem Gil acredita dever muito. “Foi ele que me puxou para esse campo. Eu era muito simples, muito alheio a esse campo cultural mais exigente. Eu me tornei um pouco um artista melhor, mais completo, principalmente como poeta por conta do Caetano”.

[youtube]https://www.youtube.com/watch?v=3hDFycPWczE[/youtube]

Gilberto Gil ainda aponta que a nova turnê é uma forma de homenagear, indiretamente, talvez aquele que foi a maior influência dele e de Caetano naquele início de amizade. “Somos ambos muito devedores a João Gilberto. Devemos muito do nosso próprio estímulo, a escolha de uma certa quietude que perpassa uma parte considerável das nossas canções, canções mais doces, intensas. Eu tenho impressão que isso tudo você percebe num show como esse. Mais com a própria forma do trabalho de João. Somos filiados dele”, explica ele que dedicou seu último disco, Gilbertos Samba (2014), ao mestre da Bossa Nova.

Serviço:
Dois amigos, um século de música
Quando: hoje, 14, às 21 horas
Onde: Centro de Eventos do Ceará (Av. Washington Soares, 999 – Edson Queiroz)
Quanto: R$ 440 (Cadeira Amarela), R$ 340 (Cadeira Azul), R$ 200 (Cadeira Branca), R$ 160 (Setor Sul) e R$ 120 (Setor Oeste). Valores de inteira
Pontos de venda: Bilheteria Virtual (Shopping Del Paseo e internet)Telefone: 3033 1001

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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