O pernambucano João Gomes (Foto: Divulgação)

“… A novidade é que o Brasil não é só litoral
É muito mais é muito mais que qualquer Zona Sul
Tem gente boa espalhada por esse Brasil
Que vai fazer desse lugar um bom país…”

Começa assim a letra de Notícias do Brasil, canção do Milton Nascimento e letra do genial Fernando Brant.

Passeando por sites de notícia, dei de cara (com atraso) com uma figura de boné. Parecia novo, mas com aura de velho. Uma voz grave, mais grave que o mais grave dos mais graves dos graves. Era João Gomes.

É provável que você já o conheça, mas vou pintar o quadro. Natural de Serrita, Pernambuco, o cara tem 19 anos. Pintou no Tik Tok cantando músicas próprias e interpretando covers a pedidos das seguidoras e seguidores, ansiosos por ouvirem como ficaria a versão dessa ou daquela música na sua voz. Hoje o repertório dele vai de Legião Urbana à Tiê, além, é claro, dos sucessos assinados por ele: Meu pedaço de Pecado e Que nem vovô.

Fui pesquisar. Depois de chamar a atenção no Tik tok, João, ao invés de simplesmente vender uma de suas músicas a um empresário, pediu uma oportunidade. É pouco provável que eu não estivesse escrevendo sobre ele por aqui se essa oportunidade não tivesse sido dada.

Assim como João Gomes e em outros ídolos (não agressores) do forró atual, um lance que tem me chamado atenção desde a pop Duda Beat é o retorno de harmonias românticas, de cadências harmônicas (encadeamento de acordes) com mudanças drásticas e sentimentais, diferente da harmonia plana que imperou na música de massa uma década antes.

Ouvir a voz e o timbre de João Gomes é como ouvir todo o sertão dentro de um fonograma. Sem filtro, nada blasé, zero gringo, o rapaz vai tangendo as palavras com esmero.

Andar por São Paulo (estado conservador e de xenofobia ora nítida, ora velada) e ouvir João Gomes sendo tocado no intervalo de escolas, nas caixas de som em praças e numa junkie box pelo centro da cidade, é algo digno de nota.

Diferente de outros nomes da cena forrozeira atual, João parece compor e escolher a dedo músicas que não partem do arquétipo do macho alfa escroto. (Para se ter uma ideia desse arquétipo, tendo que cancelar os lançamentos devido às agressões em flagrante cometidas por DJ Ivis, os Barões da Pisadinha e Zé Felipe optaram por lançar em seguida a faixa no imperativo Senta Danada).

Em um país que aplaude de pé tudo que vem de fora, no Brasil em que cantar bem virou sinônimo de The Voice Brasil (que em geral imita a escola soul norte americana), da gosto ouvir um “vaqueiro” talentoso de Serrita alçar voo no seu alazão e em suas toadas.

Direct: Em sua série de palestras intituladas “Esse Ofício do Verso” o escritor Jorge Luis Borges diz que “os poetas modernos desaprenderam a arte da narrar”. Você já ouviu “A Morte do Vaqueiro” cantada por Gonzagão?”. Pense num aula de narrativa!

Daniel Medina é compositor, cantor e curioso, sendo cantor nas horas vagas e curioso por ofício. Ele escreve nesse espaço semanalmente

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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