A veia experimental de Oscar Arruda sempre pulsou. Da Somfusão, banda instrumental da qual fez parte no início dos anos 2000, ao seu trabalho solo. Neste ano, ele lançou Egomaquia, seu segundo álbum de estúdio. O registro é resultado da parceria com o guitarrista Felipe Lima e o baterista Guilherme Mendonça, da banda Astronauta Marinho, que assinam a produção do disco. A banda toda, aliás, é parte do processo, que inclui o baixista Caio Cartaxo e Daniel Lima no teclado e sintetizadores.

Oscar e Astronauta Marinho começaram a trabalhar juntos em 2014, após o artista cearense encerrar os trabalhos do seu álbum de estreia, Revolução (2012). Para seu debut, foram três anos entre produção e circulação. “Tava querendo começar um processo novo. Um som novo, sabe? E conheci num dos shows do Revolução a galera da Astronauta Marinho. Curti o som deles e entramos nessa aventura de trabalhar juntos num álbum”, conta.

Atmosférica, a música de Oscar Arruda, lembra bem um personagem cult criado em 1966 pelos mestres dos quadrinhos Stan Lee e Jack Kirby. Não à toa o Surfista Prateado virou música em seu segundo álbum. Introspectivo e filosófico como Oscar, a viagem do Surfista se assemelha à jornada do músico neste registro. “O álbum trata dessas questões existenciais em geral. O título remete a essa luta do eu consigo mesmo. A luta do ego e do ser na sua existência. Viaja um pouco nessas questões”.

Em oito faixas, existencialismo, psicodelia, metafísica e o estado de constante busca estão presentes nas letras e na sonoridade onírica das canções. Ao Blog Repórter Entre Linhas, o artista de 42 anos comenta o processo de produção, memórias e referências de cada faixa do Egomaquia, gravado no estúdio de Yuri Kalil (Cidadão Instigado), o Totem, em Fortaleza.

Faixa a faixa: Egomaquia (2017) – Oscar Arruda
Por Oscar Arruda

“Lancei Vela Branca como single, em 2015, antes do álbum. Foi o primeiro dessa fase após o Revolução, já parte desse processo de produção junto com o Astronauta Marinho. Foi a primeira música que nós produzimos juntos no estúdio do (Yury) Kalil, o Totem Estúdio, aqui em Fortaleza. A primeira parte dela foi composta há muitos anos, e cheguei a tocá-la com uma banda instrumental que eu tinha chamada Somfusão. A gente experimentava muito os ritmos. Isso no final dos anos 1990, começo dos anos 2000. Ela tem um pouco da pegada do que a gente fazia na época. Resgatei e fiz uma segunda parte. Era mais um estudo mesmo. Trabalhei a letra e uma segunda parte e aí acho que ela se completou. Tem muito a ver com o álbum todo. Trata um pouco da morte e essa imagem da vela branca. Tanto a morte em si como a transcendência para outra experiência, mas também é sobre as pequenas mortes cotidianas. Abre o álbum com essa ideia da morte como uma viagem, e da própria vida como uma viagem”.

Sol é uma música que tinha uma pegada bem diferente de como ela acabou ficando. Era mais pesada, mais rock. A gente chegou a tocar dessa forma, com mais guitarra, mas não ficamos satisfeitos na pré-produção e experimentamos fazer diferente. Ela tem uma referencia no álbum Tom York com o Flea (Amok, do Atoms for Peace), que a gente tava ouvindo na época”.

Tempo também tá nesse diálogo das questões existenciais, do tempo mesmo. Compus numa viagem pra Chapada Diamantina (BA). Tinha já a ideia da melodia, da guitarra, bastante delay. Ela foi uma das primeiras músicas que a gente produziu em estúdio. Foi uma ideia bem resolvida. Não teve muita mudança do que foi pensado originalmente. Há um diálogo com essas referências de pós-rock”.

Caravana surgiu quando a gente já tinha algumas faixas pré-produzidas. É uma dessas composições que parece que você ligou uma antena e captou alguma coisa. Ela praticamente veio pronta quando a gente começou a compor. A primeira parte é basicamente guitarra e sintetizador, e a segunda parte entra a banda. É a única que tem algo mais romântico, que trata do amor, da relação entre duas pessoas e das várias vidas que a gente vive em uma vida. De lembranças. Essa imagem da caravana como miragem das lembranças que a gente tem na vida. Teve a participação da Paula Tesser no vocalize. Ao vivo, o Felipe (Lima) e o Guilherme (Mendonça) – ambos da Astronauta Marinho – cantam também”.

Caverna foi composta ainda na época do Revolução e a gente trabalhou ela. Era instrumental, mudou um pouco. É um rock mesmo que lida com a angústia, que flerta com o gótico, com o progressivo”.

“Compus Surfista Prateado muito pensando na banda, na Astronauta Marinho. A única que foi composta dessa forma. Levei a ideia inicial e depois a gente trabalhou junto. A música tem 9 minutos, é meio que uma epopeia. É inspirada no personagem Surfista Prateado, da Marvel, que eu curto. Ele é assim como um filósofo, tá sempre pensando em questões existenciais. É uma viagem, né? E teve essa construção coletiva mesmo de toda a parte instrumental. Sou muito fã do personagem. Gosto dessa ideia do cara solitário no espaço”.

Labirinto foi a música mais difícil. A gente quase desistiu dela algumas vezes. Tem um tempo, um compasso quebrado. Veio em um outro momento que a gente tava numa produção no computador mesmo, em casa. Surgiu no decorrer do processo do Egomaquia mesmo. É uma viagem da história da imagem do labirinto. O disco tem um pouco dessa ideia da trajetória heroica. Da trajetória humana como heroica ou anti-heroica. A música foi meio construída assim também como um labirinto. Na parte instrumental a gente brinca com o tempo. Tocar e ouvir essa música é como entrar num labirinto e a gente quase que se perdeu nele”.

Errante é quase uma vinheta. Ela emenda com Labirinto. É bem simples, só guitarra e voz. Dá um elemento mesmo de finalização da narrativa do álbum e deixa em aberto com o vento. Talvez pensando em como construí o álbum Revolução, ela tem algo a ver também. No Revolução terminei com uma vinheta da chuva caindo. Não foi nada intencional. É um final em aberto. Continua a trajetória da experiência, do aprendizado”.

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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