A cearense Sara Síntique escreve poemas quinzenalmente para o Leituras da Bel. Poeta, atriz, performer, mediadora de leituras e educadora, Sara mora em Fortaleza e publicou seu primeiro livro – Corpo Nulo – pela Editora Substânsia. Hoje, Sara lança um poema sem nome. Leia mais poetas!
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toda a incapacidade de um mês de maio
I
que palavra talvez teria sido a
mais frágil do mundo se
a primeira que
qualquer um balbucia
e se faz entender ou
se a última – antes do último sopro
ou se a última – faísca
de qualquer língua morta
e que palavra seria essa
a última
e com qual
desespero se é
desespero
ela se diz
por qual incidente ela
exatamente ela –
exatamente ela –
acontece
II
cair ir em si
estupidamente
mais uma vez:
os primeiros
e os últimos
feitos do mundo
todos eles ecos
de um silêncio puro
e infindo
e depois,
estupidamente
pensar que de tudo
só se tem os entremeios
e com isso lidamos
como se isso fosse:
III
toda palavra é poeira
sopro de coisa alguma
e com isso: lidamos
IV
há quantas nos distanciamos agora
se são elas a mesura do tempo?
V
enquanto a poeira subia da terra
um corpo inteiro já encoberto
mais um entre tantos –
não: o teu
pequenas formigas sobre os pés
incomodaram sentir-me vivo,
lembrar que
aquela mesma vontade
de atravessar as fronteiras
persiste.
mas caminhar?
VI
toda pequena formiga não hesita se
o tempo só se mesura pela palavra.
toda pequena formiga não hesita se
toda palavra é poeira.
ela segue o caminho.
ela segue.
VII
por que forjar uma cimitarra
para brincar com o vento?
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Sara Síntique
É poeta, atriz, performer, mediadora de leituras e educadora. Mestra em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Ceará (UFC), onde também se graduou em Letras Português – Francês. Nasceu em Iguatu (CE), em 1990, e reside em Fortaleza desde 2001. Autora do livro de poesia Corpo Nulo (Editora Substânsia, 2015). Escreve poemas quinzenalmente para o blog Leituras da Bel.