Neste 2019, celebramos um século de publicação da obra “Carnaval” do autor pernambucano Manuel Bandeira (1886 -1968). Na saída de mais uma folia momina, eis que o convite para a leitura deste livro se torna ainda mais oportuno.  Abre-alas! Composto por 14 poemas, o livro é o segundo da bibliografia de Bandeira que havia estreado na literatura, em 1917, com “A Cinza das Horas”. Dois anos depois, o poeta nos traz uma obra transgressora, cujos elementos expressam desde os adereços e fantasias carnavalescas às contradições entre a alegria desmesurada da terça-feira gorda e a triste ressaca da quarta-feira de cinzas em toda sua decrepitude do corpo físico e do arrependimento do espírito. Nele desfilam Colombinas, Pierrot, Arlequins e mais uma turba de personagens que anunciam o misterioso, o trágico e a melancolia.

Manuel Bandeira

Escrito quase como um escape das desgraças pessoais do autor que ainda muito jovem havia descoberto a tuberculose e vivia à sombra de uma constante morte próxima, embora tenha vivido 82 anos, “Carnaval” é uma afirmação poética em defesa de um lirismo libertador, sem censuras e repleto de espontaneidades. É por essa razão que o livro marca a aproximação do poeta ao Modernismo. Nele está contido o célebre poema “Os sapos”, declamado por Ronald de Carvalho durante a Semana de Arte Moderna de 1922, uma sátira a escola Parnasiana.

Confira a análise do escritor Affonso Romano de Sant’Anna sobre “Carnaval”:

Outra curiosidade sobre essa aproximação entre a música e a estética de Manuel Bandeira, podemos encontrar na musicalidade simbolista que o autor experimentou expressa na forte sonoridade harmônica de seus poemas.
E como todo carnaval tem seu fim, eu não poderia encerrar este texto sem um poema desse livro centenário de Manuel Bandeira. Não à toa a escolha por um poema de amor, lembrando que para toda união que chega ao fim, uma nova se inicia ainda mais bonita.

Rondó de Colombina
De Colombina o infantil borzeguim
Pierrot aperta a chorar de saudade.
O sonho passou. Traz magoado o rim,
Magoada a cabeça exposta à umidade.

Lavou o orvalho a alvaiade e o carmim.
A alva desponta. Dói-lhe a claridade
Nos olhos tristes. Que é dela?… Arlequim
Levou-a! e dobra o desejo à maldade
De Colombina.

O seu desencanto não tem um fim.
Pobre Pierrot! Não lhe queiras assim.
Que são teus amores? – Ingenuidade
E o gosto de buscar a própria dor.
Ela é de dois?… Pois aceita a metade!
Que essa metade é talvez todo o amor
De Colombina…

Aumenta o som e Boas leituras!

***

*Lílian Martins é jornalista, tradutora, professora, pesquisadora e militante em Literatura Cearense. Mestre em Literatura Comparada pela UFC com a dissertação: “Com saudades do verde marinho: O Ceará como território de pertencimento e infância em Ana Miranda”, vencedora do Prêmio Bolsa de Fomento à Literatura da Fundação Biblioteca Nacional e Ministério da Cultura (2015) e do Edital de Incentivo às Artes da Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor) em 2016. É uma apaixonada por rádio, sebos, pelos filmes do Fellini, os poemas de Pablo Neruda e outras velharias…

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