Caros poetas,

Não sei escrever poemas. Mas sei escrever cartas. E essa é para vocês. Eu tive a oportunidade de ver suas apresentações nos palcos do Centro de Eventos durante todos os dias da última semana. Vocês entraram na Bienal Internacional do Livro do Ceará com os dois pés fincados no chão. Subiram, cantaram, declamaram, puxaram as plateias e deixaram centenas de alunos boquiabertos com suas performances. Vocês são generosos. E criativos. E audaciosos. E sabem como ocupar os lugares que são seus por direito, apesar de o mundo inteiro dizer o contrário. Sim, pois o espaço da Bienal pertence aos poetas que passam os meses inteiros trabalhando em saraus nos mais diferentes lugares. Barroso, Curió, Jangurussu. A presença de vocês nesse evento é apenas a continuação de um trabalho já feito de forma intensiva e plural. São vocês que levam poesia – esse gênero literário capaz de salvar vidas – para os moradores das mais variadas periferias. Vocês estão no centro. Vocês são o ponto central desse evento. Vocês são B1, Livre Curió, Bate Palmas, Okupa, Mulheres do Mundo, Bota o Teu, Corpo Sem Órgãos, Templo da Poesia, Natorart e outros. Meu coração ficava aquecido cada vez que um sarau começava no Centro de Eventos. Eu vi vocês tranquilos diante de públicos que passavam das 500 pessoas. É a coragem de quem enfrenta ameaças piores todos os dias. Eu sempre pude ler, escrever e estudar de barriga cheia. Com vocês, aprendi que isso é um privilégio grande. Confesso que, depois de tantos dias acompanhando as apresentações, aqui desse lugar de mundo de onde eu existo, ainda não consigo entender muitas coisas. E nem sei se entenderei algum dia. Eu não nasci com um alvo nas costas. Eu não nasci com a palavra “suspeita” gravada na testa. Sou grata por vocês terem compartilhado um pouco da alegria e da engenhosidade. São ousados. “O poema é nosso e eu boto onde eu quiser”, diz o Talles Azigon, que é escritor e meu amigo. Vocês, todos poetas, saíram colocando poemas em cada parede desse Centro de Eventos. Articularam uma biblioteca livre enquanto tocaram pandeiro. São criativos e sabem fazer um grão de milho se transformar em arte. Plantaram sementes em centenas de alunos – de escolas públicas e particulares – mesmo que os professores não parecessem muito satisfeitos com as transgressões. Sorte de quem topou sair da feira de livros – cheia de preços caros – para subir as escadas e os elevadores. Os mezaninos 1 e 2 estavam cheios de poesia. Cantada, tomada e feita na hora. Vocês são a atração mais importante. Eu deixo essa Bienal mais atrevida. Obrigada por isso também. No próximo domingo, 25 de agosto, às 19 horas, dentro da programação da Bienal do Livro, vocês lançarão um livro reunindo textos de poetas dos vários saraus. Eu estarei lá, na primeira fila, para aplaudir – e novamente aprender – com cada um dos poetas do nosso tempo. “Se tem uma coisa que salva a gente, é a literatura”, alguém disse entre os poemas. Ela salvou a vocês. E vocês salvaram a mim.

Meu abraço mais afetuoso para cada um.

E que São Jorge abençoe vocês.

Isabel Costa

SERVIÇO

Lançamento Ruma Coletânea – Poemas de Saraus

Haverá SarauZona, com presença de coletivos de saraus e declamações de poetas cearenses

Quando: domingo, 25

Onde: Sala A rua e o mundo – Mezanino 2

Horário: 19 horas

Entrada gratuita

 

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

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