Quem se dá ao trabalho de acompanhar os rabisco que deixo por aqui, pode ter lido meus textos Twitter não faz revolução e Twitter faz revolução ou é dinossauro o presidente do Google?
Depois dos dois artigos, seguiram-se alguns comentários discordantes sobre a minha afirmativa no título do primeiro texto.
Verdade
Pois bem, como não sou latifundiário da verdade (expressão emprestada de Tarcísio Leitão), revolvi reproduzir matéria publicada pela Folha de S. Paulo “A revolução foi, sim, tuitada, mostra estudo”.
Mas de qualquer modo, creio que a minha afirmativa não foi completamente contraditada. Vejam este trecho:
“Conclui [a pesquisa] que, embora não tenham provocado a revolução em si, Twitter, Facebook, YouTube e blogs, nessa ordem, deram aos protestos velocidade suficiente para culminar na queda dos ditadores Zine Ben Ali, na Tunísia, em janeiro, e Hosni Mubarak, no Egito, em fevereiro.”
Link para a pesquisa completa (em inglês).
Segue o texto completo da Folha de S. Paulo.
Folha de S. Paulo (21/9/2011)
A revolução foi, sim, tuitada, mostra estudo
LUCIANA COELHO
DE WASHINGTON
Não era só impressão: uma análise quantitativa mostra que o Twitter e outras redes sociais foram o pivô das revoltas populares que derrubaram ditadores na Tunísia e no Egito no início do ano.
A pesquisa do Projeto sobre a Tecnologia da Informação e o Islã Político (pITPI), da Universidade de Washington, analisou mais de 3 milhões de tuítes relacionados à Primavera Árabe.
Conclui que, embora não tenham provocado a revolução em si, Twitter, Facebook, YouTube e blogs, nessa ordem, deram aos protestos velocidade suficiente para culminar na queda dos ditadores Zine Ben Ali, na Tunísia, em janeiro, e Hosni Mubarak, no Egito, em fevereiro.
“A velocidade foi importante porque os ativistas puderam pegar os ditadores com a guarda baixa”, disse à Folha Philip Howard, chefe do projeto e autor de The Digital Origins of Dictatorship and Democracy (2010).
Segundo Howard, a maioria dos regimes autoritários não tem, ainda, “compreensão mais sofisticada das mídias sociais” -o que dá aos ativistas chance de compensar, até certo ponto, desvantagens numéricas e de poder.
Mas ele evita, porém, usar expressões como “Revolução do Twitter” ou “Revolução do Facebook”, pois os regimes usam as redes também para colher dados e arquitetar a contrainsurgência.
Grandes protestos foram precedidos por picos de tuítes e diálogos on-line, mostra o estudo. Na Tunísia, onde 20% dos 10 milhões de habitantes usam redes sociais, 1 em cada 5 blogs analisava o governo no dia da renúncia; o quádruplo de um mês antes. Em um intervalo de dois meses, foram mais de 13 mil tuítes com a hashtag #sidibouzi, a principal da revolta.
Já no Egito, 82 milhões de habitantes e 10% de acesso, foram mais de 2,3 milhões de tuítes com #egypt entre 14 de janeiro e 24 de março.
Nos dois casos, o impacto foi ampliado por mensagens de celular -estes sim com penetração alta na população.
O estudo ainda mostra que o debate se espalhou na região e no mundo rapidamente e incluiu mais mulheres que a política tradicional.
Além disso, ele não foi alimentado por estrangeiros e expatriados. Com o correr do dias, tuítes vindos dos dois países passaram, em média, de 18% para 36% (a maior parte não declara origem).
Para Howard, o perfil demográfico dos dois países -população majoritariamente jovem, muitos deles urbanos e versados nas redes sociais- selou o sucesso dos protestos. Jordânia e Marrocos, diz, têm perfil semelhante.
A questão difícil, por ora, é se o debate acabará restrito a uma elite educada, jovem e urbana, em detrimento da massa rural, mais pobre.
“Pode haver um sentimento pró-islamismo mais forte da população sem acesso à rede. Se liberais versados em tecnologia vierem a dominar o debate, será às custas dos islamistas
Prezado Plínio,
Obrigado pela lembrança quanto à matéria publicada na Folha. Aqui vão alguns breves comentários (desculpe-me pela pressa), se você me permite.
A análise de mais de 3 milhões de tweets não é algo simples, como se sabe. Pelo que percebi de modo preliminar, o exame privilegia a dimensão quantitativa para compreender os fenômenos políticos indicados, o que demanda compensações do ponto de vista qualitativo (as duas dimensões, ressalte-se, são fundamentais).
Por exemplo, na minha opinião, o efeito maior do emprego dos media digitais sobre as revoluções se refere menos à capacidade de mobilização (que, claro, não deve ser descartada, mas apenas melhor “calibrada”, evitando “empolgação”) e mais à exposição dos usuários daqueles países a estilos de vida distintos dos que estão acostumados. E aqui me refiro a padrões culturais e políticos. Por qual motivo continuar me submetendo a ditaduras que se mostram ilegítimas se tenho acesso a informações oriundas de outros lugares onde a realidade é tão diferente?
Outro ponto: Os chamados “picos de tweets” são naturais, intermitentes. Lembremos do período eleitoral aqui no Brasil, onde só se falava dos candidatos do PSOL, do PV, da “bolinha de papel” e por aí vai… Assim, não parecer haver grande novidade nas conclusões.
De qualquer maneira, enfatizo novamente, não posso falar muito mais sobre a metodologia da investigação de Howard sem conhecer os detalhes do trabalho (e nem as conclusões na íntegra). Vou procurar ler o material.
Philip Howard é um veterano nas pesquisas que envolvem a interface entre Internet e Democracia. É autor de livros importantes, tais como “The Digital Origins of Dictatorship and Democracy” e “New Media Campaigns and the Managed Citizen”. Vale a leitura.
Um abraço, bom trabalho.
Francisco Paulo Jamil