Estive na manifestação no dia do jogo entre Brasil e México, pela Copa das Confederações. As impressões que tive foram publicadas na edição de 20/6/2013, no O POVO.

“Balas de borracha não apagam e verdade”

Nunca tive dúvida de que as manifestações que acontecem em todo o Brasil são pacíficas, pela esmagadora maioria de seus participantes, e pude comprovar comparecendo ao ato de ontem. Grupos de jovens desciam de ônibus na BR 116 e caminhavam alegremente em direção à avenida Alberto Craveiro, alguns preparando seus cartazes ali mesmo, no chão, indicativo da espontaneidade dessas manifestações.

Humor e política

Essas placas também são reveladoras do caráter múltiplo do protesto. Não faltaram o humor das expressões cearenses, “Aí dênto, Fifa”, com a sua antítese: “Hoje a terra do humor quer falar sério”; havia meninas tranquilizando a família: “Mãe, relaxa, estou mudando o Brasil”; até os mais politizados: “Queremos saúde e escolas com padrão Fifa”. Vi também cartaz com trecho de poesia de Carlos Drummond: “Tenho duas mãos e o sentimento do mundo” e outra com um longo texto de Alberto Camus (escritor existencialista francês), cujo conteúdo não consegui ler. A diversidade dava o tom e o clima de camaradagem entre os manifestantes, mesmo entre os que não se conheciam, era visível.

Partidos de esquerda

Assim, chega a ser um ponto fora da curva a hostilidade aos partidos políticos de esquerda, cujos militantes mais antigos podem ser considerados “tios” dessa rapaziada. Foram eles que abriram caminho para a democracia, que todos desfrutamos hoje. A cada vez que se levantava a bandeira de um partido, imediatamente ouviam-se palavras de ordem: “Sem partido, sem partido” ou “O povo unido não precisa de partido”. (Os jovens do Egito podem ter pensado a mesma coisa.) Um integrante do PSTU me disse: “Estamos sofrendo, mas estamos aí”, referindo-se à rejeição com que eram recebidos.

Despreparo da polícia

Disse acima que as manifestações são pacíficas, mas existe meia dúzia que provoca e joga pedras, mesmo que os manifestantes tentem contê-los (vi um jovem confrontar os vândalos) e os participantes unirem-se no coro “Sem violência”.

Porém, a reação da Polícia Militar é absolutamente desproporcional. E, aí, não dá para saber se o governador Cid Gomes (PSB) e a Polícia Militar são despreparados ou mal intencionados: não se contentam com as bombas de gás lacrimogêneo e o spray pimenta (que podem provocar graves ferimentos). Usam indiscriminadamente balas de borracha – que tem sim poder letal.

Foi criminoso o uso desse tipo de munição, ferindo gravemente algumas pessoas. O Ministério Público deveria abrir uma ação para responsabilizar a quem de direito. E, sugiro à PM e ao governo, que reflitam sobre a advertência de uma manifestante: “Balas de borracha não apagam a verdade”.

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