Reprodução da coluna Política, edição de 6/5/2014, do O POVO.

Arte: Hélio Rôla

Lula quer ressuscitar o velho PT

Por coincidência – ou “sincronicidade”, como diria um amigo dado a questões psico-esotéricas – o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tocou em alguns pontos semelhantes aos comentados por mim em recente artigo para a editoria de Opinião. O discurso dele foi no Encontro Nacional do PT, confirmando a presidente Dilma Rousseff como (pré)-candidata à reeleição.

Com a pergunta retórica “PT: um partido como outro qualquer?” (http://migre.me/iIOUP), anotei que o Partido dos Trabalhadores igualava-se aos demais, no que eles têm de pior. Porém, no seu nascimento, tivera a capacidade de mobilizar a juventude com seu projeto inovador. Lula:

“Junto com a eleição da Dilma, nós temos que fazer um processo de recuperação da imagem do PT, mas, sobretudo, precisamos fazer uma campanha para construir uma nova utopia na cabeça de milhões e milhões de jovens brasileiros”.

Dei exemplos do “mensalão”, Petrobras e André Vargas para mostrar que o PT faz hoje o que condenava ontem nos outros partidos. Lula:

“Nós criamos um partido político para ser diferente de tudo o que existia. Esse partido não nasceu para fazer tudo o que os outros fazem. Esse partido nasceu para provar que é possível fazer política de forma mais digna, política com ‘P’ maiúsculo”.

Afirmei que o PT original tinha amigos modestos financeiramente, porém de grande dimensão humana. Citei como “amigo” de hoje o doleiro Alberto Youssef e, entre os da velha guarda, o ambientalista Chico Mendes. Lula:

“Nós precisamos recuperar o orgulho que foi a razão da existência [do PT], porque a gente, às vezes, não tinha panfleto para divulgar uma campanha. Hoje, parece que o dinheiro resolve tudo. Os candidatos a deputado não têm mais cabo eleitoral gratuito [voluntários]. É tudo uma máquina de fazer dinheiro, que está fazendo o PT ser um partido convencional”.

A análise que fiz qualquer pessoa atenta faria. Surpreendente é ver as críticas verbalizadas publicamente pelo fundador e principal militante do PT – duas vezes presidente da República -, cuja vontade costuma ser acatada por todo o partido. Seria um recado que o PT não mais vai tolerar desvios de conduta ou apenas um discurso eleitoral?

Escola de Base
O caso de Escola de Base, acontecido em São Paulo (1994), ficou registrado como um dos mais graves erros da imprensa brasileira. (Ou, talvez, um dos mais debatidos, entre os vários que acontecem.)

Sete pessoas, entre proprietários, professores e motoristas do carro escolar, foram acusadas de abusar sexualmente das crianças. A acusação partiu de um delegado de Polícia, que divulgou, sem investigação, a denúncia de uma mãe. Os jornais, do mesmo modo, transformaram o caso em manchetes diárias. A escola foi depredada, os donos perderam tudo o que tinham materialmente, e a família ficou destruída por graves problemas psicológicos. Ao fim, o inquérito foi arquivado por falta de provas e todos os suspeitos inocentados.

O caso voltou a ser noticiado recentemente (e discretamente) depois da morte do proprietário da escola Icushiro Shimada, 70 anos, ocorrida no dia 16/4, decorrência de um infarto. A mulher dele, Maria Aparecida, morrera de câncer em 2007.

Lição aprendida?
O ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha (PT), candidato a governador de São Paulo, viu seu nome nas manchetes dos jornais por ter sido citado em uma troca de mensagens entre o ex-presidente da Câmara dos Deputados André Vargas (sem partido) e o doleiro Alberto Yousseff, investigado na operação Lava Jato, da Polícia Federal.

Vejam as manchetes.

Jornal Folha de S. Paulo: “PF liga ex-ministro Alexandre Padilha a laboratório de doleiro preso” (24/4/2014). Texto:

“Novo relatório da Polícia Federal sugere que o ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha indicou no ano passado um ex-assessor para dirigir o laboratório farmacêutico Labogen, controlado pelo doleiro Alberto Youssef. A suspeita da PF é baseada numa mensagem enviada pelo deputado André Vargas (PT-PR) ao doleiro por telefone celular no dia 28 de novembro e interceptada pela PF”.

Revista Veja (24/4/2014): “Alexandre Padilha indicou diretor de laboratório fantasma”. Texto:

“Mensagens interceptadas (…) arrastam para o escândalo o deputado Candido Vaccarezza (PT-SP) e o ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, pré-candidato petista ao governo de São Paulo”.

Jornal O Globo (24/4/2014): “PF suspeita que Padilha indicou diretor de laboratório de doleiro”. Texto:

“(…) Segundo relatório [da PF], existem indícios de que o ex-ministro indicou o executivo, Marcos Cezar Ferreira de Moura, para a diretoria do Labogen (…)”.

Observem
Com base em uma conversa de terceiros – da qual Padilha não participou – utilizando-se termos como “ligação”, “suspeita”, “indícios”, “sugestão”, leva-se o nome de um homem à lama. Sem falar na indefectível Veja, que dá como certo um suposto malfeito, supostamente cometido pelo ex-ministro da Saúde.

PS. Até o dia 24 escreverei neste espaço, período de férias do titular, Érico Firmo. Em compensação, os leitores terão folga dos meus artigos semanais na editoria de Opinião.

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