Reprodução da coluna “Política”, edição de 13/5/2014, do O POVO.

“Somos responsáveis pelos maus políticos”
Plínio Bortolotti

O ministro Marco Aurélio Mello foi mais um a usar o lugar-comum de jogar para cima do cidadão votante a culpa pelas (más) escolhas dos mandatários desta Terra Brasilis. A declaração dele deu-se quando fazia o balanço de seus dois anos à frente do Tribunal Superior Eleitoral, cargo que passará ao ministro Dias Toffoli. Disse ele:

“O eleitor precisa estar conscientizado de que exerce papel fundamental, por isso é ator e não vítima na escolha dos representantes. Nós somos responsáveis pelos maus políticos que temos, porque fomos nós que os colocamos nos cargos.”

A pergunta é a seguinte: teria o eleitor opção frente ao quadro que se lhe apresenta a cada dois anos?

No Ceará, por exemplo – e sem entrar no mérito das qualidades ou defeitos dos candidatos -, se houvesse acordo entre PT e Pros para o candidato ao governo ser do PMDB, o senador Eunício Oliveira seria o postulante da situação. Como o acordo está cada vez mais difícil (impossível eu diria), Eunício disputará como oposicionista. E já começou a dar as suas cacetadas no governo, do qual fazia parte até ontem, e que elogiaria, caso recebesse apoio do governador Cid Gomes.

Portanto, se alguém quiser votar em uma oposição, fora a esquerda “radical” (Psol, PSTU), teria alguma alternativa? Quem sabe o PSB? Mas não foi desse partido – que também era situação até anteontem – do qual saiu recentemente o governador Cid Gomes e seu grupo para abrigar-se no Pros? Difícil. O eleitor olha o quadro e vai naquela base: não tem tu, vai tu mesmo. Depois aparece alguém para culpá-lo por “escolher mal”.

DINHEIRO
Uma das medidas que precisam ser tomadas, urgentemente, para que as opções no panorama político se ampliem é a mudança no financiamento das campanhas, de forma a barateá-las. Quantas pessoas têm disposição para se aventurar a um cargo de deputado estadual, tendo de investir entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão; deputado federal entre R$ 3 milhões e R$ 5 milhões; e na disputa para o senado perto de R$ 10 milhões? (Ficando apenas nos cargos legislativos.)

EMPRESAS
Por óbvio, essa dinheirama toda vem quase que exclusivamente da doação de pessoas jurídicas. Segundo estudo da Transparência Brasil, um número pequeno de empresas financia a maioria das campanhas em todo o Brasil; logo, adquirem proximidade muito grande com os eleitos. E, todo mundo sabe, ninguém dá dinheiro pelos belos olhos dos candidatos. Por via das dúvidas, as doações costumam beneficiar tanto a “situação”, quanto a “oposição”, principalmente quando há equilíbrio de forças. Quando o candidato é pule de dez, ele costuma passar o rodo na mesa das doações.

DISCURSO
No mesmo discurso, o ministro Marco Aurélio informou que a Justiça Eleitoral gastou (2010) R$ 250 milhões com abstenções e votos nulos e brancos, sendo R$ 195 milhões relativos a pessoas que se abstiveram de votar. O cálculo foi feito a partir do valor R$ 3,63 que o TSE gasta para preparar cada voto. Marco Aurélio apresentou os números como se fossem desperdício de dinheiro.

Ocorre que votos nulos e brancos são manifestações legítimas. O próprio não-comparecimento também pode ser considerado forma de protesto aceitável em uma democracia. A propósito, pesquisa do Datafolha mostra que 61% dos brasileiros são contra o voto obrigatório – e 57% dos eleitores deixariam de votar se o voto fosse facultativo.

MANIFESTAÇÃO
Escrevi nesta coluna (9/5/2014) crítica aos excessos praticados por policiais e guardas municipais na manifestação dos estudantes no terminal de ônibus de Messejana, devido ao atraso na entrega da carteira estudantil, que lhes vinha custando o pagamento de inteira no transporte coletivo.

No dia seguinte, ocorreu novo ato no Centro da cidade, desta vez com a predominância de sujeitos mascarados e vestidos de preto, a tal “tática black bloc”, de provocação e incentivo ao quebra-quebra. E o confronto degringolou para o fechamento de lojas e a destruição da fachada de vidro de pelo menos uma agência bancária. Antes da manifestação, a Prefeitura já havia anunciado a prorrogação da validade das carteiras antigas até 31/5. Se foi inaceitável o comportamento dos policiais no protesto de Messejana, agora há de se condenar a violência por parte dos estudantes.

PRUDÊNCIA
Pelo número de carteiras de estudantes que ainda faltam ser confeccionadas – quase 200 mil alunos estavam sem o documento até a semana passada -, é difícil crer que a Prefeitura resolva o problema até o fim do mês. Seria mais prudente um prazo maior, ou se dará motivo para novas manifestações.

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