Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 15 de janeiro de 2017 do O POVO.

Um governo dos horrores

A demissão do secretário da Juventude, Bruno Júlio (PMDB), é um daqueles episódios que não deveriam ter ocorrido, posto que o rapaz nem deveria ter sido nomeado para o cargo, devido aos seus antecedentes. É dele a seguinte declaração estarrecedora sobre a chacina nos presídios de Manaus e Roraima, que deixaram 86 mortos, muitos deles decapitados e esquartejados:

“Eu sou meio coxinha sobre isso. Sou filho de polícia, não é? Sou meio coxinha. Tinha era que matar mais. Tinha que fazer uma chacina por semana”, e ainda querendo fazer mais um aceno para a sua cambada, acrescentou: “Esse politicamente correto que está virando o Brasil está ficando muito chato”. Ter-se-ia (homenagem ao ex-chefe e correligionário desse moleque) de perguntar como ele faria a relação de uma coisa com a outra, mas seria exigir muito da inteligência do indigitado.

De qualquer modo, o relincho do ex-secretário serviu para trazer à tona a sua ficha corrida. O “filho de polícia” é investigado por acusação de lesão corporal contra a ex-companheira, denúncia feita em abril, na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, em Belo Horizonte. Em outro processo, de 2014, é suspeito de agredir com socos, tapas e chutes uma mulher com quem tinha união estável. Ainda responde por denúncia de assédio sexual contra uma funcionária. Portanto, o famigerado Bruno Júlio corre o risco de frequentar um presídio, no qual, por um “pavoroso acidente”, pode acontecer uma rebelião.

O problema é que o parlapatão ex-secretário da Juventude verbalizou o interdito, mas é o que deve pensar a média do governo Temer. Por isso, ele foi removido imediatamente do teatro governamental, ao contrário de outros auxiliares, quando Temer relutou em defenestrá-los. Assim não fosse, o presidente nem teria nomeado para uma secretaria que lida com a juventude, um elemento acusado por duas mulheres de agressão e uma terceira de assédio sexual. Que exemplo para os jovens, hein?

Pode-se acusar a ex-presidente Dilma Rousseff de muita coisa, mas não de ter errado na classificação do gabinete de Temer, ao perfilá-lo como “um governo de homens velhos, brancos e ricos” (e muitos deles corruptos, diga-se), quer dizer, reacionários, ultrapassados e afeitos à defesa de seus próprios privilégios.

E nem se entenda “velho” apenas pela idade cronológica, mas pelo decrepitude das ideias. Dom Paulo Evaristo Arns morreu com 95 anos vendendo jovialidade; Darcy Ribeiro foi-se com 74 anos, jovem, sorridente e rebelde. A propósito, foi Darcy Ribeiro quem vaticinou, em 1982, que, caso não se começassem a construir mais escolas, em vinte anos não haveria dinheiro para construir mais presídios. Pois bem, perto deles Bruno Júlio, com menos de trinta anos de idade é um macróbio.

Com o objetivo de analisar o que se passou, nem é preciso falar que Temer demorou quatro dias para se pronunciar sobre a chacina, orientado por “marqueteiros” para ficar longe da confusão, como se fosse possível. Também pode ser deixada de lado a atuação lamentável do ministro da Justiça Alexandre de Moraes, com suas declarações desencontradas e mentirosas. Para classificar a administração Temer, basta dizer que é um governo dos horrores.

PS. Se, por um eventual acaso, o ex-secretário Bruno Júlio sentir-se ofendido com algumas das palavras usadas para qualificá-lo, deixo registrado que vou usar o mesmo expediente que o presidente Michel Temer utilizou para explicar a desastrada declaração considerando “acidente pavoroso” o morticínio em Manaus. Ou seja, vou até o dicionário para mostrar os vários sinônimos de cada uma das palavras com as quais ele possa ter-se sentido injuriado.

NOTAS

Reacionário
No Brasil a palavra “conservador” ganhou conotação negativa, como se os conservadores nunca aceitassem nenhum tipo de mudança, inclusive quanto ao comportamento e costumes. Porém, existem grandes diferenças entre uma coisa e outra. O governo de Michel Temer não é conservador, porém reacionário.

Conservador
Quem quiser saber a diferença entre os dois conceitos, sugiro a leitura do livro “As ideias conservadoras – Explicadas a revolucionários e reacionários”, do jornalista e escritor português João Pereira Coutinho.

Reacionário/Conservador
Simplificadamente, Coutinho diz que o conservador é aquele que recusa a utopia futura (do revolucionário) e também rejeita a felicidade utópica do passado, aquela que almeja o reacionário. Portanto, o conservadorismo deve começar pela fruição do presente, aquilo que o tempo provou que é seguro e bom

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