Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 2/4/2017 do O POVO.

Empresas têm de ser transparentes

Mesmo se a considere exagerada, a operação Carne Fraca levantou questionamento sobre o que o brasileiro põe à mesa. A “indústria de proteína animal” diz que segue todas as normas legais; que mantém padrões éticos; que vende aos clientes os mesmos produtos oferecidos às suas próprias famílias (ou às estrelas da TV, turbinadas com cachês milionários).

Apesar disso, no mundo real, o que move o negócio é o lucro: e nada contra, desde que não seja faturado em cima da saúde alheia.

Quando acontecem irregularidades, a direção das empresas alega ser problema “pontual”, culpando subordinados. Mas os executivos escondem que os empregados são espremidos até os ossos para “cumprir metas”, com os superiores fechando os olhos para os métodos usados para atingir o mister.

Por outra vista, também não adianta embarcar na utopia naturista, como se fosse possível voltar ao tempo supostamente idílico do homem caçador-coletor ou vivendo em pequenas comunidades autossuficientes. A agricultura orgânica e a permacultura, mesmo sendo importantes, não conseguirão suprir as necessidade humanas. (Ainda que a fome não seja decorrente da falta de alimentos, porém de sua injusta distribuição, mas esse é outro debate.)

Assim, temos de conviver com as grandes indústrias de alimentos, sem demonizá-las; mas sem deixá-las impor os seus ditames.

A cadeia produtiva do agronegócio está longe de ser um exemplo, pois nela se observa desde o sofrimento brutal dos animais ao desmatamento, passando pelo trabalho escravo.

Se os frigoríficos e outras grandes empresas estão mesmo preocupadas com o meio ambiente e com seus clientes, deveriam cuidar para que isso melhore, rastreando com mais rigor os produtos que chegam às suas fábricas, obrigando seus fornecedores a fazerem um serviço limpo.

Dizer que cumprem todas as regras oficiais, como sempre fazem, é apenas a obrigação. Melhorem, caso queiram reconhecimento público.

Tomemos o caso dos transgênicos, hoje consumidos por milhões de brasileiros, que nem devem saber que organismos geneticamente modificados estão no seu prato. Deixando de lado a polêmica sobre serem prejudiciais ou não à saúde – e mesmo por isso – ninguém discordaria de que o consumidor tem o direito de saber se o que compra contém transgênicos.

Porém, a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) lutou o quanto pôde contra a Lei de Biossegurança. Aprovada, tornou-se obrigatória a rotulagem indicando a presença de transgênicos nos produtos.

Perdida a primeira batalha, a Abia começou a questionar o símbolo dos transgênicos: um “T” aposto no centro de um triângulo amarelo para alimentos que contenham pelo menos 1% de transgênicos. A associação quer aumentar o percentual para 4% e mudar o símbolo, que lhe parece alertar para uma coisa “perigosa”.

Talvez o leitor ainda não tenha observado, mas boa parte dos óleos de cozinha – entre muitos outros produtos – contém o triângulo amarelo no rótulo. Isto é, foi produzido com vegetal geneticamente modificado, milho ou soja, por exemplo. Os produtos podem ser seguros, como afirmam seus defensores, mas o consumidor tem o direito de saber o que está levando para casa, com informações claras e objetivas.

Já é tempo de dirigir as queixas ácidas que costumamos reservar aos serviços públicos também à iniciativa privada e aos seus representantes.

NOTAS

Transgênicos
Alguns produtos que contêm transgênicos: aspartame, óleo de cozinha, milho, amido de milho, xarope de milho, margarina, leite, salsicha, pães, bolos, biscoitos, soja e lectina.

Cerveja
A propósito, as cervejas mais populares, tipo Skol, Brahma, Antarctica, Original e outras, todas contêm “cereais não maltados” em sua fórmula, como anotado no rótulo, em letras miúdas. Cereais não maltados, normalmente, é sinônimo para milho, possivelmente transgênico, pois esse tipo de cultura responde por 85% da produção brasileira.

Feijão
A Embrapa deve lançar este ano o primeiro feijão transgênico do mundo, desenvolvido pela empresa. A semente será resistente a duas doenças que atacam a produção: o vírus do mosaico dourado e o carlavirus.

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