As enfermidades acontecem. Não se trata de algo excepcional; elas fazem parte da natureza e são fatos inevitáveis. Naturalmente temos todo direito de evitar a doença e a dor; mas, apesar desse esforço, quando ocorre a doença, o melhor é aceitá-la. Embora devamos fazer todo o esforço para curá-la com a máxima rapidez possível, não deveríamos aceitar nenhuma opressão mental a mais. Como disse o grande estudioso indiano Shantideva: Se houver uma forma de superar o sofrimento, não haverá necessidade de nos preocuparmos; se não houver como superar o sofrimento, de nada adiantará nos preocuparmos. Esse tipo de atitude racional é muito útil.

Sua Santidade, o Dalai Lama

[Bstan-‘dzin-rgya-mtsho, Dalai Lama XIV. O livro da sabedoria. Tradução Waldéa Barcellos. – São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 30.]

Alguns leitores que têm tirado alguns minutos do seu tempo diário para leitura dos textos que tenho postado neste blog terão sentido falta da postagem de ontem. Depois de mais de um mês de postagens diárias, ontem me vi impedido de cumprir o meu propósito devido a dificuldades motivadas por doença em uma pessoa da minha família, o que tem demandado de mim um envolvimento muito grande com as tentativas de solucionar os problemas decorrentes da difícil situação. 

Embora hoje também não tenha conseguido postar o texto no horário habitual, eis-me aqui no afã de, mesmo assim, tentar escrever algo para este blog. Em vista da situação em que me encontro, procurei um texto que dissesse um pouco do momento. Escolhi, então, o trecho de um dos livros do Dalai Lama, acima citado.

Devo muito ao budismo, e muito especialmente ao budismo tibetano, país onde tive o privilégio de estar uma vez em peregrinação, o que me proporcionou o contato com uma forma de abordar a vida e seus problemas que produziram em mim mudanças de inestimável valor.

O trecho citado aqui é um dos que mais gosto de tudo quanto já li sobre o budismo tibetano, seja através dos textos do Dalai Lama, seja em textos de outros autores e mestres filiados a essa milenar tradição. Por que gosto tanto dessa citação do Dalai Lama? Porque ela ensina não o conformismo, mas a aceitação pacífica daquilo que não está ao nosso alcance mudar.

Nem sempre é fácil, quando se lida com situações angustiantes, admitir que, por mais que tentemos, há um ponto além do qual não se pode ir. A dificuldade em aceitá-lo está em que, nesse caso, esbarramos no nosso limite humano, e se reconhecer limitado e impotente é terrível para qualquer ser humano.

Chega um momento, porém, em que descobrimos que super-heróis só existem na ficção. Limitados que somos, temos que admiti-lo, sob pena de ficar batendo a cabeça contra o muro e ampliando em proporções neurotizantes a sensação de inadequação e impotência diante dos reveses da vida. A sabedoria, neste caso – e os mestres budistas o têm lembrado reiteradamente ao longo dos séculos – consiste em aquietar o coração e a mente, convictos de que a seu tempo o que tem solução será solucionado.

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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