E foi assim que o olhar de uma magistrada passou a perceber os velhos e empoeirados processos como fontes de raro valor histórico na construção do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho no Brasil.

Magda Barros Biavaschi

[Biavaschi, Magda Barros. Os processos judiciais e a construção do Direito do Trabalho: amar o perdido. In: Biavaschi, Magda Barros; Lübbe, Anita; Miranda, Maria Guilhermina (Coordenadoras). Memória e preservação de documentos: direito do cidadão. São Paulo: LTr, 2007, p.60.]

O Tribunal Regional do Trabalho realiza nesta quinta e sexta-feira, dias 8 e 9 de abril, o Fórum Nacional em Defesa da Memória da Justiça do Trabalho. O evento é parte de uma série de ações que o TRT da 7ª. Região vem realizando com o objetivo de incentivar o resgate e preservação da Memória da Justiça do Trabalho no Brasil. O Fórum é aberto ao público, e as inscrições são gratuitas, podendo ser efetuadas no próprio local. Aos inscritos será entregue certificado de participação.

A palestra inicial do Fórum ficará a cargo da Dra. Magda Barros Biavaschi. Em 2009 a Dra. Magda já estivera em Fortaleza a convite do TRT. Na ocasião, falou da importância da preservação de processos judiciais, uma vez que

Dra. Magda Biavaschi

através deles parte da história da Justiça do Trabalho é contada. Para tanto, tomou como referência sua tese de doutorado, que foi realizado no Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, IE/UNICAMP. Estive presente à palestra da Dra. Magda Biavaschi, e devo dizer que constituiu para mim enorme deleite ouvi-la falar de seu trabalho. Durante toda a palestra vimos transbordar de suas palavras uma incontida paixão pela história e pela preservação das fontes que lhe servem de apoio.

No dia seguinte à palestra, minha primeira atitude foi procurar nas livrarias da cidade os dois livros que têm, um, a Dra. Magda como autora e, o outro, como uma das organizadoras. Como não os encontrei em Fortaleza, tratei de adquiri-los pela internet. O primeiro, O Direito do Trabalho no Brasil – 1930-1942: a construção do sujeito de direitos trabalhistas, resultou de sua tese de doutorado. Ao falar do material que serviu de apoio aos seus estudos, afirma a autora:   

Quanto aos processos antigos, procedeu-se a um balanço dos que compõem o acervo do Memorial da Justiça do Trabalho no Rio Grande do Sul. São oriundos das antigas Juntas de Conciliação e Julgamento de São Jerônimo (260 processos, anos 1938 a 1947, sendo dois de 1969), Rio Grande (84 processos, anos 1938 a 1944) e Porto Alegre (peças de 39 processos incompletos), respectivamente zonas de mineração, portuária e capital. Destes, selecionaram-se os mais paradigmáticos para uma análise mais detida. Todos tendo em comum o fato de terem sido ajuizados antes da Justiça do trabalho e da CLT e, como fio condutor, os princípios que fundam o Direito do Trabalho, com eixo, na sua quase totalidade, nas interpretações da Lei n. 62, de 1935 (a Lei da Despedida), na validade das despedidas e reintegrações reivindicadas, nas justas causas, no aviso prévio, na existência da relação de emprego, na “Avocatória” e seus limites, na representação sindical dos associados como exigência da lei, no ônus da prova, na competência dos órgãos que estavam sendo criados; Juntas de Conciliação e Julgamento, Conselhos Regional e Nacional do Trabalho, Justiça Comum. Instituições que se afirmavam como lócus de construção e consolidação de direitos [O Direito do Trabalho no Brasil – 1932-1942: a construção do sujeito de direitos trabalhistas. Biavaschi, Magda Barros. São Paulo: LTr: Jutra-Associação Luso-Brasileira de Juristas do Trabalho, 2007, p. 24].

Já em um outro texto, desta feita publicado no livro Memória e preservação de documentos: direitos do cidadão, a autora explica o que poderíamos identificar como o fato que lhe forneceu o insight para que levasse a efeito seu estudo acerca da história da Justiça do Trabalho:

Buscando investigar as fontes materiais do Direito do Trabalho no Brasil, procedeu-se a algumas entrevistas. Daí o encontro com Arnaldo Süssekind, testemunha viva do processo de construção da regulação do trabalho nesse período e único membro ainda vivo da comissão que elaborou a Consolidação das Leis do Trabalho, CLT. Com ele foram, ao todo, três entrevistas e um depoimento público. Mas foi o primeiro encontro que, além de trazer dados relevantes para o estudo proposto, desencadeou uma situação peculiar que merece ser assinalada. Na realidade, foram duas circunstâncias que interagiram: a primeira, a referência de que uma das fontes materiais da CLT está nos pareceres exarados nas reclamações trabalhistas, em especial pela via da “Avocatória” ao Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio; a segunda, o fato de que, na semana seguinte à entrevista, esta autora, às vésperas de sua aposentadoria como juíza do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª. Região, participou da que seria sua última seção ordinária do Órgão Especial. Nesta, a então Presidente do Tribunal encaminhou, para deliberação do colegiado, expediente da Vara de São Jerônimo buscando autorização para eliminar autos findos. Esclarecido pela Presidência que se tratavam de processos anteriores à instalação da Justiça do Trabalho, deu-se início a uma série de ponderações sobre a relevância histórica dos mesmos, deliberando-se, por fim, que seriam requisitados ao Tribunal. Muitos, porém, já haviam sido eliminados. Preservaram-se, naquela oportunidade, 260 processos dos anos 1938 a 1947 e dois processos do ano de 1969, que hoje fazem parte do acervo do Memorial da Justiça do Trabalho no Rio Grande do Sul [Biavaschi, Magda Barros; Lübbe, Anita; Miranda, Maria Guilhermina (Coordenadoras). Memória e preservação de documentos: direito do cidadão. São Paulo: LTr, 2007, p 58.]

A Dra. Magda muito terá a dizer amanhã, aos que comparecerem ao TRT, sobre a importância da preservação dos processos judiciais como fonte da história não só da Justiça do Trabalho, mas da própria História do Brasil. De parabéns está o Desembargador José Antônio Parente da Silva, pelo incentivo a projetos culturais, levados a efeito pelo TRT da 7ª. Região durante sua gestão, dos quais este é um ótimo exemplo. Igualmente de parabéns está a dinâmica equipe responsável pela organização do evento, constituída pela professora Adelaide Gonçalves, Diretora da Escola Judicial do TRT-7ª. Região, e pelas bibliotecárias Maria Esther, chefe da Seção de Memorial, e Rejane Albuquerque, chefe da Seção de Biblioteca.

Auguramos ao Fórum Nacional em Defesa da Memória da Justiça do Trabalho os melhores votos de sucesso e o desejo de que eventos como este frutifiquem e sirvam de exemplo para outros órgãos do Judiciário.

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Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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