Joseph Campbell (1904-1987)

De minha parte, bem, uma vez Alan Watts me perguntou qual era o meu exercício espiritual. Eu respondi: “Eu sublinho frases em livros”.

 

Joseph Campbell

[Campbell, Joseph. Mito e transformação. Organização e prefácio de David Kudler; tradução Frederico N. Ramos. – São Paulo: Ágora, 2008, p. 160. (As obras reunidas de Joseph Campbell).]

Já escrevi antes neste blog sobre Joseph Campbell, o grande mitólogo norte-americano (1904-1987). Campbell foi um apaixonado pela mitologia. Dedicou-se integralmente ao estudo dos mitos, deixando, ao final dos seus oitenta e três bem vividos anos, uma obra vasta e profunda, na qual disseca os mitos de povos os mais diversos sob várias perspectivas. A medida que fui descobrindo seus escritos, mais e mais me tornei um aficionado por esse autor. Leio seus textos com enorme prazer, como verdadeiras lições de vida. O diferencial de Joseph Campbell como estudioso dos mitos pode ser creditada à forma peculiar como ele aborda o assunto. O seu interesse no estudo da mitologia não é exclusivamente acadêmico, científico. Para ele, os mitos são padrões que servem como guias para a vida.

Todos nós, de alguma forma, vivemos padrões arquetípicos. Esses arquétipos são expressos através dos mitos. Resta-nos descobrir que mito ou mitos estamos vivendo, para que, assim, possamos tirar proveito dessa estrutura que subjaz à nossa existência. Campbell se deleitava em falar desses arquétipos.  Como afirmou várias vezes, ele era um homem que gostava de contar histórias. Isso é verdade, e ele sempre o fez de forma deliciosa. Nesse ato de contar histórias, ele as trazia para a vida diária, para o nosso cotidiano. Lendo os textos de Campbell percebemos que os heróis míticos estão bem próximos de cada um de nós, na verdade, acabamos por concluir que tais heróis somos nós mesmos.

Junto com a narração e exploração dos mitos, o autor faz entrar em cena, também, os ritos, que são a dramatização daqueles. Numa definição bem sucinta pode-se afirmar que o rito é o mito teatralizado. Também nesse caso acabamos por perceber o quanto nós, humanos, somos ritualistas. De minha parte posso dizer que eu não conseguiria viver sem meus mitos pessoais nem, muito menos, sem os ritos através dos quais os atualizo diariamente.

Campbell leu muito, foi um verdadeiro erudito. Seu conhecimento da mitologia universal era enciclopédico. Certa vez, durante uma rodada de perguntas após uma de suas palestras que atraíam admiradores onde quer que fossem realizadas, uma mulher indagou: “E o que o senhor faz, sr. Campbell? Qual é a sua imagem de Deus?” Respondeu o palestrante: “É muito divertido responder a essa pergunta. ´Sr. Campbell, o que o senhor faz?` Ora, eu escrevo e leio sobre mitologia”. O melhor, porém, o que mais me encantou, a mim, que sou um inveterado leitor, foi o que Campbell disse a seguir:  “De minha parte, bem, uma vez Alan Watts me perguntou qual era o meu exercício espiritual. Eu respondi: ´Eu sublinho frases em livros´” (p. 160).

Senti-me, a exemplo do que já acontecera tantas vezes durante minhas leituras dos textos de Joseph Campbell, mais uma vez maravilhado com suas palavras. Elas proporcionaram-me um grande insight: imaginem, o ato de sublinhar livros como exercício espiritual! O fato é que, embora nunca o tenha encarado dessa forma, eu também sublinho livros.

About the Author

Vasco Arruda

Psicólogo, professor de História das Religiões e Psicologia da Religião.

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