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Vasco Arruda

Uma das recordações da minha adolescência é a de ter lido um livro chamado História Popular de Jesus. Se a memória me não falha, o livro era uma tradução do francês e trazia ao fundo da capa o nome de Coimbra Editora. A Coimbra Editora – vim a sabê-lo mais tarde – era a livraria que editava tratados dos lentes da Universidade e outros livros igualmente importantes.
Devorei esse livro – é o termo – sentado na cama, à luz do meu candeeiro de petróleo. Foi esse o meu primeiro contacto com livros que falavam de Jesus. Depois, ao longo da vida, li muitos outros sobre o mesmo tema. Essas leituras punham-me problemas. E o primeiro era o seguinte: mas quem é, afinal, esse Jesus de Nazaré? Queria parecer-me que a orientação da minha vida – e até a opção fundamental que nela havia de fazer – estava dependente da resposta a esta pergunta.
Claro que li também a Vida de Jesus, de Renan, que a Chardron se apressou a traduzir para a nossa língua, pouco tempo depois de ela ter aparecido no original francês. Admirava o estilo sedutor do antigo escolar de S. Sulpício, mas eu tinha a intuição que ali falhava alguma coisa de essencial. Se Jesus de Nazaré era apenas o “doce Rabi da Galileia” – como Renan gostava de dizer – , amigo das crianças, dos pobres e dos pecadores, que era feito das palavras que ele dissera sobre si mesmo (Eu sou o senhor do Sábado, e outras semelhantes) e sobre o seu Pai celeste, dos milagres que fizera? E, sobretudo, como explicar a fé dos primeiros discípulos em que ele, depois de morto – e bem morto -, havia ressuscitado? Alucinação coletiva da parte deles? Ou, então, o amor apaixonado de Maria Madalena, que tinha confundido Jesus com o jardineiro e incutira nos discípulos a ideia de que ele estava vivo?
Mas, ao meu espírito, tudo isso parecia fantasioso. Passar o lápis azul sobre os milagres de Jesus como se não pertencessem à história, mas fossem formações lendárias – à maneira do Sansão bíblico ou da pedreira de Aljubarrota -, era enveredar por caminhos mais inverossímeis do que o da aceitação dos milagres, designadamente o da ressurreição de Jesus. Quando se parte do princípio de que “Deus não existe” e de que, consequentemente, “os milagres são impossíveis”, fica o campo aberto para aceitar todas as acrobacias do espírito, mesmo que estas contradigam o testemunho histórico e rocem pelo absurdo.
Nunca mais deixei de ler livros sobre Jesus. E cada vez se acentuou mais no meu espírito que o crente tem na mão a única chave que dá na fechadura; que as outras chaves (sejam elas a da escola crítica – à maneira de Renan – ou da escola mítica – segundo o modelo de Strauss) – têm ranhuras diferentes que não se adaptam á fenda da fechadura; que, negando dados históricos incontestáveis, se torce a chave e, com a chave assim torcida, não se consegue abrir a porta…
Manuel de Almeida Trindade, Bispo emérito de Aveiro
[Trindade, Manuel de Almeida. “Uma história popular de Jesus”, texto introdutório ao livro de Dante Alimenti, Seguindo a Jesus. Volume 1. Editorial Verbo, 1991, p. 2.]

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Vasco Arruda

O maior título que se reconhece a Maria é precisamente sua maternidade divina, esse é seu título de glória, que exprime também sua vocação. Maria foi suscitada pela graça para ser mãe. No entanto, ela não poderia ser especificamente a “Mãe de Deus” se não tivesse sido preservada de todo pecado desde sua concepção. À glória de Maria corresponde um imenso mistério inicial, uma obra extraordinária da misericórdia divina, sua concepção imaculada, pela qual tudo foi possível… porque, para Deus, nada é impossível! Falar da Imaculada Conceição de Maria é falar de sua pureza original. Maria é, por graça, pura, inteiramente pura, isto é, preservada de todo pecado, de todo mal, e até mesmo da corrupção da carne. Grande é esse mistério…
Jean-Claude Michel
[Michel, Jean-Claude. A Imaculada Conceição, promessa de pureza. 2ª. ed. Tradução de José Joaquim Sobral. – São Paulo: Editora Ave-Maria, 2005, p. 7. (Série Virgem Maria; 5)]

Vasco Arruda

A forma mais divina de conhecimento é aquela a que se chega por meio do conhecimento adulto, segundo a unificação que dá ensejo a que a capacidade da mente transcenda; quando a mente, separando-se de todas as coisas e, numa segunda fase, abandonando-se a si mesma, é levada pelo processo unitivo a unir-se aos raios de transcendente esplendor; e lá e cá, embora permaneça [ela mesma], submerge inteiramente na luz do abismo de Sabedoria, cuja profundidade não consegue indagar.

São Dionísio de Alexandria

[Citado em: Sgarbossa, Mario. Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente: com uma antologia de escritos espirituais. Tradução Armando Braio Ara. – São Paulo: Paulinas, 2003, p. 649.]

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Vasco Arruda

Ela emergiu do mundo dos judeus da Europa Oriental, um mundo de homens santos e milagres que já havia experimentado seus primeiros anúncios de danação. Trouxe a ardente vocação religiosa daquela sociedade agonizante para um novo mundo, um mundo em que Deus estava morto. Como Kafka, ela se desesperou; mas, à diferença de Kafka, acabou, de modo atormentado, bracejando em busca do Deus que a abandonara. Narrou sua busca em termos que, como os de Kafka, apontavam necessariamente para o mundo que ela deixara para trás, descrevendo a alma de uma mística judaica que sabe que Deus está morto, mas que, no tipo de paradoxo que perpassa toda a sua obra, está determinada a encontrá-Lo mesmo assim.
A alma exposta em sua obra é a alma de uma mulher só, mas dentro dela encontramos toda a gama da experiência humana. Eis por que Clarice Lispector já foi descrita como quase tudo: nativa e estrangeira, judia e cristã, bruxa e santa, homem e lésbica, criança e adulta, animal e pessoa, mulher e dona de casa. Por ter descrito tanto de sua experiência íntima, ela podia ser convincentemente tudo para todo mundo, venerada por aqueles que encontravam em seu gênio expressivo um espelho da própria alma. Como ela disse, “eu sou vós mesmos”.
Benjamin Moser
[Moser, Benjamin. Clarice, uma biografia. Tradução de José Geraldo Couto. São Paulo: Cosac Naify, 2009, p. 16.]

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Vasco Arruda

Segundo o professor J. Herculano Pires, a doutrina espírita é uma realidade histórica, um corpo doutrinário existente em livros. Então, em primeiro lugar, diremos ao leitor que o espiritismo é a doutrina codificada por Allan Kardec. Além de afirmar, porém, que o espiritismo é uma realidade histórica, uma doutrina existente em livros, Herculano assegurou que ela precisa ser estudada. Em segundo lugar, portanto, afirmaremos ao leitor que o espiritismo é doutrina filosófica de bases científicas e consequências morais religiosas.
Sergio Aleixo
[Aleixo, Sergio. O que é Espiritismo. Rio de Janeiro: Record: Nova Era, 2003, p. 23.]