Personagens com deficiência motora notabilizaram muitos atores. Daniel Day-Lewis em “Meu Pé Esquerdo” (1989), Javier Bardem em “Mar Adentro” (2004), Hilary Swank em “Menina de Ouro” (2004), Mathieu Amalric em “O Escafandro e a Borboleta” (2007). Todos foram reconhecidos por atuações espetaculares, ressaltada pela limitação de atuar apenas com a expressão facial e movimentos de cabeça (no caso de Amalric, menos que isso).

Andrew Garfield, um dos mais talentosos atores desta geração, é mais um a expor a dimensão de seu talento ao interpretar um personagem tetraplégico. “Uma Razão Para Viver”, longa de estreia de Andy Serkis como diretor, é um melodrama bem feito. Consegue equilibrar bem a pieguice com um discurso “feel good”. Foge do moralismo, mas também não abraça radicalismos ao adaptar uma história real. E tudo isso só funciona graças ao talento de Garfield.

Tal qual o francês “Intocáveis” (2011) e o norte-americano “Como Eu Era Antes de Você” (2016), o britânico “Uma Razão Para Viver” conta o drama de uma pessoa vívida que, acometido por um imprevisto (no caso, ele adquire poliomelite) perde o espírito de vida. Ou, parafraseando o título nacional – que, de tão piegas, parece retirado de um verso de música do Frejat -, ele fica sem “razão para viver”. Robin Cavendish (Garfield), então, conta com a ajuda incansável da esposa, Diana (a ótima Claire Foy), para e reerguer emocionalmente. Ou seja, nada muito de novo.

A principal diferença deste para os dois antecessores citados ali no parágrafo passado é que Andrew Garfield é um ator bem mais expressivo que Sam Claflin e até François Cluzet, o que faz com que o fundo do poço do personagem se torne ainda mais doloroso. Serkis parece não temer o melodrama e investe na pieguice na trilha sonora, contraposta por um elenco de apoio excêntrico. Não acerta o tom sempre, mas “Uma Razão Para Viver” vai além do meloso, trazendo bom humor – em especial com o timing de Garfield.

Outra novidade bem-vinda é o retrato histórico da época. O filme se passa entre o final dos ano 1950 e começo da década de 1990, além de se passar na Inglaterra, Quênia, Espanha e Alemanha. O design de produção afiado consegue trazer o passar dos anos e o avanço da tecnologia de forma gradual. Para além do drama pessoal, “Uma Razão Para Viver” discute ainda os direitos de pessoas com doenças graves e as possibilidade de locomoção de pacientes de pólio com capacidade de respiração afetada. O momento mais interessante do filme acaba sendo a criação da primeira cadeira de rodas com respirador acoplado, criação do inventor Teddy Hall, após sugestão do amigo Robin Cavendish.

“Uma Razão Para Viver” é um filme tanto quanto quadrado. Meio previsível, tanto quanto meloso, mas com certo rigor técnico que funciona. Não fosse a atuação de Andrew Garfield, que no brilho do olho consegue ir da malícia ao drama puro, e o filme seria eficientemente esquecível. Sorte de Andy Serkis que ele escalou o ator norte-americano logo no primeiro longa. Aparentemente, grandes atores reconhecem seus pares.

(andrebloc@opovo.com.br)

Cotação: nota 5/8.

Ficha técnica
Uma Razão Para Viver (Breathe, ING, 2017), de Andy Serkis. Drama. 118 minutos. 12 anos. Com Andrew Garfield e Claire Foy.

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André Bloc

Redator de Primeira Página do O POVO, repórter do Vida&Arte por seis anos, membro da Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine).

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