Já no finzinho de 2010, duas novas candidatas a diva lançaram discos ao vivo com propostas e amplitudes bem diferentes. A mansa e novata Maria Gadu e a elétrica Ivete Sangalo aceitaram o convite do canal pago Multishow e lançaram, CD, DVD e um programa para a TV. Em comum os trabalhos trazem apenas uma dúvida sobre se eram estes os projetos corretos para este momento na carreira de ambas. Por partes. A baiana Ivete Sangalo completa 39 anos em 27 de maio deste ano e, desde 1993, vem galgando, passo a passo, o posto de rainha da axé music. O passo maior veio com o seu Multishow Ao Vivo: Ivete Sangalo no Madison Square Garden. Gravado em Nova York, o mega projeto é, sem dúvidas, um alto investimento numa carreira internacional para Ivete. Infelizmente, a imprensa internacional não comprou a ideia e não deu a mesma importancia que a brasileira deu. É fato que o Brasil ficou pequeno para a cantora e que a opinião da gringa não é determinante para as suas decisões, mas tratou-se de um investimento bem alto (U$ 5 milhões) somente para resultar em um CD e um DVD. Seu primeiro DVD, gravado pela MTV, em 2004, ganha mais pontos pela espontaneidade e pela proximidade com o público. Pois bem, para a nova empreitada foram convidados o produtor Nick Wickham (Beyoncé, Madonna e Red Hot Chilli Peppers, é mole?!) e alguns convidados de pouco peso para para dividir o palco. O brasileiro Seu Jorge tem um vozeirão, mas não o suficiente para chamar a atenção do mundo (nem sua popularidade como ator é suficiente). Entre Nelly Furtado, Juanes e Dave Mathews, os convidados internacionais, talvez somente o último confira realmente credibilidade ao projeto. Os demais são nomes conhecidos e contam alguns sucessos, mas ainda estão em busca de firmar seus pés na música mundial. Uma coisa que ninguém pode dizer é que Ivete não é uma mulher corajosa. Ao Vivo no Madison Square Garden vem depois de um trabalho gravado no Maracanã, também pelo Multishow. Sua busca pela grandiosidade tem um limite: a música. Ela faz de tudo no palco do novo show, toca piano (muito mal, inclusive), canta em inglês, dança e usa muitos figurinos (alguns de gosto bem duvidoso). Mas, quando chega a música, o repertório não é nada demais. Que fique claro que não é nada ela nem contra a axé music. Ivete tem uma voz belíssima e sua simpatia é contagiante, mas sua música só funciona nos shows. A fórmula é simples: baladas açucaradas e batucadas arrasta quarteirão. Nesse ponto vem faltando ousadia. Quando isso acontecer, aí sim, ela vai poder fazer um projeto realmente duradouro. Até lá, ela vai ter que manter a fábrica de axé music funcionando nas alturas e sem concorrência (que outro cantor de axé gravaria um show no Madison Square Garden?).

Maria Gadu

O caso de Maria Gadu é diferente e mais econômico até no nome: Multishow Ao Vivo (apenas). Prematuro, o trabalho é o segundo de sua carreira. É isso mesmo, ela estreou no ano passado com o surpreendente Maria Gadu e, um ano depois, já lançou um disco ao vivo. Claro que não existe uma fórmula para se guiar uma carreira musical, principalmente nos dias em que se fala tanto em fim da indústria fonográfica. Mas, para alguém que vinha sendo apontada como uma grande compositora (e é de fato), talvez fosse melhor confirmar o elogio com mais um trabalho de compositora, em estúdio, de preferência. Além disso, embora Gadu tenha recebido elogios de Milton Nascimento, João Donato e Caetano Veloso (com quem vai gravou mais um ao vivo), para o Multishow Ao Vivo ela convidou uma turma de amigos que, de fato, ninguém conhece. O papel da amizade e da informalidade são bem importantes e fazem falta. Mas, fazer isso num segundo trabalho parece bem pernóstico, do tipo “eu chamo quem eu quero”. Gravar um Multishow Ao Vivo para Maria Gadu foi bem prematuro. Não se pode sequer dizer que o trabalho é ruim, uma vez que ele é igual ao anterior que é muito bom. Como material inédito deste novo, músicas que ela já vinha cantando em shows, como Lanterna dos Afogados e Trem das Onze. Ou seja, nenhuma novidade. Acontece que, vestida no papel de nova diva da música brasileira, ela vem adotando o discurso do “eu faço o que eu quero”. Realmente, enquanto isso render dinheiro, ela vai fazer o que quer. Mesmo desatenciosa com a imprensa e dona daquela bem calculada timidez, ela tem tudo para se destacar no estilo cantora-de-MPB-de-voz-grave. Sua voz é delicada e sua poesia revela lirismo e sinceridade além do esperado. Mas, em terra onde pisa Simone, Maria Bethânia e Angela Ro Ro, é preciso comer muito feijão pra se chamar de diva.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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