Do Uol
Wanda Jackson estava pronta para gravar um novo álbum em 2010. Já tinham se passado quatro anos desde I Remember Elvis (2006), um tributo ao seu antigo namorado Elvis Presley, e sete anos desde seu último disco de originais, o repleto de convidados Heart Trouble (2003). “Era hora de outra coisa”, diz a mulher conhecida tanto como Rainha quanto Primeira-Dama do Rockabilly.
 
Ela só não imaginava como seria essa “outra coisa”. O novo The Party Ain’t Over – uma referência ao primeiro grande sucesso de Jackson, Let’s Have a Party (1959) – a coloca trabalhando com Jack White, dos White Stripes, um homem que já trabalhou com cantoras ícones e que produziu o ganhador do Grammy Van Lear Rose (2004) de Loretta Lynn. 
 
Mesmo assim, Jackson tinha algumas dúvidas em relação ao projeto. “Ele é um grande astro, entre os maiores no planeta, isso era empolgante”, diz a integrante do Salão da Fama do Rock and Roll de 73 anos, falando por telefone de Nova York. “Mas ele também é um astro do rock, e não faço esse estilo contemporâneo. Por isso que surgiu a apreensão. Não sabia se conseguiríamos nos entender”.
 
Mas ela não precisava ter se preocupado. “(White) me disse: ‘eu não vou mudar seu estilo, vou apenas lhe dar material novo e um som novo'”, lembra Jackson. “Ele me pressionou, me fez trabalhar em canções fora da minha zona de conforto. Era meio difícil entender o que ele queria da minha interpretação, mas enquanto trabalhávamos, eu relaxei e percebi que ele estava visando o melhor para mim e que produziria um álbum realmente bom”.
 
Uma sugestão de Bob Dylan
The Party Ain’t Over com 11 faixas, gravado no Third Man Studios de White em Nashville, é uma combinação de familiar e novo para Jackson. Há canções do final dos anos 50 e 60, incluindo o sucesso de Bill Haley e Little Richard Rip It Up (1956), Nervous Breakdown (1959) de Eddie Cochran, Shakin’ All Over (1960) de Johnny Kid e a obscura Like a Baby (1960) de Elvis Presley. 
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Mas White também coloca Jackson para solar em material mais contemporâneo, como a versão furtiva de You Know I’m No Good (2007) de Amy Winehouse, e a enérgica Thunder on the Mountain (2006) de Bob Dylan, que foi uma sugestão do próprio. “Nunca me encontrei [com Dylan], mas Jack e Bob têm um relacionamento especial, e Jack telefonou para Bob para perguntar qual canção ele escolheria. E Bob Dylan também é um fã meu, o que eu não sabia, e disse: ‘tem que ser Thunder on the Mountain, sem nenhuma dúvida’. Foi o que fizemos”.
 
Ela fica regularmente surpresa, diz Jackson, em encontrar astros contemporâneos que conhecem e admiram sua música. “É chocante para mim. Eu descobri que Elvis Costello é um grande fã. Bruce Springsteen também é. Às vezes eu fico ocupada demais trabalhando para saber quem está ouvindo, mas eu adoro. Tem sido uma viagem empolgante. Os últimos 20 anos em especial foram fantásticos”.
 
Nascida em Maud e criada em Oklahoma City após um breve período na Califórnia, Jackson aprendeu a cantar e tocar violão com seu pai. Ao vencer um concurso de talentos na adolescência, ela ganhou seu próprio programa em uma emissora de rádio local, onde foi descoberta pelo cantor Hank Thompson em 1954 e recrutada para se apresentar com seus Brazos Valley Boys.
 
“A música sempre foi minha única paixão. Na época, após as mulheres se formarem no colégio, elas se casavam e iniciavam suas famílias. Mas eu sabia que tinha nascido para isso – apesar de que não imaginava que faria isso por toda minha vida. Eu imaginava que teria minha carreira e cantaria até me casar, quando então a abandonaria. Mas não foi assim que aconteceu”.
 
Na estrada com Elvis Presley
Após um dueto com o líder dos Brazos, Billy Gray, no single country You Can’t Have My Love (1954), Jackson buscou um contrato próprio com a Capitol Records, mas foi informada pelo produtor Ken Nelson que “garotas não vendem discos”. Então ela fechou contrato com a Decca Records, onde Kitty Wells queria provar que garotas podem vender mais do que apenas poucos discos, e caiu na estrada com outro artista novato: Elvis Presley, com quem acabou namorando.
 
“Quando chegávamos cedo a uma cidade, nós íamos assistir a uma matinê no cinema, ou saíamos para comer um hambúrguer ou algo assim, ou ficávamos dirigindo pela cidade conversando. Nós nos tornamos bons amigos. Ele me deu seu anel. Eu costumava usá-lo no meu pescoço. Eu ainda o tenho em minha caixa de joias”, ela conta.
 
Mas seu pai viajava com ela como empresário e acompanhante, e que mantinha as coisas sob rédea curta. “Ele tinha muitas regras para mim. Ele queria viajar comigo e manter minha reputação intacta. Atualmente isso não parece importar para ninguém. Na verdade, quanto mais mundanas elas são, mais publicidade elas recebem”, avalia.
 
Naquela época, ela lembra, era melhor uma mulher ser uma dama e não ter nenhuma história circulando a seu respeito. “Eu não podia viajar de uma cidade para outra com Elvis ou com qualquer outro, exceto meu pai. Eu não podia sentar no colo de ninguém, não podia apoiar a cabeça no ombro de ninguém se estivesse com sono, a não ser a dele”.
 
Foi Elvis quem a encorajou a mudar do country para o rock and roll. “Nós não tínhamos um nome para ele àquela altura. Ele era chamado de ‘O Gato Caipira’. Eu não tinha muita confirnaça naquela época, mas ele sabia que eu era capaz, então insistiu comigo. Ele tocava alguns discos para mim, pegava o violão e dizia: ‘Preste atenção, se você der este tratamento…’ Meu pai dizia: ‘eu acho que Elvis está certo'”.
 
Let’s Have a Party foi seu primeiro sucesso Top 40, seguido por Right or Wrong (1961) e In the Middle of a Heartache (1961), ambos também sucessos country Top 10. “Nós colocávamos uma canção country de um lado [do single] e um rockabilly do outro, para tentar assegurar que o single fosse tocado. A canção country sempre ficava acima nas paradas, mas dava para ver que os garotos realmente adoravam o [rock] que eu estava fazendo”.
 
Assim como Wendell Goodman, um programador da IBM com quem ela se casou em 1961 e com quem teve dois filhos. Ele abandonou sua carreira para ajudar a guiar a dela, sendo seu empresário desde então. E foi Goodman que disse para White que Jackson sabia cantar tirolês, o que os levou a fechar The Party Ain’t Over com o clássico Blue Yodel #6 (1930) de Jimmie Rodgers.
 
Mulher do rock and roll
Ser uma das primeiras mulheres do rock não foi tão difícil quando alguém poderia imaginar. “Não me lembro de ser muito difícil. Não havia muitas garotas fazendo qualquer tipo de música, então elas eram meio que novidade. As pessoas nos descartavam em coisas assim. Acho que é possível dizer que foi um pouco difícil, mas não ruim”.
 
À medida que a moda do rockabilly passou, Jackson voltou ao mercado country e gospel, emplacando sucessos como Tears Will Be the Chaser For Your Wine (1966), The Box It Came In (1966), My Big Iron Skillet (1969) e A Woman Lives for Love (1970). 
  
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Ela conquistou espaço no exterior, especialmente na Alemanha, se apresentou em Las Vegas e foi apresentadora de um programa de televisão, “Music Village” (1967-1968). Em 2009, ela ingressou no Salão da Fama do Rock and Roll como uma das influências iniciais. Ela continua fazendo turnê com sua banda e não tem planos de parar.
 
“Música é a única coisa que sei. É minha única paixão. É o que eu faço. Quando não estou na estrada ou trabalhando em um projeto musical, fico me debatendo como um peixe fora d’água. Felizmente, consegui continuar fazendo turnê por todo o mundo e, quando eu pensava que as coisas estavam acabando, elas ganhavam força de novo”.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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