No tão alardeado país das cantoras, é realmente difícil achar um time de homens capaz de bater tantas vozes femininas que marcam e marcaram a música brasileira. Mais ainda quando se destaca a atuação de uma realeza que criou um “antes e depois”, cada uma dentro do seu estilo. É o caso de Ademilde Fonseca, a rainha do choro, Celly Campelo, a rainha do Rock, e Doris Monteiro, a rainha do rádio. Seguidas cegamente por uma corte de admiradores, cada uma dessas artistas marcou ao seu modo a história da música verde e amarela e, por isso, tiveram seus bons momentos resgatados recentemente pela gravadora Discobertas.

Ademilde Fonseca, por exemplo, este ano comemora nada menos que 90 anos de vida em plena atividade artística. Sua carreira começou em 1942 com a primeira versão letrada de Tico-Tico no Fubá, acompanhada do chorão Benedito Lacerda que logo lhe entronou como a Rainha do Chorinho. Tal título deu nome do disco lançado em 1975, que agora volta as lojas em formato CD. O disco marca o retorno da cantora à indústria fonográfica, após um tempo de vacas magras. Para o retorno, ela contou com uma forcinha de súditos como João Bosco e Aldir Blanc, que lhe homenagearam com Títulos de Nobreza (Ademilde no Choro), e Martinho da Vila, que lhe dedicou Choro chorado. O disco, que trazia arranjos do cearense Zé Menezes, foi responsável por aproximar Ademilde de novas gerações, mesmo contando com bambas da velha guarda do choro – como Copinha, Marçal, Wilson das Neves e Abel Ferreira.

Mas, quando o assunto é modernidade, nada melhor que um box com seis discos da Rainha do Rock. Antes de Pitty, Paula Toller e Rita Lee, era Celly Campello quem fazia a festa da juventude, antes mesmo de Roberto Carlos assumir o posto de Rei. O lançamento ganhou o nome do primeiro grande sucesso da paulista Célia Campelo Gomes Chacon, que se lançou em dupla com o irmão Tony em 1958. Estúpido Cupido, o box, vai do inaugural disco de 1959, com sucessos como Túnel do amor e Lacinhos cor de rosa, até o raro registro de 1968, que traz Meu pranto a deslizar, uma versão de Fred Jorge para As tears go by dos Rolling Stones. Afastada dos palcos para poder se dedicar à vida doméstica, ela chegou a ensaiar um retorno 1976, provocado pelo sucesso da novela Estúpido Cupido. Gravou um disco e fez algumas apresentações esporádicas até que, em 2003, veio a falecer vítima de um câncer de mama.

mbora a corte pareça menos nobre, Dóris Monteiro também tem sua dose de realeza. Eleita a Rainha dos Cadetes em 1952, a cantora carioca também mereceu uma homenagem recente, por conta dos seus 60 anos de carreira. Batizada simplesmente de 60, a coletânea dupla reúne 29 fonogramas lançados originalmente em compactos duplos de 78 rotações. Registradas entre 1951 e 1956 pelas gravadoras Todamérica e Continental, as canções passam por boleros e sambas-canções de compositores como Peterpan, Alberto Ribeiro e Wilson Batista. Já como um prenúncio da modernidade que ia tomar conta de Dóris depois de se chegar mais para o lado da Bossa Nova na década seguinte, a coletânea agrega duas composições de Tom Jobim, parcerias com Dolores Duran (Se é por falta de adeus) e Luiz Bonfá (Engano). Até um certo Francisco Anísio comparece em parceria com Hianto de Almeida em Gosto da vida. E foi justamente em 1956 que ela ganhou uma nova coroa, agora de Rainha do Rádio, título disputadíssimo entre as artistas da época. Um justo reconhecimento a esta senhora que, hoje com 77 anos, mantém a voz e a carreira inteiras.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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