No domingo (19), o caderno Vida & Arte Cultura (Jornal O Povo) lembrou uma frase polêmica dita por Chico Buarque em 2004. Vendo a chegada de uma nova geração de músicos ligados ao rap e ao hip-hop, o compositor carioca anunciou que a canção estava morrendo. Filho ilustre de uma geração que ajudou a consolidar o que hoje se considera “boa música” e MPB, a frase de Chico levantou uma discussão sobre que música o Brasil quer ou não ouvir, e sobre até que ponto estamos ligados às nossas raízes.

Felizmente, oito anos depois, a teoria apocalíptica do compositor de A Banda se mostrou errada. Mesmo que a indústria tenha mudado as regras, não faltam pessoas para reforçar o cancioneiro nacional. Um desses nomes é o carioca Pedro Moraes, que acaba de lançar no Brasil o seu disco de estreia Claroescuro. Com sua voz aveludada, o artista que integra o coletivo É com esse que eu vou cria xotes, afoxés e marchinhas que lembram algo de Gilberto Gil e Edu Lobo. E, pra mostrar que o futuro não é mais como era antigamente, ele ainda convida Alcione para um dueto na poética Zingareiro, e traz para seu tempo versões de Dora (Dorival Caymmi) e With a little help from my friends (Lennon/ McCartney), esta em ritmo de afoxé.

Outro que segue a linha evolutiva da música brasileira é Rodrigo Campos, autor de Bahia Fantástica. Recriando cenários, ele encarna um Dorival Caymmi cronista, até mesmo nas letras curtinhas. Juntando batuques e violões com guitarra, baixo e teclado, ele conta histórias escravos, Iemanjá e figuras populares como um motorista de ônibus. Bahia Fantástica vem depois de São Mateus não é tão longe assim e reforça os laços do cantor e compositor com a terra onde cresceu. Para ajudar nessa imersão soteropolitana, ele chamou um grupo de amigos como o rapper Criolo, que entoa um canto de escravos em Ribeirão.

Maurício Pessoa se aproxima do lado mais lírico da Bossa Nova e da MPB para criar o seu Habitat. Neste primeiro disco, o carioca apresenta 10 canções próprias que trazem como ponto de ligação sua voz mansa guiada por um violão joãogilbertiano. Indo fundo no que há de mais tradicional, ele encontra no violão seu parceiro ideal em canções como a tristonha Prisma (um ponto alto do disco), ou o dramático instrumental Saudade. Soando mais balançado, Tulipa turca é a canção que Chico Buarque por pouco não compôs. Assim como Tenho guardado em meu peito é quase um plágio de Wave, do mestre Tom Jobim.

Se não é pela sonoridade Por extenso, do pernambucano Jota Erre, evoca os mestres na intensão. Como ele mesmo diz em Bem no tom, “bossa nova, tropicália fez todo mundo se render”. Buscando misturar urbanidade, modernidade e tradição, ele se volta para um Caetano tropicalista e faz um disco balançado, poético e cheio de bons momentos. For you, por exemplo, é uma bossinha sedutora, enquanto Socorro lembra os bons momentos de João Bosco. Não, não é falta de talento se voltar para o passado. É somente reconhecer o valor do que já foi feito.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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