Quando vi que o dia das crianças já havia passado, relaxei e pensei “quando tiver tempo eu escrevo”. Como tempo é coisa rara, uso, então, aqui como desculpa para só falar de um disco infantil em dezembro aquela velha história de que todo dia é dia de criança. Explicações à parte, o assunto é o disco Partimpim Tlês (Sony Music), terceira aventura de Adriana Calcanhotto pelo universo das crianças, que ela assina com apelido ela mesma tinha quando criança, Adriana Partimpim. Essa brincadeira começou em 2004, com um disco que fez muita gente dizer ooohhhhh para a delicadeza com que ela abordava canções bonitinhas (e nem sempre voltadas para o público infantil, como Ciranda da bailarina e Saiba) com um toque de fofura. Sem o mesmo impacto do anterior, que até ganhou CD e DVD ao vivo, o segundo volume veio cinco anos depois e tinha até Bob Dylan (com versão de Zé Ramalho) e Olodum. De fato, a ideia da Partimpim nunca foi fazer um projeto exatamente para as crianças, mas, talvez, para o lado criança dos adultos. E é aí que este terceiro volume ganha uma cara mais interessante. Mesmo que essa pirraça da gaúcha já tenha sido feita e refeita, jogar uma graça por cima de Gonzaguinha (Lindo lago do amor) e Gilberto Gil (De onde vem o baião, com direito a sampler de Luiz Gonzaga) é capaz de tirar um sorriso até do coração mais duro. E mais interessante ainda por que o som deste Partimpim Tlês traz algo indie e econômico que justifica as presenças sempre enriquecedoras de Kassin, Rodrigo Amarante e Moreno Veloso. O clássico “tira o pé do chão” Taj Mahal, é um exemplo disso. Guiada por efeitos, guitarras mínimas e um coro de crianças de sobrenome caro (Buarque, Lancellotti, de Moraes, etc.), Adriana bota seu dedo criativo da obra de Jorge Ben Jor sem ter a menor preocupação de soar reverencial. Ponto pra ela também em Passaredo (Chico Buarque/ Francis Hime), pelos mesmos motivos da anterior. Mas nem tudo em Partimpim Tlês é releitura. Salada Russa é uma parceria de Adriana com Paula Toller que se irmana com Oito anos, faixa composta pela abelha loura e gravada no primeiro Partimpim. Por que os peixes falam francês, de Alberto Continentino e Domenico Lancellotti, se destaca pela sonoridade viajante, etérea e pela presença do som de um desentupidor de pia no prato com água, tocado por Lancellotti. Pra encerrar o disco, Acalanto foi composta por Dorival Caymmi para sua recém nascida filha Nana. Em Partimpim Tlês quem fica com o dueto é a sobrinha da homenageada, Alice Caymmi fazendo vocais. Ao final dos 36 minutos do disco, pra quem já conhece os outros dois discos da Partimpim, bate uma sensação de dejá vu, mas também bate uma vontade de ouvir de novo.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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